Relatório da CGD iliba governos de pressões políticas sobre o banco

O deputado que escreveu o relatório preliminar da comissão de inquérito à gestão da Caixa Geral de Depósitos diz que “não foi possível demonstrar” que tenha havido “pressões” para concessão de crédito.

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paulo pimenta

As conclusões apanham vários governos e por isso várias gestões da Caixa Geral de Depósitos. O relatório da comissão de inquérito à gestão da Caixa Geral de Depósitos desde 2000 diz que os problema dos grandes créditos concedidos decorreram de “erros de análise” ou de “erros de projecção” e não de “pressões políticas” que tenham sido feitas pelo accionista Estado sobre as diversas administrações do banco público.

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As conclusões apanham vários governos e por isso várias gestões da Caixa Geral de Depósitos. O relatório da comissão de inquérito à gestão da Caixa Geral de Depósitos desde 2000 diz que os problema dos grandes créditos concedidos decorreram de “erros de análise” ou de “erros de projecção” e não de “pressões políticas” que tenham sido feitas pelo accionista Estado sobre as diversas administrações do banco público.

“Não é possível demonstrar pelas audições efectuadas que as necessidades de capitalização tenham ocorrido decorrentes de crédito concedido por pressões [do accionista]. Em nenhuma audição houve qualquer declaração que pudesse demonstrar que houve pressão da tutela para aprovar créditos”, disse o relator Carlos Pereira, em conferência de imprensa.

O deputado acrescentou ainda que pelo que foram as audições na comissão de inquérito, os grandes créditos problemáticos são sobretudo, segundo as explicações dos diferentes administradores, “decorrentes de erros de análise ou de erros de projecção dessas mesmas análises”.

Essa é uma das conclusões do relatório preliminar da CPI, que vai ser discutido e debatido no dia 18 de Julho (até dia 10 os partidos podem apresentar propostas de alteração). No documento, o relator Carlos Pereira escreve que “nas questões relacionadas com a alegada necessidade de capital, decorrente das opções da concessão de crédito, os testemunhos recolhidos afastam a ideia de pressões da tutela e estabelecem as explicações para, quanto muito, erros de análise de projecto e de previsão ou à inesperada dimensão da crise económica e financeira que teve início com o subprime em 2008”.

Perante isto, Carlos Pereira insiste que “não ficar demonstrado não quer dizer que não houve” pressões. Ora para avaliar essas pressões, o relator admite que os documentos que não chegaram ao Parlamento seriam importantes. “Porventura, a documentação poderia ajudar. Não existindo, as conclusões ficaram do ponto de vista das audições, não houve um único governante ou administrador que tenha sofrido ou tenha feito pressão”, disse o relator.

Quando questionado como foi possível chegar a esta conclusão apenas a partir de audições – uma vez que no caso do BES e do Banif houve mais audições e as responsabilidades foram sobretudo alcançadas através da análise de documentos e não de audições – Carlos Pereira admite que a documentação poderia “permitir aprofundar mais algumas questões, mas essa documentação não está disponível. Quando estiver, se estiver, se algum partido achar que é conveniente, estou certo que ele ocorrerá”, disse.

O deputado do PS, falando como relator e dizendo que não fala em nome do partido, admite que haja uma apreciação parlamentar que seja pedida no futuro quando for e se for conhecida alguma documentação. “Não colocaria de parte, caso exista uma decisão indefectível dos tribunais em relação à cedência de documentação que seja dado seguimento a esta matéria. Parece pacífico no que é o trabalho da Assembleia da República, não excluo essa possibilidade”. Contudo, acrescentou mais tarde, “é preciso ter em consideração que é um banco em funcionamento e está em concorrência de mercado”, mas é possível fazer um trabalho, admitiu, “sem colocar em causa o trabalho da Assembleia da República”.

O relatório preliminar entra agora numa fase de discussão, mas tendo em conta que aponta responsabilidades ao anterior Governo pela “recapitalização pelos mínimos” de 2012 será de prever que nem o PSD nem o CDS aceitarão estas conclusões. Carlos Pereira rejeita a tese de “ataque a partidos”. “Não estou de acordo que seja um ataque a partidos. O relatório traduz o que se passou na comissão de inquérito e nas diferentes audições - e o acervo documental que tivemos acesso”, defendeu. Para o deputado socialista, o relatório é transversal e admite “responsabilidades de diferentes governos”.

Para futuro, ficam algumas recomendações que saem do trabalho da comissão de inquérito, como, por exemplo, a manutenção da Caixa Geral de Depósitos “100% pública” ou a introdução de “mecanismos sistemáticos e formais, de diálogo e relacionamento efectivo com a tutela, de modo a evitar decisões casuísticas relativamente a aspectos estratégicos”. O relator nega que esta recomendação signifique uma “ingerência” do Governo no banco público, dizendo que é preciso distinguir entre questões operacionais e questões estratégicas.

Além destas recomendações, Carlos Pereira recomenda ainda que se reveja o regime jurídico das comissões parlamentares de inquérito, tendo em conta que esta comissão foi “singular” e teve vários constrangimentos, nomeadamente a recusa de entrega de documentação, a dificuldade de trabalho por causa das sucessivas suspensões e ainda o facto de não haver uma estabilização do objecto do inquérito. Isto porque num momento inicial, quando é proposta a CPI, PSD e CDS queriam avaliar a recapitalização de 2016 e depois esta acabou por ficar fora, apenas sendo possível questionar sobre os factos que levaram a que ocorresse.