Empresas financeiras lideram revolta dos accionistas contra políticas sobre alterações climáticas da ExxonMobil
Enquanto o compromisso da Administração Trump com o acordo climático vacilava, a votação da Exxon demonstrava que as preocupações com o clima estão a ganhar terreno no mundo dos negócios.
Na quarta-feira, a administração da ExxonMobil foi derrotada por uma revolta dos accionistas devido às alterações climáticas, quando investidores que detém 62,3% das acções votaram para ordenar ao gigante petrolífero que apresentasse relatórios sobre o impacto de medidas mundiais concebidas para limitar as alterações climáticas a 2°C.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Na quarta-feira, a administração da ExxonMobil foi derrotada por uma revolta dos accionistas devido às alterações climáticas, quando investidores que detém 62,3% das acções votaram para ordenar ao gigante petrolífero que apresentasse relatórios sobre o impacto de medidas mundiais concebidas para limitar as alterações climáticas a 2°C.
A revolta dos accionistas na reunião anual da ExxonMobil em Dallas foi liderada por grandes empresas de consultoria financeira e gestores de fundos, que tradicionalmente desempenhavam papéis passivos. Apesar de a identidade dos votantes não ter sido revelada, uma fonte disse que a grande firma de consultoria financeira BlackRock tinha usado os votos das suas acções para se opor à administração da Exxon e que a Vanguard e a State Street tinham, provavelmente, feito o mesmo. Estes três gigantes financeiros tinham ponderado abertamente votar contra a administração sobre esta resolução chave.
A votação dos accionistas sobre as alterações climáticas chegou no dia em que o Presidente Trump deu sinais de que iriam abandonar o Acordo de Paris sobre o Clima (agora já confirmada), sublinhando as profundas divisões políticas e económicas em relação à forma de lidar com este desafio global. Enquanto o compromisso da Administração Trump com o acordo climático vacilava, a votação da Exxon demonstrava que as preocupações com o clima estão a ganhar terreno no mundo dos negócios.
A BlackRock e a Vanguard são as maiores accionistas da ExxonMobil, detendo 13% das acções da empresa (no valor de 43,6 mil milhões de dólares). A State Street Global Advisers, outra grande empresa de consultoria financeira que apelou a mais transparência relativamente ao clima, aparece pouco atrás, com 5,1% das acções. A votação destas empresas contra a administração marcou um passo importante para os grupos que tentam obrigar as empresas a adoptar maiores níveis de divulgação e transparência relativamente às consequências financeiras das alterações climáticas.
A BlackRock, que afirmou que a transparência relativa ao clima é uma das suas principais prioridades, tinha alertado no seu site: “A nossa paciência não é infinita.”
“Esta é uma vitória sem precedentes para os investidores, na luta para garantir uma transição suave para uma economia com baixas emissões de carbono”, disse o Auditor-Geral do Estado de Nova Iorque, Thomas P. DiNapoli, um administrador do New York Common Retirement Fund (Fundo Comum de Aposentações de Nova Iorque), que foi um dos co-promotores da resolução dos representantes. “As alterações climáticas são um dos maiores riscos a longo prazo que enfrentamos no nosso portfólio e têm um impacto directo no negócio central da ExxonMobil”, afirmou DiNapoli, em comunicado.
Esta resolução, que foi co-promovida pelo fundo de pensões da Cidade de Nova Iorque, afirma que a empresa “deve analisar os impactes nos recursos e reservas de petróleo e gás natural da ExxonMobil num cenário em que a redução da procura resulta de restrições ao carbono e regulações relacionadas com isto, ou de compromissos adoptados pelos governos consistentes com o objectivo de de 2°C, acordado a nível mundial.”
Esta resolução acrescenta que “esta apresentação deve avaliar a resiliência do portfólio completo de reservas e recursos da empresa até 2040 (e mais além) e analisar os riscos financeiros associados a um cenário deste tipo.”
Também assinala que outras grandes empresas petrolíferas, incluindo a BP, a Total, a ConocoPhillips e a Royal Dutch Shell, já apoiaram a análise relativa aos 2°C.
O site da BlackRock introduziu um sentimento de urgência sobre este tema.
“Como investidor de longo prazo, estamos dispostos a ser pacientes com as empresas quando a nossa comunicação garante que estas estão a trabalhar para responder às nossas preocupações”, afirmou.
No entanto, também acrescentou: “quando não vemos progressos, apesar de uma comunicação contínua, ou quando as empresas respondem de forma insuficiente aos nossos esforços para proteger os interesses económicos no longo prazo dos nossos clientes, não hesitaremos em exercer o nosso direito de voto contra as recomendações da administração.”
A Fidelity Investments afirmou que iria adoptar os Princípios para um Investimento Responsável da ONU, apesar de um porta-voz ter declarado que isto era apenas uma “formalização daquilo que já fazemos há muito tempo.”
A perspectiva de grandes empresas de gestão financeira se unirem a fundos de pensões como os da Califórnia e de Nova Iorque – que apoiaram resoluções sociais e ambientais no passado – já está a colocar algumas empresas numa posição defensiva.
Este mês, foram adoptadas resoluções semelhantes – que exigiam que a administração explicasse como as alterações climáticas podiam afectar os seus negócios – na Occidental Petroleum e na PPL, uma grande empresa de holdings. Os accionistas da Occidental apoiaram a resolução com uma maioria de 67% (incluindo a BlackRock), a sua primeira votação contra uma administração de empresa devido às alterações climáticas. Resoluções parecidas não conseguiram ser aprovadas por pouco, incluindo na Dominion (com 48% dos votos) e na Duke Energy e Southern Co (com 46% dos votos em ambas).
Os accionistas principais também criticaram o conselho de administração da ExxonMobil. Preocupados com o resultado da votação de quarta-feira, na terça-feira a gigante petrolífera divulgou uma adenda ao seu comunicado aos representantes, fornecendo mais argumentos e informações, de forma a reforçar a sua recomendação de que os accionistas deviam rejeitar resoluções sobre a capacidade de resposta do conselho de administração da empresa.
Apesar de a administração ter vencido, a votação revelou um descontentamento alargado nos accionistas da Exxon. Uma das resoluções – que exigia que um director que se candidatasse sem adversário conquistasse uma maioria dos votos – foi apoiada por 45,7% dos accionistas, apesar da oposição da administração. Uma resolução que apoiava um presidente independente, separado do presidente executivo, conquistou 32,8% dos votos. E uma resolução que permitiria que 15% dos accionistas pudessem convocar uma reunião extraordinária recebeu 40% dos votos.
É raro a ExxonMobil perder uma resolução de accionistas. No ano passado, a ExxonMobil perdeu uma votação relativa ao “acesso dos representantes”, que permitiria aos grandes accionistas nomear os seus próprios candidatos para o conselho de administração directamente no boletim de voto da empresa. O revés anterior aconteceu em 2006, quando uma resolução relativa à eleição de directores recebeu cerca de 52% dos votos. Posteriormente, a empresa implementou uma nova política sobre as demissões dos directores.
A reunião anual da ExxonMobil foi a primeira para Darren W. Woods como presidente executivo. Este assumiu o cargo depois da saída de Rex Tillerson, o actual Secretário de Estado dos EUA.
Apesar de a empresa ter escrito duas cartas abertas a incentivar o Presidente Trump a manter-se no Acordo de Paris sobre o clima, a ExxonMobil continuou a ser alvo de críticas e litigação sobre se divulgou de forma adequada as consequências climáticas de queimar combustíveis fósseis.
Alguns grupos de governo empresarial incentivaram a ExxonMobil a divulgar mais do que o modesto comunicado que actualmente apresenta à Secutities and Exchange Comission (Comissão de Valores Mobiliários).
Mas outros peritos dizem que a incerteza relativa à dimensão e às consequências das alterações climáticas fazem com que a transparência seja inútil.
Num painel recente na Câmara do Comércio sobre se a SEC deveria exigir mais transparência, Daniel Yergin, historiador e especialista na indústria petrolífera, disse que os eventos que acontecem daqui a 30 anos podem não ter consequências materiais para as grandes empresas de petróleo e gás e que isto “ultrapassava o alcance daquilo que os investidores necessitam para tomar decisões”. Yergin afirmou que havia uma diferença entre cenários e previsões que fornecem bases para o planeamento financeiro. E a regulação financeira não deve transformar-se em regulação climática, acrescentou.
“A regulação climática deve ser deixada nas mãos de governos com experiência e não de reguladores financeiros”, disse Yergin.
Mas Gretchen Goldman, directora de ivestigação no centro de ciência e democracia da União dos Cientistas Preocupados, disse que os investidores “têm razão quanto à possibilidade de as alterações climáticas colocarem riscos materiais às empresas; isto é mais um sinal de que os investidores estão a exigir esta informação e não estão satisfeitos com a actuação das empresas.”
Goldman afirmou que as alterações climáticas iriam convencer os governos a restringir o uso de combustíveis fósseis e que muitas das reservas detidas por empresas de petróleo, gás e carvão poderiam ficar “estagnadas” e nunca serem usadas.
Nos seus documentos aos representantes, a ExxonMobil rejeitou este argumento. A empresa citou a estimativa feita pela Agência Energética Internacional de que seriam necessários entre 11 biliões e 22 biliões de dólares até 2040 para investimento energético na exploração e na produção.
A empresa também afirmou que tinha feito uma divulgação adequada no seu documento anual “Outlook for Energy”, que mais recentemente dizia que a procura global de energia iria aumentar 25% até 2040 e que “o petróleo irá continuar a ser o principal combustível do mundo.”
“Acreditamos que os riscos das alterações climáticas são graves e merecem a tomada de medidas – medidas ponderadas”, disse Woods, repetindo os argumentos dos representantes. Este afirmou que a empresa utiliza um custo de carbono para medir impactos potenciais repetidos. Mas defendeu a missão da empresa, afirmando que “há um imperativo moral para trazer energia a pessoas que vivem em pobreza energética.”
O conflito da Exxon relativo ao acesso aos directores aumentou a fricção com os principais accionistas. Edward Kamonjoh, do 50/50 Climate Project, disse que a ExxonMobil impedia os accionistas de “comunicarem de forma directa e sem filtros” com os directores. Este chamou ao conselho de administração “ossificado”, devido ao modo como escolhe novos directores e aos incentivos financeiros para os directores permanecerem no cargo até aos 72 anos.
Descontente com estes assuntos, a BlackRock votou contra dois directores da ExxnMobil no ano passado.
Este ano, o 50/50 Climate Project está a exortar os accionistas a oporem-se ao director Kenneth Frazier, o presidente do Comité de Assuntos do Conselho de Administração da ExxonMobil, que tem a responsabilidade directa de supervisão das políticas de comunicação com os investidores, planeamento de sucessões no conselho de administração e indemnizações aos directores.
Kamonjoh disse que a adenda da Exxon à declaração aos representantes “parece-me desesperada e, em muitos aspectos, inédita – mas a Exxon é conhecida por no passado ter usado a sua máquina bem afinada para derrotar propostas que parecem destinadas a obter o apoio maioritário dos investidores.”
Os principais accionistas tinham planeado uma resolução semelhante sobre o clima na Chevron, que também realizou a sua reunião anual na quarta-feira. No entanto, esta empresa fez divulgações adicionais e os proponentes da medida retiraram-na, afirmando que iriam procurar mais diálogo com a administração da Chevron para analisar os restantes assuntos.
Exclusivo PÚBLICO/The New York Times
Tradução: Rita Monteiro