Um viva à limitação de mandatos
O estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos que divulgamos esta terça-feira é um retrato frio do nosso mundo autárquico.
Há coisas que já não nos deviam surpreender — mas que, quando são traduzidas em números, nos deixam sempre de boca aberta. Falemos, então, de autárquicas, de autarcas e da nova lei de limitação de mandatos.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Há coisas que já não nos deviam surpreender — mas que, quando são traduzidas em números, nos deixam sempre de boca aberta. Falemos, então, de autárquicas, de autarcas e da nova lei de limitação de mandatos.
A Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) procurou fazer um primeiro balanço da lei que travou os chamados “dinossauros”, autarcas que se perpetuavam na cadeira da presidência. Os resultados do estudo serão sempre preliminares (esta é uma lei recente), mas o que daqui resulta é um retrato frio do nosso mundo autárquico.
O que mais surpreende é isto: ao fim de tantos anos, de várias crises orçamentais, chegámos ao ano de 2013 (o ano das últimas autárquicas) com os vícios de sempre. Respire fundo, aqui vão eles: os presidentes de câmara que não estavam sujeitos à limitação de mandatos aumentavam, em média, as despesas de capital (11,8%), as despesas de pessoal (10,1%) e a as despesas em investimento (14,5%) face a anos não eleitorais. Em contrapartida, os autarcas sujeitos à limitação de mandatos reduziram as despesas com pessoal em 4,3% e não parecem ter aumentado a despesa de investimento. Podemos falar de eleitoralismo?
Para falarmos, temos de dizer tudo. É verdade, as contas das autarquias estão hoje melhores do que em 2001, ano de autárquicas, quando o buraco orçamental no poder local nos empurrou para o primeiro procedimento por défice excessivo. Também é verdade que acabou a loucura das rotundas — e que no imobiliário as tentações diminuíram (quiçá por causa da crise, que também empurrou o negócio para fora de portas). Mas volte a ver os números acima descritos. E anote a data da análise. Se nem em 2013, ano de troika, os autarcas esfriaram os ânimos, que esperança é que podemos ter de que este ano não estaremos a voltar ao mesmo? A resposta certa é... alguma. Porque pelo caminho o Estado aprendeu, criando a Lei dos Compromissos e Pagamentos em Atraso e o novo Regime Financeiro das Autarquias Locais — ambos impondo limitações que antes não existiam. E, já agora, porque temos em vigor a lei que impõe a limitação de mandatos que, ao que nos conta este estudo da FFMS, parece ter ajudado a renovar alguns métodos no poder local.
Alguns, repito. Sabia que, dos 160 autarcas que não se puderam recandidatar à presidência da câmara onde exerciam o mandato, 75 foram candidatos à presidência da assembleia municipal, três integraram uma lista para a câmara e dez candidataram-se à presidência de outro município? Pois, ainda vamos ter de revisitar esta lei. É deixar passar estas eleições e ver o que diz o próximo estudo. Depois falamos.