Obrigar jovens médicos a ficar anos no SNS é “mau” em democracia, diz bastonário
Para Outubro já há várias greves marcadas pelos sindicatos que representam os médicos e as estruturas que estão a negociar com o Governo aumentos remuneratórios para os enfermeiros
Outubro arrisca-se a ficar para a história como o mês mais recheado de que há memória em Portugal de greves de médicos e de enfermeiros e a contestação continua a subir de tom. Do lado dos médicos, os ânimos ficaram mais exaltados depois de o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, ter revelado, numa entrevista ao Sol neste sábado, que equaciona a hipótese de obrigar os jovens que terminam a especialidade a um período mínimo de fidelização ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), que poderá ir até aos cinco anos.
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Outubro arrisca-se a ficar para a história como o mês mais recheado de que há memória em Portugal de greves de médicos e de enfermeiros e a contestação continua a subir de tom. Do lado dos médicos, os ânimos ficaram mais exaltados depois de o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, ter revelado, numa entrevista ao Sol neste sábado, que equaciona a hipótese de obrigar os jovens que terminam a especialidade a um período mínimo de fidelização ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), que poderá ir até aos cinco anos.
“O ministro precipitou-se, mais uma vez. Este não é o caminho. Obrigar é um mau princípio numa democracia”, apressou-se a criticar o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, que já desafiou Adalberto Campos Fernandes a contabilizar os custos que o Estado tem com a formação dos médicos internos, em carta enviada esta segunda-feira.
Os jovens médicos fazem a formação na especialidade ao longo de um período que pode ir até aos seis anos e são remunerados por isso. Mas esse é, sustenta Miguel Guimarães, o pagamento pelo trabalho que desempenham e que é “indispensável” ao funcionamento do SNS. “Há cerca de dez mil internos e, sem eles, o SNS morria. Os custos com a formação [destes profissionais] são um mito”, diz.
Adalberto Campos Fernandes defendeu na entrevista que os jovens médicos devem ficar no SNS durante um período mínimo para compensarem “o investimento” na sua formação. Se o médico quiser desvincular-se do SNS, terá de compensar o Estado, uma vez que este “investiu numa formação pós-graduada cara, exigente, qualificada”. A medida, precisou, será preparada ao longo do próximo ano.
Para Miguel Guimarães, o que o Governo devia fazer era oferecer aos jovens médicos “melhores condições de trabalho para se fixarem no SNS” e também alterar a lógica dos concursos que os obriga a esperar “muitos meses após o fim do internato até serem contratados”. “Enquanto isso não acontece, algumas dezenas vão para o estrangeiro ou para o sector privado”, lamenta.
As duas estruturas sindicais que representam os médicos também criticaram com dureza as declarações do ministro. Em comunicado conjunto, os dirigentes da Federação Nacional dos Médicos (Fnam) e do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) consideraram que o governante, com este tipo de afirmações, veio “introduzir novos e graves factores de agudização conflitual bem demonstrativos de que tem uma agenda claramente virada para a desarticulação do SNS”.
Os sindicatos já marcaram paralisações regionais para os dias 11, 18 e 25 de Outubro no Norte, centro e Sul, respectivamente, e para 8 de Novembro convocaram mais um dia de greve nacional, descontentes com o facto de o Governo “aceitar somente reduzir o limite anual do trabalho suplementar obrigatório”. Enquanto aguardam o novo documento negocial que a tutela ficou de enviar até esta quarta-feira, os sindicalistas insistem na reversão de todas as medidas acordadas durante o tempo da troika, nomeadamente a diminuição das listas de utentes dos médicos de família de 1900 para 1550.
Do lado dos enfermeiros, as negociações também se têm arrastado e já há novas greves no horizonte. Para esta terça-feira está marcada uma reunião com os dois sindicatos (afectos à UGT) que estão a negociar com o Governo, depois de o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (afecto à CGTP) ter convocado uma greve de três dias para 3, 4 e 5 de Outubro, por não ter conseguido chegar a um entendimento. O SEP reclama a generalização das 35 horas já a partir de Janeiro de 2018 e um acréscimo salarial transitório para os especialistas de 600 euros, contra os 150 euros propostos pelo Governo.
José Correia, presidente do Sindicato dos Enfermeiros, que reivindica uma nova tabela salarial para todos os enfermeiros e um acréscimo remuneratório que representaria uma duplicação do salário para os especialistas, não está muito confiante no resultado da reunião desta terça-feira e avisa, desde já, que, se nada de concreto sair do encontro, será marcada uma nova greve de cinco dias, a partir de 16 de Outubro, a qual se poderá prolongar “por tempo indeterminado”.