O texto seguinte foi produzido por um dos participantes do segundo Workshop Crítica de Cinema realizado durante o 25.º Curtas Vila do Conde – Festival Internacional de Cinema. Este workshop é formado por um conjunto de masterclasses e debates com convidados internacionais e pela produção de textos críticos sobre os filmes exibidos durante o festival, que serão publicados, periodicamente, no site do PÚBLICO e no blogue do Curtas Vila do Conde.
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O texto seguinte foi produzido por um dos participantes do segundo Workshop Crítica de Cinema realizado durante o 25.º Curtas Vila do Conde – Festival Internacional de Cinema. Este workshop é formado por um conjunto de masterclasses e debates com convidados internacionais e pela produção de textos críticos sobre os filmes exibidos durante o festival, que serão publicados, periodicamente, no site do PÚBLICO e no blogue do Curtas Vila do Conde.
A magnitude majestosa da paisagem, a beleza da cor, a delicadeza da pureza: o convite à contemplação parece ser irrecusável, mas a claustrofobia é assoladora. A imposição de um contacto exacerbado com aquilo que poderia constituir o quadro perfeito de um território, de uma cidade, de um sítio habitado e visitado por indivíduos que procuram existir em harmonia com a natureza no seu estado primordial exige um escape natural. A beleza é perigosamente constante. Assim, muitos partem e poucos ficam. Uma paisagem marcada por uma maravilhosa praga de flores que torna insustentável a vida dos indivíduos, onde a fuga do suposto paraíso é a única alternativa.
Este é o postal que recebemos: as hortênsias que invadem a ilha de São Miguel, nos Açores, são o cenário que deslumbra o espectador de Flores (2017), de Jorge Jacóme. É um retrato ficcional das belezas e dos perigos de uma ilha perdida no meio do mar (e da civilização), numa narrativa dividida em três capítulos que nos apresenta os que ficam, os poucos que se agarram àquilo que é seu, dentro da tragédia do exagero do real e do belo. Rosa & Andrade, o primeiro capítulo, retrata as histórias de dois militares destacados para o controlo da praga de hortênsias, onde a pureza da sua ligação se conjuga de forma única com as flores que compõem a paisagem. Novas Oportunidades revela as histórias das comunidades estrangeiras que, perante a perspectiva de uma (belíssima) tragédia nacional, procuram extrair aquilo que, mesmo nos mais maravilhosos cenários, pode emergir; Despedidas, o último capítulo, demonstra a esperança do povo que se mantém agarrado àquilo que é seu – o território, a nação, a religiosidade, a tradição, a identidade local e nacional – e a expectativa de um futuro promissor após o caos de todas as partidas e fugas, onde somente os nomes cravados na madeira parecem sugerir a anterior existência de vida.
O postal que recebemos aposta na hiperbolização metafórica da realidade actual, de abandono fácil daquilo que é (tão) nosso, (tão) local, (tão) nacional. Onde a esperança e a resiliência parecem existir somente num grupo restrito de indivíduos; onde as perspectivas de remediação ou de aproveitamento dos desafios apresentados pela vida para aprendizagem e para a criação de alternativas parecem ser praticamente inexistentes.
O postal que recebemos aposta, igualmente, num eufemismo visual, onde a delicadeza da abordagem, a pureza dos gestos, a suavidade dos registos nos convida à contemplação das histórias, das pessoas, dos espaços, das hortênsias. O mau, perigoso e assustador, transforma-se no belo, amistoso e sedutor: ou será que já o seria, mas simplesmente não o víamos? Flores sugere uma resposta, mas o final é suspenso: o futuro – que está nas nossas mãos, e não nas de outros – o dirá.