“Europa não pode impor regras cegas”

Jardim Gonçalves não está optimista com o futuro da Europa. Faltam convicções e uma constelação de grandes figuras que, tal como no passado, mudam tudo.

Foto
“A Europa só é Europa se respeitar as diferenças entre os seus Estados” Nuno Ferreira Santos

O fundador do BCP diz que a Europa tem de saber respeitar as diferenças entre os seus Estados, tal como fazem a Suíça e os Estados Unidos.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O fundador do BCP diz que a Europa tem de saber respeitar as diferenças entre os seus Estados, tal como fazem a Suíça e os Estados Unidos.

A Europa está a andar num caminho errado?
A Europa só é Europa se respeitar as diferenças entre os seus Estados, como fazem a Suíça ou os EUA. E para respeitar as diferenças não pode impor regras cegas. É uma mácula que entra na soberania de cada país. E não é assim que se constrói a Europa. Estou de acordo com tudo o que seja lutar contra regras que destroem a soberania de um país e põem em causa o seu desenvolvimento. E o Estado português devia recuperar alguma influência que perdeu dentro de algumas grandes empresas, porque quem não defende os grandes também não defende os pequenos.

Mas da Europa, agora, os sinais são de alívio.
Mas a saída do Reino Unido é muito negativa para os que ficaram. Claro que o Reino Unido também vai sofrer, mas vai acabar por estabelecer acordos e relações de modo a defender os seus interesses. Porque não tendo havido mudança de divisa, não tendo um problema de controlo de espaço e de fronteiras, não será tão afectado. Acho que a negociação com a União Europeia (UE) devia ser pacífica e só não vai ser porque a UE não quer que outros sigam o mesmo caminho. Dentro do Reino Unido pode haver alguma divisão entre regiões, mas nem isso sei. E ninguém pergunta: por que é que vai sair? Porque não se respeitaram as diferenças. E há povos que vão muito por uma evolução e outros que preferem revoluções. A Inglaterra é tranquila, gosta de evoluções, não entra em grandes mudanças, as alterações de lei são raríssimas, enquanto a França já não é assim, tudo é por convulsões.

Não está optimista?
Não. Acredito muito em constelações, no surgimento, num determinado momento, de um grupo de figuras de várias áreas que aparecem e são motivo de respeito e de admiração. No meu tempo de estudante, havia um conjunto de figuras que todos admirávamos: o João Salgueiro, o Vítor Wengorovius, o Nuno Portas, a Maria de Lurdes Pintassilgo, a Teresa Santa Clara Gomes, o João Bénard da Costa. E nós, da idade deles, compreendíamos o que queriam. E depois veio outra geração, a de Jorge Sampaio, de Miguel Galvão Teles. E, em termos internacionais, é a mesa coisa. Houve, na Segunda Grande Guerra, o Eisenhower e o Churchill. E depois apareceram o Monnet, o De Gaulle e o Delors. E o Delors, para promover a coesão, tinha reservado uma hora fixa para comunicar com todo o seu staff de modo alargado. E ninguém marcava reuniões nesse período, tal era o seu prestígio. São estas constelações de grandes figuras que mudam tudo. E não as vejo agora. Faltam as convicções.