Os LCD Soundsystem fintam as regras do rock

Tiveram um “final perfeito” para regressarem não muito depois, irritando e entusiasmando fãs. American Dream, o novo disco, põe em causa um “legado”, diz James Murphy, que não sabe estar parado.

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2 de Abril de 2011. Artur Peixoto pode dizer ”I was there”, repetindo o mantra de James Murphy em Losing my edge. O promotor de concertos, 40 anos, esteve no suposto último concerto dos LCD Soundsystem no Madison Square Garden, em Nova Iorque. Naquela “sala monstruosa”, instalou-se “um ambiente familiar” e, durante mais de três horas, houve alegria, lágrimas e “momentos extraordinários”, como quando os Arcade Fire fizeram coros em North american scum. Não era um concerto qualquer: era a (alegada) despedida de um grupo que mudou a forma como o rock e a música de dança se tocam, o ponto mais alto da carreira de uma improvável estrela rock — James Murphy, então com 41 anos — num tempo que parece não as querer gerar. Artur não acreditou que aquele fosse o fim — preferiu ver um “hiato”. E acertou. O fim dos LCD foi cancelado com um single natalício no fim de 2015 e vários concertos em 2016, incluindo Paredes de Coura. Houve quem se irritasse com tão rápido regresso depois de tão pomposo “fim”. Esta semana, Murphy admitiu que fazer daquele concerto o último foi uma “brincadeira” para vender bilhetes, mas garantiu que a ideia de acabar o grupo já andava na cabeça dele. Quando viu This Is Happening (2010), o terceiro álbum do grupo, no top 10 da Billboard, suspeitou que o próximo disco “fosse o grande”, aquele que mais vende e que menos canções boas tem — e deu vários exemplos que provam a sua teoria, dos U2 aos Talking Heads. “OK, parece que nos vamos tornar em algo de muito grande agora. Não queria”, confessou à Vulture. Não queria, mas é possível que isso aconteça depois de 1 de Setembro, dia em que American Dream é editado. Murphy anuncia “uma fase completamente nova para a banda” e diz que nunca se sentiu tão bem com um álbum dos LCD.

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2 de Abril de 2011. Artur Peixoto pode dizer ”I was there”, repetindo o mantra de James Murphy em Losing my edge. O promotor de concertos, 40 anos, esteve no suposto último concerto dos LCD Soundsystem no Madison Square Garden, em Nova Iorque. Naquela “sala monstruosa”, instalou-se “um ambiente familiar” e, durante mais de três horas, houve alegria, lágrimas e “momentos extraordinários”, como quando os Arcade Fire fizeram coros em North american scum. Não era um concerto qualquer: era a (alegada) despedida de um grupo que mudou a forma como o rock e a música de dança se tocam, o ponto mais alto da carreira de uma improvável estrela rock — James Murphy, então com 41 anos — num tempo que parece não as querer gerar. Artur não acreditou que aquele fosse o fim — preferiu ver um “hiato”. E acertou. O fim dos LCD foi cancelado com um single natalício no fim de 2015 e vários concertos em 2016, incluindo Paredes de Coura. Houve quem se irritasse com tão rápido regresso depois de tão pomposo “fim”. Esta semana, Murphy admitiu que fazer daquele concerto o último foi uma “brincadeira” para vender bilhetes, mas garantiu que a ideia de acabar o grupo já andava na cabeça dele. Quando viu This Is Happening (2010), o terceiro álbum do grupo, no top 10 da Billboard, suspeitou que o próximo disco “fosse o grande”, aquele que mais vende e que menos canções boas tem — e deu vários exemplos que provam a sua teoria, dos U2 aos Talking Heads. “OK, parece que nos vamos tornar em algo de muito grande agora. Não queria”, confessou à Vulture. Não queria, mas é possível que isso aconteça depois de 1 de Setembro, dia em que American Dream é editado. Murphy anuncia “uma fase completamente nova para a banda” e diz que nunca se sentiu tão bem com um álbum dos LCD.

Imperativo fazer

Não tinha saudades dos LCD Soundsystem. “Casei-me, tive um filho, fiz um filme, trabalhei com David Bowie, co-produzi um disco dos Arcade Fire. Houve um monte de coisas que gostei mesmo de fazer e que teriam sido impossíveis se tivesse estado nos LCD”, confessou à Vulture. Fez mais: abriu um wine bar em Brooklyn; criou um sabor de café; bandas sonoras; sonhou dar novos sons aos torniquetes do metro de Nova Iorque... “Fico sempre intrigado com as pessoas que dizem ‘Estou aborrecido’. Vai-te foder — o mundo é infinitamente entusiasmante. Aprende a fazer uma cadeira. Descobre como ser canalizador. Faz olaria. Entra no mundo do vinho”, disse.

Fazer. Arriscar. Foi isso que fez quando pôs em marcha os LCD para se vingar dos The Rapture — pouco antes, tinha medo de assumir o papel de frontman. Foi também isso que fez com American Dream. “Estou a arriscar o meu legado comicamente alcançado ao gravar um novo disco. Tivemos um final perfeito e, por melhor que American Dream seja, esse legado é deitado ao lixo.”

A julgar pelos três temas já editados, é pouco provável que tal aconteça. Mostram uma banda a respeitar e a aumentar o seu legado. Como algumas das melhores canções dos LCD, Call the police vai ganhando epicidade através da repetição (começa lenta e deixa-se apoderar por guitarras a planar sobre um irresistível ritmo — o baixo é um tratado de como fazer o corpo mexer). American Dream desacelera e convoca camadas de sintetizadores para surgir como perfeita balada para o dia seguinte à festa (“You took acid and looked in the mirror/ Watched the beard crawl around on your face”). Já Tonite deverá juntar-se a Losing my edge e Yeah no lote das canções dos LCD capazes de fazer de um festival de Verão um clube nocturno — de repente, estamos de novo em 2002.

Hugo Moutinho, 47 anos, atende-nos depois de uma reunião com os parceiros da Discotexas, editora de música de dança, que começou com uma conversa sobre Tonite, canção lançada naquele dia na net. Para ele, que é também DJ e co-gerente da loja Louie Louie, os LCD tornaram-se “um amor para a vida”. Louva-lhes o talento para fazer canções sem “vergonha” das suas influências, de irem de versões dos Suicide, punks com teclados, a Carl Craig, senhor do tecno. “Conseguiram-se ligar-se as tantas facções. É preciso ter um background muito grande em termos de conhecimento musical e interesses para se poderem ligar a tanta gente, absorverem tanta coisa e serem relevantes e tocarem em tantas pessoas”, defende.

Apesar de algo “magoado” com o rápido regresso dos LCD, Rui Maia (Mirror People, X-Wife) não esquece a importância da banda e outros nova-iorquinos, sobretudo naqueles primeiros anos do século. “Foi por causa dos Strokes que formámos os X-Wife porque queríamos fazer música com as nossas referências passadas, como os Velvet”, conta o músico de 37 anos. “Os Strokes e os LCD tinham uma posição relaxada, ligada ao punk, ao do it yourself. Tinham coisas não tão produzidas, contavam as histórias com que te identificas. O James Murphy sempre esteve bem no papel do mais cool do mundo.” “É um ícone, como o Bowie para gerações anteriores, o Prince ou o Michael Jackson. É um ícone indie”, observa Hugo Moutinho. Um “ícone” que mantém a sua relevância em 2017, aos 47 anos? Lizzy Goodman, autora de Meet Me in the Bathroom, crónica do rock de Nova Iorque nos anos 2000, vê nele alguém que fintou a tradicional história de ascensão e decadência. A jornalista recua a 2002 e a Losing my edge, o primeiro single da banda. Nele, Murphy falava a partir do pedestal de melómano, alcançado após anos de esforço e coleccionismo, para confessar estar a “perder a vantagem” para os jovens que chegam a toda a música já gravada com meia dúzia de cliques no rato. “Ele é um óptimo marketeer. Uma das coisas brilhantes foi ter feito a banda em cima dessa ideia de estar obsoleto, de o seu tempo ter passado, de ser velho para ser fixe”, diz Goodman. “Quando fazes isso, colocas-te, estranhamente, numa posição incrível porque passa a não haver um momento em que te sentes datado, um momento em que o teu tempo passou porque, logo de início, disseste que o teu tempo passou.”