A fuga para a frente
Há vozes republicanas que decididamente não se revêm neste Presidente nem nas suas políticas.
Nada como ter um inimigo interno para compensar uma derrota externa. É assim que pensa Donald Trump, que equilibra uma derrota no Senado com a limpeza de pessoas na Casa Branca.
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Nada como ter um inimigo interno para compensar uma derrota externa. É assim que pensa Donald Trump, que equilibra uma derrota no Senado com a limpeza de pessoas na Casa Branca.
É assim que os líderes pequenos exercem o poder que têm. E é assim que Trump quer disfarçar no fluxo noticioso a sua grande derrota política. Ao dar aos apoiantes trunfos para encherem as redes sociais de discussões bacocas, disfarça aparentemente o caos que reina nos gabinetes de Washington.
O falhanço na destruição do Obamacare foi tão mais estrondoso porque configurou a recusa republicana em aceder aos ditames de Trump. A sessão no Senado foi simbólica: é verdade que foi John McCain o ultimo a votar contra — e o responsável imediato pelo fim do processo legislativo. E sim, o peso que a carreira de McCain acarreta implica um simbolismo renovado para o voto final.
Mas é também muito sintomático que a grande oposição a esta acção de Donald Trump tenha vindo de duas mulheres com história no Partido Republicano. Lisa Mukowski, senadora do Alasca, e Susan Collins, senadora do Maine, foram as mulheres que desde o início se opuseram aos esforços de Trump para banir o Obamacare sem se preocupar em colocar uma alternativa de pé.
Foram também elas, bem mais do que McCain, que sentiram na pele o peso das suas acções: os insultos repetidos nos estúdios de televisão pelas figuras de referência da direita ultraconservadora são quase tão irreproduzíveis como os comentários do novo responsável de comunicações da Casa Branca.
E foram estas senadoras que deram o verdadeiro sinal desta votação: que o Partido Republicano profundo não está disposto a alinhar com Donald Trump de forma incondicional e que o poder não é para manter a todo o custo. Em 2019, o país volta a votos e muitos candidatos republicanos serão confrontados com as políticas irreais desta administração. As duas senadoras, junto com o histórico McCain, demonstram que a autocracia de Donald Trump não encontrará um caminho aberto. É verdade que os interesses vão prevalecer muitas vezes e que o peso dos lobbies instalados será superior ao sentido de justiça e utilidade que muitos representantes eleitos terão. Mas há vozes republicanas que decididamente não se revêm neste Presidente nem nas suas políticas.
E é importante ter em conta que esta não será, de todo, a única vez que o Partido Republicano precisará de impor a sua voz face a Trump. Será uma situação repetida, que poderá ganhar contornos dramáticos se algum cenário de impeachment ganhar credibilidade suficiente para ser discutido. Com o caso russo a crescer em complexidade, esta possibilidade caminha a passos largos para se tornar realidade.