“O que se passou não é mais do que desinvestimento sucessivo nas Forças Armadas”
Há oficiais a apelar a uma manifestação contra a exoneração “temporária” de comandantes. AOFA está a recolher informações sobre o protesto para decidir se se junta ou não.
Nos anos da austeridade, Manuel Pereira Cracel foi presidente da AOFA - Associação de Oficiais das Forças Armadas. Foram anos difíceis, diz em conversa com o PÚBLICO por telefone. Foram difíceis e têm consequências à vista, continua. O coronel não tem dúvidas: o assalto aos paióis de Tancos deve-se ao desinvestimento nas Forças Armadas, uma marca deixada pelo anterior Governo e ainda não apagada por este.
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Nos anos da austeridade, Manuel Pereira Cracel foi presidente da AOFA - Associação de Oficiais das Forças Armadas. Foram anos difíceis, diz em conversa com o PÚBLICO por telefone. Foram difíceis e têm consequências à vista, continua. O coronel não tem dúvidas: o assalto aos paióis de Tancos deve-se ao desinvestimento nas Forças Armadas, uma marca deixada pelo anterior Governo e ainda não apagada por este.
“No tempo em que as Forças Armadas estavam dotadas era inconcebível que um paiol estivesse sem ninguém a fazer a vigilância dessas instalações”, diz. O tom é de espanto e de indignação: “Custa-me conceber e não concebo.”
Pereira Cracel não está sozinho nas críticas. Quem alinha pela mesma tese é o presidente da Associação Nacional de Sargentos (ANS), Mário Ramos. Apesar de não querer comentar a forma como o executivo tem gerido este caso, faz questão de apontar o dedo às opções políticas de sucessivos governos.
“Toda esta situação é muito grave. Aconteceu porque as Forças Armadas estão praticamente exauridas de meios materiais e humanos, começou em 2005 [ainda no Governo socialista de José Sócrates] e aprofundou-se no Governo PSD/CDS.” Mas o actual Governo não sai ileso: o presidente da ANS lamenta que o executivo de António Costa ainda não tivesse reposto o que foi cortado às Forças Armadas. “Era tempo de deixarem de estar preocupados com a redução do défice”, diz.
Pereira Cracel pensa o mesmo. Aliás, essa discussão é, para este coronel, mais importante do que a que se está a gerar à volta da necessidade de haver ou não demissões: “Nunca fui adepto de demissões, não resolve coisa nenhuma”, diz, defendendo antes uma “alteração” de atitude política. Ou seja, “com este ou outro ministro”, o que importa é que se reconheça o papel atribuído às Forças Armadas pela Constituição, argumenta.
Apesar do tom de estupefacção com que, volta e meia, Pereira Cracel pontua a conversa sobre o assalto, o coronel não foi apanhado assim tão de surpresa. Pelo menos neste sentido: os oficiais alertaram o poder político para os eventuais resultados do desinvestimento que estava a ser feito. “Havia de ter consequências. O que se passou não é mais do que o desinvestimento sucessivo das Forças Armadas. Foram quatro anos de austeridade. Ressalvando detalhes em investigação, a responsabilidade maior é do poder político. Na altura chamámos à atenção para o desinvestimento, cortes nas despesas de manutenção, de funcionamento, nos equipamentos, tudo associado a uma redução drástica de efectivos…”
O PÚBLICO tentou contactar o actual presidente da AOFA, mas sem sucesso. Um silêncio que não existe, porém, na página da associação no Facebook. Um exemplo apenas: o presidente da assembleia geral, Joaquim Formeiro Monteiro, também fala na “suborçamentação sucessiva”, também diz que ao longo dos tempos o poder político foi alertado, e também questiona o executivo: “Há quanto tempo, o Ministério da Defesa era conhecedor das dificuldades que afectam as Forças Armadas?”
Outra questão que está a levantar polémica nas redes sociais é da exoneração “temporária" de cinco comandantes, para que não interfiram “com o processo de averiguações”. Segundo o Expresso, alguns oficiais estão de forma espontânea a convocar por email outros oficiais para se manifestarem fardados na quarta-feira, em Belém. Contactada pelo PÚBLICO, a AOFA disse que não esteve na origem da iniciativa e que está a tentar recolher informação sobre o protesto. Para já, não adianta se se junta ou não à manifestação.