Estudo científico comprova vantagem das atletas com excesso de testosterona

O trabalho foi encomendado pela IAAF e as suas conclusões podem levar a mudanças na admissão de atletas como Caster Semenya ou Dutee Chand em provas de atletismo.

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Caster Semenya durante os Jogos Olímpicos de 2016, no Rio de Janeiro Reuters/LUCY NICHOLSON

É o estudo científico mais completo realizado até ao momento sobre a existência ou não de vantagens competitivas das atletas com níveis elevados de testosterona. Foi publicado nesta terça-feira, no British Journal of Sports Medicine, e confirma o benefício que atletas como a sul-africana Caster Semenya, campeã olímpica dos 800m, ou a indiana Duttee Chand têm quando competem com outras sem essa característica.

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É o estudo científico mais completo realizado até ao momento sobre a existência ou não de vantagens competitivas das atletas com níveis elevados de testosterona. Foi publicado nesta terça-feira, no British Journal of Sports Medicine, e confirma o benefício que atletas como a sul-africana Caster Semenya, campeã olímpica dos 800m, ou a indiana Duttee Chand têm quando competem com outras sem essa característica.

Stéphane Bermon e Pierre-Yves Garnier, os autores do estudo encomendado pela Federação Internacional de Atletismo (IAAF na sigla inglesa), demonstraram uma “diferença estatisticamente significativa” no desempenho de atletas femininas com níveis elevados de testosterona face a atletas femininas com níveis mais reduzidos nos Mundiais de atletismo de 2011 e 2013 e em cinco outros eventos seleccionados.

O estudo deixa à vista os efeitos potenciadores do desempenho atlético da testosterona, reabrindo o controverso debate sobre identidade sexual e híper-androginia (condição médica caracterizada pelo excesso de hormonas masculinas como a testosterona) na alta competição, escreve o diário britânico The Guardian, que acrescenta: “Utilizar a testosterona como medida para categorizar atletas masculinos e femininos não é perfeito, mas é a melhor solução de que dispomos.”

Os investigadores mediram os níveis de testosterona no sangue de 1332 atletas femininas em competição em 21 disciplinas do atletismo durante os Mundiais de 2011 e 2013. Aquelas com níveis mais elevados tiveram um desempenho melhor do que as outras – como por exemplo nos 400m (2,7% mais rápida), 400m barreiras (2,8% mais rápida), 800m (1,8% mais rápida), lançamento do martelo (4,5% mais longo) e salto com vara (2,9% mais alto).

“O nosso ponto de partida é a defesa, protecção e promoção da equidade nas competições femininas. Como o estudo demonstra, em determinadas provas as atletas com níveis mais elevados de testosterona podem ter vantagem competitiva entre 1,8% e 4,5% relativamente às atletas com níveis mais baixos. Imagine-se a magnitude da vantagem das atletas cujos níveis de testosterona estão nos valores normais para atletas masculinos”, apontou Stéphane Bermon.

A testosterona é a substância mais utilizada entre as atletas femininas para melhorar o desempenho, acrescentou o autor. Das 116 atletas que se encontravam suspensas por doping em Dezembro de 2016, 64 tinham acusado positivo a hormonas andrógenas, indicou o The Guardian. Entre os benefícios da testosterona para as atletas inclui-se um aumento da capacidade do sangue transportar oxigénio, o desenvolvimento de massa muscular magra e o aumento da determinação e agressividade, assim como maiores capacidades visuais-espaciais.

A IAAF informou que este estudo “faz parte de um conjunto de provas” que está a recolher, no sentido de reabrir o processo no Tribunal Arbitral do Desporto (TAD), que suspendeu em 2015 os regulamentos do organismo para restringir a participação em provas de algumas atletas.

Os dados apurados por este estudo não vão impedir Semenya e outras atletas com híper-androginia de participar nos Mundiais de atletismo que decorrem em Londres em Agosto, mas poderão ter impacto significativo nas audições que o TAD vai levar a cabo este mês.