Floresta: um negócio político!
O Governo, sob o pretexto de querer reformar o setor, usou a floresta, como um meio, para chegar a um acordo político.
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É comum e habitual que os acordos políticos sejam um meio para que todas as partes (leiam-se partidos políticos) se entendam por forma a atingir um bem maior, que é encontrar soluções que melhorem o mundo em que vivemos.
Na reforma da floresta esses valores, da democracia, foram totalmente invertidos.
O Governo, sob o pretexto de querer reformar o setor, usou a floresta, como um meio, para chegar a um acordo político. Ou seja, secundarizou os interesses de todos aqueles que vivem e usufruem da floresta para saldar os negócios políticos, que hoje alimentam uma maioria de esquerda, na manutenção do apoio a este executivo governamental.
Lamentavelmente ficaram para trás os 400 mil produtores, a floresta e a promessa de uma reforma consensual.
Das 12 propostas que o Governo “empacotou” para a floresta, sete foram aprovadas por decreto-lei (apenas pelo Governo e sem hipótese de discussão parlamentar) e cinco foram enviadas para a Assembleia da República para a obtenção de um “enorme” consenso parlamentar.
Das sete propostas impostas por decreto lei já foi requerida apreciação parlamentar de três delas (pelo BE, PCP e PSD).
Das cinco propostas de lei, remetidas para aprovação parlamentar, uma foi adiada para as calendas pelo BE, devido à forte contestação sobre o conteúdo da mesma. Sobraram quatro para discussão e votação.
Destas quatro só três foram aprovadas, e só dois conseguiram reunir os votos positivos do PS, BE, PCP e PEV. Parece curto para quem ambicionava um consenso, o mais alargado possível, para se “alcançar uma reforma para uma geração”.
O Banco de Terras, uma proposta essencial para a reforma segundo o Ministro da Agricultura, foi reprovado com os votos do PCP, um dos partidos que apoia o governo no parlamento.
Dos dois diplomas aprovados um não cumprirá os objectivos pretendidos. É o caso do cadastro simplificado cujo resultado das negociações de última hora levou a que a versão aprovada não contenha nenhum procedimento para que se fique a conhecer o património sem dono, aquele que inicialmente o Governo pretendia colocar no banco de terras para ser gerido pelo Estado. Sem um mecanismo de procedimento que identifique as terras sem dono conhecido de pouco ou nada servirá a existência na lei de um cadastro.
Apenas um diploma aprovado pela maioria de esquerda terá consequências, infelizmente graves. É a possibilidade de transferir a produção de eucalipto de zonas no interior do país para terrenos mais produtivos, localizados no litoral, limitando gradualmente a área de cultivo. O preconceito ideológico contra uma espécie levou à aprovação de uma das medidas mais injustas e prejudiciais para os territórios de baixa densidade. A cegueira política foi tal que impediu a maioria de ponderar uma proposta do PSD que visava a promoção da biodiversidade, através da obrigatoriedade de executar “projectos de conservação” pelos produtores de eucaliptos, evitando a discriminação sem fundamento e a depressão a que regiões do interior ficarão sujeitas.
O consenso alargado que o Governo alcançou na reforma da floresta resume-se a isto: transferência de área plantada com eucaliptos entre regiões, privilegiando o litoral ao interior.
Não foram acordadas medidas que promovam o rendimento e a gestão florestal, não foram aprovadas ações para o ordenamento florestal e utilização do espaço rural, não foi aperfeiçoado o sistema nacional de defesa da floresta contra incêndios, não se inovou em matéria da promoção ativa da biodiversidade e conservação do ecossistema.
Perante o insucesso das negociações politicas entre o Governo e os partidos de esquerda, o Ministro da Agricultura já veio comunicar que legislará por decreto-lei, evitando assim novos falhanços políticos e afastando a necessidade de consensos, seja com as forças politicas seja com o sector.
É verdade que o processo da reforma da floresta foi uma derrota, em toda a linha, para este Governo, que sai bastante fragilizado das negociações à esquerda. Mas não é menos verdade que, infelizmente, com estes joguetes políticos, perdemos a oportunidade de reformar a floresta e de a encarar como um dos melhores ativos que realmente o país possui e, no fim de tudo, quem acabou por perder foi Portugal.
O autor escreve segundo as normas do novo acordo ortográfico