Mil lesados do papel comercial do BES podem só receber primeira tranche da indemnização

Em causa está o facto de esses clientes terem colocado apenas acções judiciais a reclamar créditos junto do BES e das empresas ESI (Espírito Santo International) e Rioforte.

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evr Enric Vives-Rubio

Cerca de 1000 clientes lesados do papel comercial vendido pelo BES poderão não beneficiar na integridade do mecanismo encontrado para os compensar pelas perdas sofridas, recebendo apenas a primeira parte da indemnização, segundo fontes ligadas a este processo.

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Cerca de 1000 clientes lesados do papel comercial vendido pelo BES poderão não beneficiar na integridade do mecanismo encontrado para os compensar pelas perdas sofridas, recebendo apenas a primeira parte da indemnização, segundo fontes ligadas a este processo.

Em causa está o facto de esses clientes terem colocado apenas acções judiciais a reclamar créditos junto do BES e das empresas ESI (Espírito Santo International) e Rioforte, que emitiram o papel comercial, mas não contra outras cerca de 40 entidades e pessoas que também podem ser processados por serem solidariamente responsáveis na emissão e venda do papel comercial, como administradores de empresas do grupo Espírito Santo, auditoras, consultores externos ou seguradoras e seus respectivos administradores.

Os direitos judiciais ainda podem ser assegurados até 7 de Julho, mas sem isso os clientes não terão a garantia de que receberão até 75% do valor investido e perdido, mas apenas cerca de 30%. De acordo com as mesmas fontes, o modo mais fácil de os clientes lesados do papel comercial vendido pelo BES garantirem os seus direitos seria o fazerem notificações judiciais que interrompam os prazos de prescrição.

No final de Maio, foi divulgado pelo grupo de trabalho dos lesados do papel comercial que 1937 clientes aceitaram aderir à solução montada pelo grupo — constituído pela Associação de Indignados e Enganados do Papel Comercial, Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, Banco de Portugal, "banco mau" BES, com mediação do Governo, através do advogado Diogo Lacerda Machado — e que os visa compensar pelos 430 milhões de euros investidos em papel comercial das empresas Espírito Santo International e Rioforte, vendido aos balcões do banco BES, e que foram perdidos com a resolução do banco BES e falência do grupo Espírito Santo, em 2014. Contudo, mais de metade destes clientes não têm os direitos judiciais completamente assegurados e com isso não deverão beneficiar na totalidade da solução encontrada.

O mecanismo de compensação propõe que estes clientes recuperem 75% do valor investido, num máximo de 250 mil euros, se tiverem aplicações até 500 mil euros. Já acima desse valor, irão recuperar 50% do valor investido. A intenção é fazer o pagamento de forma faseada, com a primeira parcela (cerca de 30% do total) a ser paga já este ano, sendo o restante valor reembolsado em 2018 e 2019 (recebendo os clientes uma garantia estatal).

O valor será pago aos clientes lesados por um fundo de indemnizações, a ser criado, e que para a primeira tranche se irá financiar junto da banca. Contudo, o objectivo é que este mecanismo consiga fundos próprios. É por isso que aos clientes que aderem à solução é exigido que cedam os direitos judiciais dos processos já colocados em tribunal, para que seja o fundo a assumir a litigância desses processos na Justiça e receba eventuais compensações decididas pelos tribunais ou em acordos extrajudiciais.

É aqui que entra a necessidade de os clientes avançarem com acções judiciais contra outras entidades que não apenas BES, ESI e Rioforte, mas também contra entidades que são “solidariamente responsáveis”. É que, pelas contas de fontes ligadas ao processo, com a reclamação de créditos ao BES é garantido cerca de 32% do dinheiro necessário e mais 5% nos processos contra a ESI e Rioforte – ou seja, praticamente o equivalente à primeira tranche a ser paga —, e só com as restantes acções judiciais sobre as restantes entidades o fundo garante que provavelmente conseguirá mais dinheiro em tribunal.

Sem essa garantia de recuperação de dinheiro, o fundo teria de se socorrer do Orçamento do Estado para pagar as tranches de 2018 e 2019 aos clientes lesados, o que o Governo quer garantir que não acontecerá, até para evitar que a solução do papel comercial tenha impacto nas contas públicas.

O PÚBLICO já tinha noticiado no início do mês que estava prestes a prescrever o prazo para os clientes porem todas as acções judiciais necessárias.

Já em Junho do ano passado, a Associação dos Enganados e Indignados do Papel Comercial (AIEPC) tinha dado indicação de que os lesados deveriam manter ou accionar ações judiciais para acautelar os seus interesses, recomendando que “procedam a notificações judiciais avulsas" com a ajuda dos seus advogados.

Contactado pela Lusa, o advogado Nuno Vieira, que trabalha com a associação de lesados do papel comercial, disse estar tranquilo quanto aos direitos que os seus 800 clientes têm garantidos, afirmando ainda que já desde 2016 vem informando as pessoas lesadas “relativamente a determinados prazos e à vantagem em cumpri-los, nem que fosse por cautela processual”. Recordou ainda que, apesar de os lesados poderem pôr as acções judiciais contra as outras entidades até 7 de Julho, início das férias judiciais, no caso das notificações conta a data de envio e, se forem enviadas em cima da hora, o tribunal não se responsabiliza pelo atraso na recepção.

A solução para os lesados do papel comercial, nomeadamente o enquadramento legal da criação do fundo, ainda está no Parlamento para aprovação, devendo ser discutida no dia 23 de Junho.