Às portas da cidade, a Aldeia de Couce procura uma nova vida
A quatro quilómetros de Valongo, percorrer a pitoresca Aldeia de Couce é fazer uma viagem no tempo. Nos dias de Verão, são os visitantes que dão vida ao local.
Portugal é um país de aldeias remotas, cheias de passado e longe do ruído e do caos da cidade. Entre as serras de Santa Justa e Pias, nas margens do Rio Ferreira, há uma aldeia mesmo à porta da cidade, onde muitos passam e poucos são os que ficam.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Portugal é um país de aldeias remotas, cheias de passado e longe do ruído e do caos da cidade. Entre as serras de Santa Justa e Pias, nas margens do Rio Ferreira, há uma aldeia mesmo à porta da cidade, onde muitos passam e poucos são os que ficam.
Apenas quatro quilómetros separam a Aldeia de Couce da área urbana do concelho de Valongo, mas a distância parece ser maior. “Quem vem da cidade e não conheça isto diz que entra no paraíso”, comenta Eva Almeida, uma das 12 pessoas que ainda lá habitam. As casas, revestidas de xisto e com histórias escondidas em cada canto, chamam à atenção por manterem o seu aspecto rústico e antigo, com um passado ligado às minas.
Eva nasceu em Couce e todos os dias vai trabalhar fora da aldeia. Quando se lembra da sua infância, recorda de imediato os tempos em que “a quantidade de casas que existia era maior e quase formava uma fila desde a zona da Azenha". Ali havia "muitas crianças e agora não tem nada disso".
No início do percurso, avista-se uma placa que identifica Couce como uma das Aldeias de Portugal, uma rede que traz um novo conceito de turismo rural, tendo a preservação do património como objectivo. O caminho para se chegar lá já se faz por uma calçada fácil de caminhar, muito diferente do que acontecia há alguns anos, em que a lama, a terra e as pequenas pedras dificultavam o percurso. “Isto era tudo terra batida, com buracos, não tinha electrificação e o correio ficava na Azenha, agora não”, explica Manuel Moreira, um visitante de São Martinho do Campo.
Em 2008, Couce ganhou um novo fôlego com a criação do Corredor Ecológico, um percurso de oito quilómetros entre a área urbana e as serras. Apesar de os habitantes terem vindo a diminuir ao longo dos anos, os que vêm de visita são cada vez em maior número.
Quando o Verão traz a vida
É especialmente na época de Verão que muita gente parte à descoberta de novos sítios para fugir do movimento da cidade. Couce tem-se tornado um desses destinos e os habitantes não se importam. Eva considera que são estes momentos que fazem renascer “uma aldeia que não tem vida” e que por vezes cai no esquecimento.
“Vem muita gente aqui porque gosta e é um óptimo sítio”, comenta Regina Ferreira, enquanto prepara o almoço numa das habitações que este fim-de-semana, com o “Couce em Festa”, se tornou um local de passagem concorrido. Também vem de São Martinho do Campo e encontra na Aldeia de Couce o bucolismo que muitos procuram e que traz consigo a vantagem de ficar perto da cidade: “Só o respirar com estas árvores é diferente. Isto traz-nos saúde”, acrescenta.
Esta foi a primeira vez que a aldeia abriu verdadeiramente as portas à cidade: "Foram os próprios habitantes a chamar-nos, disseram que estavam disponíveis e fizemos a festa dentro da aldeia”, explicou José Manuel Ribeiro, presidente da Câmara Municipal de Valongo. “Dentro das serras, esta é a nossa pérola”, acrescentou.
O autarca diz não ter dúvidas de quem por ali passa fica satisfeito, "ainda por cima sem a confusão dos carros e da cidade. Podem vir a pé, de bicicleta ou a cavalo, o que interessa é que venham”, sublinha.
“As aldeias só existem se morarem lá pessoas”
O investimento na aldeia tem sido visível com os novos caminhos e a realização de mais actividades, mas há algo que ainda falta fazer: “Falta as casas estarem mais arranjadas”, explica Manuel Martins, outro habitante que reside ali desde pequeno. Vive com os irmãos numa casa ao lado da capela, também ela encerrada há alguns anos por falta de pessoas.
A opinião é partilhada por Eva, que diz ter ido “tudo abaixo”. Quem passa pelos caminhos da aldeia vê muros cobertos com plantas, onde antes existiam habitações que não resistiram ao desgaste, à idade e à própria natureza. “Só não desapareceram estas casas porque há aqui meia dúzia de pessoas de idade, senão já tinham desaparecido também”, explica.
Segundo o presidente da autarquia, têm sido concentrados esforços para “recuperar todo o edificado que está caído”, mas “não é fácil, porque os proprietários não estão disponíveis”.
A festa vai estar em Couce até domingo, e depois a Aldeia volta ao sossego normal que a caracteriza. Por enquanto, as casas vão continuar ali e os habitantes também vão resistindo. Para Eva, o futuro naquele local, que considera ser o seu paraíso, é difícil de imaginar: “Quando saírem os velhinhos acaba a aldeia, a não ser que as pessoas de fora transformem isto, porque as aldeias só existem se morarem lá pessoas”, explica. Mas assegura: “Vou continuar aqui até fechar os olhinhos”.
Texto editado por Nuno Pacheco