Tuk-Tuks em Lisboa: “Se esta guerra for de rufias nós vamos perdê-la”

A Câmara de Lisboa apresentou uma proposta no final do ano passado para que os tuk-tuks passassem a ser eléctricos, mas o documento ainda não entrou em vigor. As empresas destes veículos que surgiram há cerca de quatro anos sentem-se “discriminadas”.

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Tuk tuks têm 116 lugares para pararem os veículos em Lisboa, mas os profissionais queixam-se que “não são suficientes” Enric Vives-Rubio

Há três anos que os dias de Verão de António - que pediu para ser assim identificado - são passados no assento da frente do tuk-tuk. Tem 25 anos, é guia há três e desde então que os problemas são os mesmos. Poucos lugares para estacionar, várias ruas em que não pode circular e muitas multas para pagar. “É uma verdadeira discriminação. Parece o apartheid da animação turística”, refere João Tarrana, sócio da empresa EcoTuk Guide, na qual António trabalha.

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Há três anos que os dias de Verão de António - que pediu para ser assim identificado - são passados no assento da frente do tuk-tuk. Tem 25 anos, é guia há três e desde então que os problemas são os mesmos. Poucos lugares para estacionar, várias ruas em que não pode circular e muitas multas para pagar. “É uma verdadeira discriminação. Parece o apartheid da animação turística”, refere João Tarrana, sócio da empresa EcoTuk Guide, na qual António trabalha.

Ora poluem, ora fazem barulho ou causam problemas no trânsito. “Se os tuks passarem todos a eléctricos, e é para aí que caminhamos, deixam de poluir e de fazer barulho. Além disso são veículos pequenos e podem andar a 50 quilómetros por hora, que é a velocidade máxima permitida para circular na cidade”, refere João Tarrana, que é também coordenador do Departamento de Operadores de Veículos Motorizados da APECATE (Associação Portuguesa de Empresas de Congressos, Animação Turística e Eventos).

Porém, a proposta apresentada pela Câmara de Lisboa no dia 21 de Dezembro de 2016 - que pretende obrigar todos tuk-tuks a passarem a eléctricos - não foi aprovada. O regulamento foi para consulta pública, mas não voltou à Assembleia Municipal com a incorporação dos contributos da consulta e nem sequer foi ainda votada pelo executivo.

De qualquer forma, a empresa de João Tarrana já está preparada, caso o regulamento passe a vigorar na capital.  Mas teve de investir 150 mil euros para trocar os dez tuks da sua empresa por eléctricos. “Tivemos de vender os dez tuks a gasolina e comprar outros tantos eléctricos novos e com matrícula branca. Foi um investimento muito grande”, explica.

“Pagava 40€ para ir para casa?”

Florêncio Almeida, presidente da associação de táxis ANTRAL, refere que “os tuk-tuks são uma concorrência para os táxis e que, inclusivamente, fazem viagens como se fossem táxis em vez de se limitarem a fazerem roteiros turísticos”.

Esta acusação é frequentemente associada a estes veículos, mas João Tarrana nega que corresponda à realidade. “Quer dizer, o guia esteve a estudar, fala línguas, sabe sobre a arquitectura e história da cidade e tem uma cultura acima da média e depois faz mais barato que o táxi?”, questiona. “E, além disso, quem pagava 40 euros para ir para casa? É que esse é o valor mínimo por uma viagem”, acrescenta.

Os tuk-tuks podem apanhar passageiros em qualquer lado e “só é contra a lei se o passageiro pedir para ir para um sítio fora do programa que a empresa apresentou à câmara, como é o caso, por exemplo, do aeroporto ou do estádio do Benfica. Mas se fizer parte dos circuitos não há problema em fazer o trajecto que o passageiro queira" explica João Tarrana. “E se o turista quiser ir só de um sítio para outro, aviso logo que sou mais caro e vou a fazer tour na mesma”, explica António. “As pessoas criam cenários que não são reais”, completa o patrão.

“Esta discriminação não pode existir”

João Tarrana, no papel de coordenador do Departamento de Operadores de Veículos Motorizados da APECATE, queixa-se de uma “discriminação” dos tuk-tuks por parte da autarquia. “Há sinais pela cidade que dizem 'proibido a veículos afectos a actividade turística não pesados'. Agora não me digam que estão preocupados com o constrangimento da via, com a poluição e com o ruído para depois deixarem os pesados circular e a nós não”, aponta. “Quando confrontamos a câmara com este argumento ficam calados”, conta.

“Esta discriminação não pode existir. Não digo que a câmara esteja contra nós, mas está sob pressões dos interesses que já estavam instalados”, refere João Tarrana, referindo-se aos táxis e autocarros turísticos. “Temos falado com os vereadores de todos os partidos na Assembleia Municipal, menos com os do PS, porque não nos receberam. E também não fomos atendidos pelo presidente da câmara. Têm que nos ouvir, pelo menos isso”, menciona.

Além da Câmara, também sentem uma perseguição por parte da Polícia Municipal. “Basta só parar para largar uma pessoa que já dá multa. Até a EMEL já multou um tuk-tuk que tinha o papel do estacionamento pago”, conta António. “Mas não é assim que vão conseguir limitar o número de veículos”, adianta João, queixando-se ainda dos "poucos" lugares que têm para parar enquanto esperam passageiros: "116 na cidade toda é muito pouco para os veículos que há" - refere. 

A Polícia Municipal confirmou ao PÚBLICO que durante 2016 verificou 815 infracções relativas a tuk-tuks e acrescentou que, em 2017, até ao último dia de Maio, verificou 230 infracções relativas a este tipo de veículo. “O número de infracções registado está a mostrar uma tendência para diminuir”, informou, em reposta escrita.

Por seu lado, a Polícia de Segurança Pública, comunicou ao PÚBLICO que desde o início de 2016 até ao dia 22 de Junho de 2017, foram autuados 45 tuk-tuks.

Os tuk-tuks são regulados pelo decreto-lei 108/2009 e registados pelo RNAAT (Registo Nacional dos Agentes de Animação Turística), mas em Lisboa têm um despacho próprio que impõe algumas regras específicas para a capital (Despacho n.º 123-P-2015).

“Acabamos por ir respeitando o despacho, porque não queremos problemas nem somos vândalos. Mas a APECATE, por exemplo, tem uma pessoa no Miradouro Nossa Senhora do Monte para controlar o tráfego e não foram precisas leis”, refere João Tarrana. E acrescenta: “Se esta guerra for de rufias, nós vamos perdê-la, porque nós não o somos”.

Apesar das insistentes tentativas do PÚBLICO, a Câmara de Lisboa não respondeu.