Seixas da Costa quer manter “opinião”, seja num blogue ou nas empresas
Indicado pelo Governo para membro do Conselho Geral Independente da RTP, embaixador não vê qualquer “incompatibilidade” com as suas funções em empresas. No CGI estará pro bono
O embaixador Francisco Seixas da Costa recusa-se a abdicar de dar “opiniões”, seja no seu blogue e no Jornal de Notícias sobre a actualidade da vida nacional, em duas outras publicações sobre gastronomia ou mesmo às três empresas com quem colabora como a EDP Renováveis, a Mota-Engil e a Jerónimo Martins, porque considera não existir qualquer incompatibilidade entre tais funções e as de membro do Conselho Geral Independente da RTP.
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O embaixador Francisco Seixas da Costa recusa-se a abdicar de dar “opiniões”, seja no seu blogue e no Jornal de Notícias sobre a actualidade da vida nacional, em duas outras publicações sobre gastronomia ou mesmo às três empresas com quem colabora como a EDP Renováveis, a Mota-Engil e a Jerónimo Martins, porque considera não existir qualquer incompatibilidade entre tais funções e as de membro do Conselho Geral Independente da RTP.
Seixas da Costa, indigitado pelo Governo para o CGI, o órgão fiscalizador da RTP, disse esta manhã na comissão parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto que quando foi ouvido na Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) não lhe foi colocada qualquer questão sobre a sua ligação àquelas três empresas mas apenas sobre as colaborações pagas na comunicação social. Terão sido estas últimas que levaram a que os três membros restantes da ERC não se conseguissem pôr de acordo sobre se consideram que são ou não incompatíveis com o cargo no CGI e, por isso, se tenham abstido de dar um parecer sobre esse ponto específico que deveriam analisar.
Além disso, também só amanhã deverá chegar ao Parlamento o parecer sobre o outro nome indigitado, o do professor catedrático de direito José Vieira de Andrade, depois de o prazo de dez dias ter terminado nesta segunda-feira. Apesar disso, Vieira de Andrade foi ouvido pelos deputados. “O prazo de 10 dias terminou ontem. Nós estamos a cumprir a lei, a ERC não cumpriu o prazo”, apontou a socialista Edite Estrela, presidente daquela comissão.
Na audição, foi questionado pelos deputados de todos os partidos sobre as incompatibilidades para exercer o cargo e disse não estar “disponível” para abdicar desse seu exercício de “afirmação” e de “liberdade” que é escrever. “A minha postura foi muito clara: eu faço o que faço, escrevo o que escrevo, dou opinião sobre as coisas mais diversas, não estou disponível [para prescindir]; isto faz parte da minha afirmação, da minha vida. Eu venho em pacote, não vou mudar aquilo que escrevo de forma livre. É a minha maneira de estar”, garantiu. E acrescentou: “Eu não sou candidato a nenhum lugar; fui convidado.”
Sobre as três empresas, Seixas da Costa explicou que as suas tarefas de administrador não-executivo passam pela “análise dos riscos de investimentos no estrangeiro”, dos “equilíbrios políticos nos países” onde as empresas operam ou tencionam ter ligações. Isso é uma colaboração normal dos embaixadores. “A grande questão é saber se essa ligação tem alguma coisa a ver com o que eu faço no CGI. Olhei e não encontrei nada em contacto”, argumentou. Seixas da Costa recusou também qualquer elo possível entre a sua ligação à Jerónimo Martins e a publicidade das marcas do grupo na TV pública ou parcerias com a Fundação Francisco Manuel dos Santos. “Confesso que nunca me tinha lembrado desta ligação…”
O embaixador disse que a sua ligação ao CGI terá que ser pro bono devido à sua condição de reformado da função pública e que viu neste cargo uma forma de aplicar a sua “experiência” na reflexão sobre como pode o serviço público de televisão “ajudar a máquina global da acção lusófona” que Portugal precisa de trabalhar.
Falando sobre como vê o cargo e o futuro do serviço público de rádio e televisão, Seixas da Costa defendeu que a TV pública “tem que ter público e tem que ter qualidade”, apostando numa “programação com sentido de serviço público e que seja minimamente apelativa para manutenção de um certo público” – cuja fasquia não especificou. Até porque, lembrou, o financiamento não vem apenas da taxa do audiovisual, mas também da publicidade, cujo preço e facturação está dependente das audiências.
O embaixador defendeu ainda que a RTP tem que ponderar a aposta em seis dimensões: “adequar a informação a um modelo mais europeu do que o português”; apostar no entretenimento com “qualidade e diversidade dos canais privados”; continuar a cultivar a questão da divulgação cultural; manter a abertura à sociedade civil; promover a coesão nacional e a integração de minorias; e dedicar-se ao estudo de um novo modelo de negócio que passe por uma maior articulação multimédia para conseguir captar públicos mais jovens. “Um serviço público tem que ter público, e se não damos resposta de entretenimento e cultura para as novas gerações dificilmente a RTP tem futuro”, argumentou, dizendo que “há trabalho para fazer” nesta área e que “o CGI deve acompanhar esta matéria”.
Seixas da Costa considerou ainda que a RTP deve mais espaço ao desporto não profissional, embora essa seja uma matéria da competência da direcção de informação; que a ligação a África através da RTP é uma “mais-valia muito significativa” mas “há problemas que têm que ser abordados”, como o financiamento e a independência informativa em relação aos poderes desses países; e que a RTP Internacional tem um “papel a desempenhar no quadro internacional que não deve ser descurado e é um elemento estratégico para a ligação a certas comunidades”.
Já José Vieira de Andrade disse aos deputados que aceitou o desafio como “jurista” mas também como “cidadão, o accionista último da RTP”. Defendeu a existência de um serviço público de televisão e de rádio “desde que esse serviço seja efectivamente um serviço público”, e que privilegie a independência. E considerou que o actual modelo de governação da RTP “é o mais próximo da garantia dessa independência”, lembrando o tempo em que “os governos tratavam a RTP como se fosse um serviço governamental”.
Classificou como valores fundamentais da RTP a “universalidade, independência, qualidade e salvaguarda de valores nacionais, regionais e culturais”. Elogiou o facto de o operador público não se deixar levar pelas derivas de alguns tipos de programas da concorrência e por fomentar a produção independente nacional. “Na perspectiva das linhas orientadoras estabelecidas, parece-me que a RTP está no bom caminho.”
Francisco Seixas da Costa foi indigitado pelo Governo para o lugar de Ana Lourenço, José Vieira foi escolhido pelo Conselho de Opinião para o de Manuel Silva Pinto. Ambos e ainda Álvaro Dâmaso, que fora cooptado terminaram, por sorteio, o seu mandato a 11 de Setembro, como dita a lei. Depois de assumirem o cargo, o CGI (que inclui também António Feijó, Diogo Lucena e Simonetta Luz Afonso) irá cooptar o elemento em falta.