Incêndio transforma aterro sanitário do sotavento algarvio numa incineradora a céu aberto

O aterro está chegar ao fim de vida e a Algar — empresa responsável pelo tratamento dos lixos — mandou abater, antes do licenciamento, mais de uma centena de sobreiros para construir mais uma célula

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O incêndio que deflagrou no sábado à tarde no aterro sanitário do sotavento algarvio, em plena serra do Caldeirão, ainda fumega, lançando no ar cheiros e fumos tóxicos. A origem do fogo é ainda desconhecida, mas os bombeiros, chamados a intervir, encontraram várias falhas no plano de contingência. “Grave, muito grave aquilo que se passou”, disse o presidente da câmara de Loulé, Vítor Aleixo, na assembleia municipal, referindo-se à falta de condições desta infra-estrutura para responder a uma situação de crise.

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O incêndio que deflagrou no sábado à tarde no aterro sanitário do sotavento algarvio, em plena serra do Caldeirão, ainda fumega, lançando no ar cheiros e fumos tóxicos. A origem do fogo é ainda desconhecida, mas os bombeiros, chamados a intervir, encontraram várias falhas no plano de contingência. “Grave, muito grave aquilo que se passou”, disse o presidente da câmara de Loulé, Vítor Aleixo, na assembleia municipal, referindo-se à falta de condições desta infra-estrutura para responder a uma situação de crise.

O aterro sanitário, que recebe o lixo produzido em metade do Algarve (a outra parte é depositada no interior do concelho de Portimão), está quase a transbordar. A empresa concessionária espera que o município aprove a declaração de “interesse público municipal” para o alargamento desta infra-estrutura. O pedido de licenciamento foi feito há dois anos mas ainda não teve resposta.

Os deputados municipais, antes de se pronunciarem sobre o assunto, solicitaram uma visita ao aterro. As dúvidas sobre as questões ambientais e qual o “interesse municipal” em causa levaram a que votação tivesse sido adiada. “Falámos [durante a visita] dos perigos no caso de chuvadas e afinal surgiu um incêndio”, comentou, na segunda-feira à noite, o deputado municipal Fernando Santos, PS, pedindo ao executivo autárquico que tire as devidas consequências sobre o sucedido.

Um outro aspecto polémico, relacionado com o alargamento do número de células do aterro de duas para três, diz respeito ao abate de sobreiros. Antecipando a decisão da assembleia sobre o pedido de ampliação desta infra-estrutura, a empresa responsável pela recolha e valorização dos resíduos sólidos urbanos — Algar — mandou abater mais de uma centena destas árvores protegidas, em zona de Reserva Ecológica Nacional (REN). O acto, disse o administrador da Algar, José Barreto, “foi validado pelo Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICFN) e comunicado à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), a quem compete o licenciamento do aterro”. A devastação ocorreu há cerca de um ano, com o derrube de alguns exemplares de sobreiros com um diâmetro superior a 30 centímetros. No local, ainda é possível ver algumas das raízes espalhadas pelo solo e árvores renascidas com cerca de um metro de altura. “Um crime”, diz Deodato Cavaco, morador na zona e membro da comissão de acompanhamento do aterro. Sobre o incêndio, ainda a lançar nuvens de fumo espesso pelos vales da Cortelha, observa: “As árvores morreram, as pessoas desapareceram, e este incêndio acentua a desertificação”

O administrador da Algar, José Barreto, prevê que o fogo, em fase de rescaldo, esteja extinto nesta quarta-feira. “É fogo que arde sem se ver, as chamas continuam activas”, diz o morador, lembrando o impacto ambiental de uma situação destas. As duas células do aterro acumulam lixo com cerca de 100 metros de altura. Os fortes ventos, que sopravam no sábado, rapidamente fizeram com as chamas saltassem para fora da rede que cerca o aterro. Quando os bombeiros lá chegaram (14h45), oito minutos depois de ter sido dado o alerta, defrontaram-se com uma situação inesperada: não havia disponibilidade de água para o combate, faltava energia eléctrica, o gerador de emergência não existia e o sistema de biogás produzido no aterro não tinha sido cortado. Esta é lista dos “constrangimentos verificados no local” apresentada pelo comando dos bombeiros municipais de Loulé, Irlandino Santos, no relatório preliminar sobre a ocorrência. Apesar da “boa articulação” entre o comando dos bombeiros e os elementos da Algar no terreno, diz, foram muitas as falhas, detectados no decorrer da operação. Um exemplo: “Não estava garantido o corte de gás a ambas as células, situação que só veio a ser garantida após as 16h15, com a chegada do responsável pela segurança”. O aterro dispõe de uma rede de recolha de biogás, extraído dos resíduos, e depois transformado em energia eléctrica.

Sobre os danos do incêndio, José Barreto garante que não terão repercussão no aumento na tarifa aplicada aos contribuintes. “A empresa tem seguro multiriscos, que cobre os prejuízos”, sublinhou. O montante será apurado depois da peritagem, que deverá ter lugar nesta quarta-feira, para determinar a origem do fogo.

Além das telas, ardidas, e do sistema de produção de biogás, danificado, o gestor tem ainda um custo extra: o desvio do lixo para o aterro do Barlavento, em Portimão. O autarca de Loulé garantiu que vai exigir esclarecimentos sobre a origem, causas e consequências deste incêndio. “Tem de haver responsabilidades”, sublinhou Vítor Aleixo, segunda-feira à noite, na reunião da assembleia municipal. O autarca, socialista, adiantou que vai pedir a uma “entidade externa, independente” que faça a monitorização do funcionamento desta infra-estrutura, alvo de polémicas deste há 16 anos, quando iniciou a actividade.