Macau, o “bom aluno” das regiões administrativas da China, vai a votos este domingo

Este domingo, 300 mil eleitores elegem 14 deputados da Assembleia Legislativa. Nem com um desastre chamado tufão Hato se esperam grandes ganhos para a oposição pró-democracia.

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Os militares chineses trataram das operações de limpeza pós-furacão Tyrone Siu/Reuters

Em Maio, o principal responsável do Governo da China pelos assuntos das duas regiões especiais administrativas do país, Macau e Hong Kong, elogiou o sucesso do antigo território português na “salvaguarda da soberania e segurança nacionais, e no interesse do desenvolvimento”. O recado de Zhang Dejiang era claro: Macau é o bom aluno, que aplica sem levantar ondas o modelo “um país, dois sistemas”; Hong Kong é o aluno rebelde. As eleições deste domingo em Macau mostram bem como estas palavras são verdadeiras.

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Em Maio, o principal responsável do Governo da China pelos assuntos das duas regiões especiais administrativas do país, Macau e Hong Kong, elogiou o sucesso do antigo território português na “salvaguarda da soberania e segurança nacionais, e no interesse do desenvolvimento”. O recado de Zhang Dejiang era claro: Macau é o bom aluno, que aplica sem levantar ondas o modelo “um país, dois sistemas”; Hong Kong é o aluno rebelde. As eleições deste domingo em Macau mostram bem como estas palavras são verdadeiras.

“Os responsáveis chineses olham para Macau como o modelo político do que Hong Kong deveria ser: cumpridor com os desejos do Partido Comunista e absolutamente patriótico”, escreve a revista britânica Economist. Os protestos pró-democracia na antiga colónia britânica têm crescido em dimensão e ruído – por causa disso, por exemplo, enquanto Pequim não teve qualquer problema em fazer aplicar em Macau uma lei de segurança, conhecida como Artigo 23, que pune a traição e o secessionismo, a oposição em Hong Kong obrigou a China a adiar a sua entrada em vigor.

Há quatro anos, quando os 300 mil eleitores registados em Macau puderam votar para escolher os 14 membros eleitos directamente para a Assembleia Legislativa de 33 lugares (os restantes são nomeados pelo chefe-executivo do território, Fernando Chui, por associações tradicionais chinesas e do campo laboral, assim como outros grupos de interesse escolhidos pelo governo), a oposição conseguiu menos de um quarto dos votos. Em Hong Kong, numas eleições equivalentes, o ano passado, os candidatos pró-democracia conseguiram mais de metade dos lugares e os eleitores escolheram mesmo seis deputados que defendem renegociar as relações com a China.

A imagem dos militares do Exército de Libertação do Povo nas ruas de Macau, em Agosto, quando o governo local se viu obrigado a pedir ajuda à China para enfrentar as consequências do tufão Hato, em Agosto, seria impensável em Hong Kong. Em Macau, apesar das críticas da oposição (foi a primeira vez que os militares chineses foram chamados às ruas de Macau desde 1999), a população recebeu bem os soldados, descansada por ver alguém que parecia saber o que fazer face ao tufão que devastou parte da ilha, fez dez mortos e 200 feridos, deixando parte da população sem água ou electricidade durante dias.

À partida, as duas regiões teriam mais em comum do que a separá-las. O Reino Unido entregou Hong Kong à China em 1997; dois anos depois seguia-se a transferência de Macau. Ambas são administradas sob o princípio “um país, dois sistemas”, que lhes permite manter os seus sistemas de governo durante 50 anos. A grande diferença é que o movimento pró-democracia em Hong Kong está efervescente, enquanto em Macau este activismo é quase inexistente e os seus líderes admitem não esperar mudanças nos próximos tempos.

Riqueza e incompetência

A riqueza é o primeiro factor de diferenciação apontado por analistas e activistas. Macau tornou-se no maior centro de jogo do mundo e o negócio dos casinos gera empregos bem pagos. O ano passado, o PIB (produto interno bruto) per capita em Macau era de 554,619 patacas (mais ou menos 57 mil euros), um dos maiores do mundo, 68% mais alto do que o vizinho situado a 60km, do outro lado do delta do rio das Pérolas. Outra diferença é que os habitantes de Hong Kong consideram o seu governo local eficaz. “Enquanto Hong Kong pode opor-se à intervenção de Pequim, os macaenses consideram-na adequada face ao que vêem como um governo podre” e incapaz, diz o politólogo Eilo Yu Wing-yat, da Universidade de Macau, ouvido pelo South China Morning Post, jornal com sede em Hong Kong.

Em Macau, não há partidos (em Hong Kong, sim) e as 24 listas que se apresentam dividem-se entre o bloco pró-democracia, os pró-Pequim e as listas ligadas a associações profissionais e empresariais (Angela Leong On-Kei, a quarta mulher do magnata dos casinos, Stanley Ho, é candidata à reeleição). Desta vez, alguns alimentam expectativas de mudança. Por causa do tufão Hato há muitos habitantes furiosos, sem saber bem em quem votar para castigar o governo.

“Todos os políticos tentam usar o tema para conseguir vantagem, mas os pró-democratas foram os primeiros a criticar o governo”, nota o comentador Larry So Man-yum. Nada disto garante que mais reformistas sejam eleitos – em parte porque o sistema eleitoral, uma adaptação do método D'Hondt, favorece a eleição de poucos deputados por lista, de forma a impedir a criação de um bloco coeso de deputados que pudesse desafiar o status quo.

Medo da mudança

Sou Ka-hou, um dos mais reconhecidos activistas pró-democracia de Macau, candidato a um lugar na Assembleia, diz que os macaenses se interessam muito pouco pela política, em grande parte por viverem bem. “Poderíamos esperar que a juventude tendesse a apoiar os candidatos mais jovens. Mas não, na verdade, temem que os jovens activistas possam destruir a estabilidade relativa em que vivem”, explica ao South China Morning Post o candidato de 26 anos.

Em 2014, Sou liderou um protesto que juntou 20 mil pessoas na rua contra uma lei que previa reformas elevadas para ex-dirigentes. Foi a maior manifestação na cidade desde 1989, quando os habitantes saíram à rua contra o massacre de Tiananmen. A lei ficou na gaveta e alguns falaram do “despertar político” de Macau; Sou sabe melhor do que ninguém que não foi e não acredita que Pequim alguma vez vá dar mais margem política à região. É por isso, afirma, que não vai desistir se não conseguir ser eleito e diz “estar na política para uma luta de longo prazo”.