Indústria reconhece que taxa sobre refrigerantes baixou consumo

Associação de produtores defende que o Governo deve reformular imposto e criar novo escalão “isento para bebidas com baixo teor energético”.

Foto
Rui Soares (colaborador)

A taxa adicional em sede de IABA (Imposto sobre o álcool, as bebidas alcoólicas e as bebidas adicionadas de açúcar ou outros edulcorantes), que o Governo de António Costa introduziu e que passou a vigorar há seis meses (de 1 de Fevereiro a 1 de Agosto), já teve várias consequências, sobretudo ao nível do preço para o consumidor final, garante a indústria.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A taxa adicional em sede de IABA (Imposto sobre o álcool, as bebidas alcoólicas e as bebidas adicionadas de açúcar ou outros edulcorantes), que o Governo de António Costa introduziu e que passou a vigorar há seis meses (de 1 de Fevereiro a 1 de Agosto), já teve várias consequências, sobretudo ao nível do preço para o consumidor final, garante a indústria.

Embora sublinhe que “é ainda prematuro fazer uma avaliação do impacto” da carga fiscal introduzida em Fevereiro - e que se recusa a designar “taxa de açúcar” porque recai apenas sobre um tipo de produto “independentemente de ter ou não açúcar” - a Associação Portuguesa das Bebidas Refrescantes Não Alcoólicas (Probeb) defende que a medida já provocou um encarecimento extraordinário às bebidas.

O imposto, garantiu Francisco Mendonça, secretário-geral da Probeb, em resposta escrita ao PÚBLICO, “está a ter um efeito acentuado sobre o consumo devido ao aumento de preços”. “Principalmente”, explica, “no canal alimentar [super e hipermercados e comércio de proximidade]. “Situamos o aumento de preço” na distribuição alimentar “entre 25% e 30% no valor final para o consumidor”, afirma, “após a entrada em vigor do imposto”.

Defende a organização que a evolução do preço “tem um efeito muito significativo em Portugal, dado o poder de compra limitado dos consumidores e o preço relativo destes produtos, também afectado por um IVA a 23%”. Para a Probeb, face aos mesmos seis meses de 2016, “a categoria [na distribuição alimentar] está a ser afectada [em 2017] com uma queda de mercado entre três a cinco pontos percentuais”.

Antevendo “que os consumidores se adaptem ao novo nível de preços”, a associação de produtores acredita que “os consumos estabilizem” e que “a queda do consumo vá diminuindo” e fixando-se, mas “num nível inferior” ao anterior.

Contudo, no canal Horeca (de hotéis, restaurantes e cafés), “com o crescimento do turismo, índices de confiança dos consumidores em crescendo e uma metereologia favorável, em conjunto com alguma estabilidade nos preços ao consumidor final”, descreve, “temos observado um ligeiro crescimento dos volumes vendidos”. Ainda assim, um aumento “reduzido”, afirma, “por comparação” com o “verificado em outras categorias de bebidas de alta rotação, que registam um crescimento de 8% a 12%”, neste tipo de distribuição.

O Ministério da Saúde avançou, em Junho, com dados que apontavam para um recuo de 72% dos volumes para as bebidas mais açucaradas entre Fevereiro e Abril - o que significa uma queda de mais de dois terços no trimestre em causa. A Probeb recorda que o alargamento do IABA a bebidas não alcoólicas adicionadas de açúcar a partir de 1 de Fevereiro teve “um regime transitório para os stocks”. Ou seja, as bebidas que os comerciantes já tinham nos seus estabelecimentos - fornecidas antes de 1 de Fevereiro - puderam ser comercializadas sem a taxa adicional até à data-limite de 31 de Março.

Conforme alertou a Ahresp - Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (Ahresp) em véspera de incidência da nova taxa, até 15 de Abril foi obrigatório “contabilizar e comunicar à Autoridade Tributária” as quantidades dos produtos abrangidos pelo novo imposto que tivessem sido fornecidos aos comerciantes antes da entrada em vigor do novo imposto. Contactado, o Ministério da Saúde não comenta.

Taxa a 70 litros por cabeça

O Ministério das Finanças, contactado, não respondeu sobre qual o valor já cobrado com o “novo” IABA desde Fevereiro. A partir desse mês, passaram a estar abrangidas por uma carga fiscal adicional as bebidas não alcoólicas “adicionadas de açúcar ou de outros edulcorantes” (excepcionando-se se a adição era por sumos de frutas ou hortícolas); sidra e hidromel com teor alcoólico entre 0,5% e 1,2%; e concentrados (em xarope ou pó) a serem preparados por retalhistas ou pelos próprios consumidores finais .

Definiu o legislador que haveria, para estas bebidas, dois escalões: para os produtos abaixo de 80 gramas de açúcar por litro, a carga fiscal é de 8,22 euros por cada hectolitro (ou cem litros); e acima de 80 gramas, a taxa duplica, para 16,46 euros por cada hectolitro.

Ou seja, por cada litro de refrigerante comprado o Estado recebe, só com o novo imposto, entre oito a 16 cêntimos, aproximadamente. Medido em latas de 33 cl (o tamanho mais frequente), a carga fiscal varia entre 2,7 a 5,4 cêntimos para cada unidade com aquele volume. 

Se tomarmos a média de consumo anual de refrigerantes referenciada pela Probeb para o mercado nacional, de que cada português ingere 70 litros de refrigerantes por ano (menos de metade da média do Reino Unido), cada consumidor no país terá pago ao Estado, só com aquela categoria de bebidas, em Fevereiro de 2018 - quando passar 12 meses do novo imposto e se o mesmo não for alterado - 5,75 euros ou 11,52 euros (consoante o grau de açúcar de bebida escolhida, com menos ou mais açúcar). E, se quiséssemos mesmo jogar com os números - e não extrapolando para crescimentos adicionais à conta do forte turismo registado no território nacional - diríamos que para uma população de 10 milhões de habitantes a 70 litros per capita, o que estamos a falar é de uma receita adicional, num ano, de 57 a 115 milhões de euros para os cofres públicos. A estimativa inicial, aquando a discussão do Orçamento do Estado para 2017, em Outubro de 2016, era, aliás, de 80 milhões de euros.

Novo escalão, precisa-se

A introdução do imposto “conduziu a uma maior rapidez na redução dos teores energéticos das bebidas”, defende a associação que reúne, entre outros, a Coca-Cola, a Unicer, a Sumol+Compal, a Santál e as duas cervejeiras insulares - Empresa de Cervejas da Madeira e a açoriana Fábrica Melo Abreu.

“Mas o imposto”, acrescenta Francisco Mendonça, com os seus dois escalões “levou a indústria a passar rapidamente todo o volume que conseguiu para o escalão com menor taxa”. Resultado? “No primeiro semestre de 2017”, defende a associação, o teor calórico dos refrigerantes era 18% inferior “face ao ano de 2013”.

O secretário-geral da Probeb alerta contudo que “a actual estrutura do imposto (com os dois escalões) não incentiva a continuação das reformulações”, nomeadamente nas bebidas “que já paguem a taxa menor, porque pagam todas o mesmo, incluindo as que têm baixo teor energético ou mesmo sem calorias”.

É, para a Probeb, “essencial redesenhar o imposto” e o Governo aceitar “a criação de um escalão isento para as bebidas com baixo teor energético”, que, para a indústria, “incentive a reformulação dos produtos” e que “elimine” o que vê como uma “discriminação”.