Videovigilância da Baixa de Coimbra funcionou ilegalmente durante quatro anos
Comissão Nacional de Protecção de Dados considera que o sistema operou entre 2013 e 2016 sem autorização e vai abrir um processo de contraordenação.
O sistema de videovigilância implantado na Baixa de Coimbra pela PSP esteve em funcionamento entre 2013 e 2016 sem autorização para tal. A informação é referida num parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) que data de 26 de Setembro, em que a entidade considera "grave" e condena “veementemente” esta prática das forças de segurança.
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O sistema de videovigilância implantado na Baixa de Coimbra pela PSP esteve em funcionamento entre 2013 e 2016 sem autorização para tal. A informação é referida num parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) que data de 26 de Setembro, em que a entidade considera "grave" e condena “veementemente” esta prática das forças de segurança.
A comissão descobriu a situação quando a PSP lhe dirigiu recentemente um pedido de autorização para usar o sistema, sendo que no requerimento a própria polícia admitia que a videovigilância esteve sempre em funcionamento mesmo durante os quatro anos em que a autorização não tinha sido renovada. Na sequência deste parecer, a CNPD vai abrir um processo de contraordenação que visa a PSP.
O último parecer da comissão autorizava a PSP a operar o sistema apenas até Fevereiro de 2012. No documento disponível no sítio online da CNPD, a entidade faz referência ao período que vai de 2013 a 2016, com especial enfase no último ano. A informação da comissão é sustentada com base no documento de pedido de autorização de utilização de câmaras fixas em Coimbra elaborado pela própria polícia já este ano.
De acordo com a CNPD, a PSP adiantou nesse pedido de parecer que “as câmaras de videovigilância encontram-se implementadas no terreno, obedecendo à disposição” legalmente prevista. “Apesar de actualmente não se proceder à visualização nem à gravação de imagens, houve períodos em 2016 em que apenas se procedeu à visualização das mesmas, sem no entanto efectuar qualquer gravação”, referem as autoridades no documento.
Prevenção da criminalidade
A PSP acrescenta ainda que, “nos anos em estudo, a criminalidade apresenta números reduzidos, evidenciando que a sua presença continua a contribuir na prevenção de criminalidade”.
A partir destes parágrafos, a CNPD entende que, “não só se mantiveram instaladas as câmaras de videovigilância, como também que as mesmas foram utilizadas na visualização de imagem” por parte de agentes. No entanto, de acordo com a comissão, a “ultima autorização de que a PSP dispunha apenas autorizava a utilização do sistema até ao dia 17 de fevereiro de 2012”.
A comissão considera assim “grave” a “assunção por parte da PSP de que o sistema de videovigilância continuava em funcionamento, ainda que não gravando imagens”, sendo “utilizado pelos agentes desta força policial”.
A entidade não deixa de destacar que “é discutível e pelo menos preocupante a sugestão de que a manutenção das câmaras de videovigilância” seja “um factor dissuasor positivo que deve ser sublinhado e enaltecido”, uma vez que leva a uma “subvalorização da intrusão na privacidade que a mera sugestão de vigilância acarreta para os cidadãos”.
Violação da lei
Assim, a CNPD não pode “deixar de condenar veementemente esta prática” e exorta as entidades responsáveis (Ministério da Administração Interna e PSP) a “reverem as práticas” que representam uma violação da lei.
A instalação de sistemas de videovigilância está sujeita a uma autorização do membro do Governo que tutela a força de segurança – neste caso a ministra da Administração Interna – autorização essa que tem de ser precedida por um parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados.
No documento lê-se ainda que o “o comportamento da PSP não pode deixar de configurar uma infracção que ultrapassa a mera tutela disciplinar”. Como consequência, a comissão informa que, com base na informação referida pela própria PSP no pedido de parecer, se vê “na obrigação” de abrir um processo de contraordenação.
O comandante distrital da PSP de Coimbra, questionado em PÚBLICO, remeteu para mais tarde esclarecimentos por email que, contudo não chegaram. O PÚBLICO tentou também, sem sucesso, contactar o porta-voz da Direcção Nacional da PSP.
Pedido omisso
Sobre o pedido de parecer em si, a CNPD conclui que ele é omisso ou tem informações insuficientes sobre o sistema constituído por 17 câmaras e que, caso não sejam “supridas as omissões e incompletudes assinaladas” no documento, “qualquer decisão final sobre a matéria” seria ilegal.
A comissão quer mais dados sobre o sistema de videovigilância implantado numa zona em que a malha urbana é tipicamente medieval. Por exemplo, se existem ou não câmaras móveis e, no caso de existirem, se são ou não monitorizadas no centro de controlo. A CNPD quer esclarecimentos sobre a tecnologia de aplicação de filtros a adoptar nos casos em que são captadas imagens de casas ou edifícios habitados. Outra das dúvidas reside na transmissão de dados, pelo que terá que ser igualmente clarificado se as comunicações são cifradas ou efectuadas através de um canal cifrado. O sistema de videovigilância da Baixa de Coimbra foi instalado em 2010.