Pedro Santana Lopes: playboy ou senador?

Os tribunais não são agências de comunicação e imagem.

A imagem para os políticos, os artistas e todos os que vivem na e da arena pública é, naturalmente, matéria de grande preocupação para os mesmos. O tempo, os esforços e o dinheiro que gastam na construção, manutenção e aperfeiçoamento ou transformação da sua imagem pública é mesmo, muitas vezes, desmesurado. Recorrem aos mais diversos métodos e instrumentos, desde as empresas de comunicação e imagem às cumplicidades mediáticas, de forma a assegurar que a imagem que deles é projectada para a opinião pública é a que mais lhes convém. Nada de surpreendente ou censurável. Faz parte das regras do mercado e da democracia essa manipulação da imagem pelos personagens públicos.

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A imagem para os políticos, os artistas e todos os que vivem na e da arena pública é, naturalmente, matéria de grande preocupação para os mesmos. O tempo, os esforços e o dinheiro que gastam na construção, manutenção e aperfeiçoamento ou transformação da sua imagem pública é mesmo, muitas vezes, desmesurado. Recorrem aos mais diversos métodos e instrumentos, desde as empresas de comunicação e imagem às cumplicidades mediáticas, de forma a assegurar que a imagem que deles é projectada para a opinião pública é a que mais lhes convém. Nada de surpreendente ou censurável. Faz parte das regras do mercado e da democracia essa manipulação da imagem pelos personagens públicos.

Pedro Santana Lopes é, parece-me, dos políticos nacionais que mais visivelmente investe na sua imagem pública. E com mérito, porque num mundo de políticos cinzentos e formais, a sua personagem surgiu como não convencional e ousada. O facto de assumir publicamente o prazer e o divertimento da sua vida privada era, no meu entender, uma mais-valia no palco político nacional, onde os fatos e gravatas predominavam.

Quando Pedro Santana Lopes, inopinadamente, aterrou em São Bento quis alterar essa imagem pública e assumir um papel de pessoa reservada e grave. A verdade é que essa nova imagem nunca lhe colou bem à pele. Em parte pelas suas próprias características, em parte pela lógica mediática que nem sempre obedece à vontade dos artistas em palco.

Afastado do poder, Santana Lopes foi impedido pelo seu narcisismo de encontrar outras razões para a queda, que não fossem as conspirações de terceiros que, como é sabido, o quiseram matar (e ao seu governo) ainda na incubadora. Para além da fixação, agora atenuada, na figura do então Presidente da República, Santana Lopes passou a considerar como principais culpados do seu afastamento de S. Bento e de todos os seus males os órgãos de comunicação social. Uma opinião, no meu entender, desfasada da realidade mas absolutamente legítima e da qual não viria mal ao mundo não fora o facto de ter procurado apoio nos tribunais para impor essa versão da sua vida.

O Grupo Impala — jornalistas e responsáveis editoriais — viram-se condenados no tribunal de Sintra a pagar-lhe uma indemnização no valor de 730.000 euros (!) pelos textos e fotografias publicadas, tanto a nível do comentário político como das revistas cor-de-rosa, porque tinham mentido e ofendido gravemente a imagem, o bom nome e a honra de Santana Lopes, bem como violado a reserva da sua vida privada, causando-lhe avultados prejuízos nesse valor.

Recorreram os réus para o Tribunal da Relação de Lisboa, que manteve o entendimento que tinham actuado ilegalmente e deviam indemnizar Santana Lopes, embora baixando o montante dos prejuízos para 395.000 euros (!).

O processo chegou ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que, no passado dia 13 de Julho, veio esclarecer que Santana Lopes não tinha direito a receber qualquer indemnização já que os jornalistas e responsáveis editoriais não tinham actuado ilegalmente, antes o fazendo ao abrigo da liberdade de expressão.

Como foi possível passar de 730.000 para zero euros, perguntarão os leitores? A resposta é simples: contrariamente aos tribunais inferiores, o STJ considerou que, numa democracia, os artigos de opinião, embora mordazes, contundentes e desprimorosos, se situam no cerne do debate e crítica à acção política e governativa e que, mesmo prejudicando a imagem do político visado como homem de Estado junto dos eleitores, não são ilegais. Considerou também que os artigos da imprensa cor-de-rosa, quando o político visado sempre tornou públicos aspectos da sua vida privada e familiar, participando abertamente em eventos sociais, concedendo entrevistas, participando em iniciativas e autorizando a publicação de imagens nas revistas cor-de-rosa, não envolvem violação do direito à reserva da vida privada. E considerou, ainda, que os erros e inexactidões desses artigos cor-de-rosa, embora deontologicamente censuráveis, não afrontavam o direito à honra e à consideração pessoal do visado. Por outras palavras, os tribunais não são agências de comunicação e imagem.

(Declaração de interesses: fui advogado de dois dos réus no âmbito dos recursos)