"Boa parte da nossa história ainda está debaixo de água"

Presidente da Associação dos Arqueólogos Portugueses diz que se vive uma situação de “negligência criminosa” no que toca à arqueologia.

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Escavações na baía de Angra do Heroísmo DR

Quase sempre presente no discurso dos políticos quando se trata de evocar a história de Portugal, sobretudo se estão no estrangeiro, a ligação do país ao mar é apresentada como uma marca identitária e como uma oportunidade de futuro. Mas quem olha para o estado a que chegou hoje a arqueologia náutica e subaquática nacional não diria que os políticos lhe dão tamanha importância, defende José Arnaud, presidente da Associação dos Arqueólogos Portugueses (AAP) desde 1995.

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Quase sempre presente no discurso dos políticos quando se trata de evocar a história de Portugal, sobretudo se estão no estrangeiro, a ligação do país ao mar é apresentada como uma marca identitária e como uma oportunidade de futuro. Mas quem olha para o estado a que chegou hoje a arqueologia náutica e subaquática nacional não diria que os políticos lhe dão tamanha importância, defende José Arnaud, presidente da Associação dos Arqueólogos Portugueses (AAP) desde 1995.

“É absolutamente inacreditável que um país como o nosso, com a nossa história, boa parte dela ainda debaixo de água, possa viver de costas viradas para o património que vem ou pode vir do mar, para o manancial de informação que tem”, diz, lamentando a quase completa extinção do Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática (CNANS), um serviço fundamental, ao qual se deve a cartografia arqueológica subaquática do litoral português, um trabalho sempre inacabado. “O que dizer de um serviço de náutica e subaquática que tem arqueólogos que não mergulham, barcos que não navegam e uma laboratório de conservação e restauro onde não há ninguém? Que praticamente não existe.”

Se fosse para lhe encontrar uma sede condigna, definitiva, a mudança do CNANS seria uma boa notícia, diz Arnaud, garantindo que até quinta-feira não havia qualquer informação sobre as futuras instalações. “A Direcção-Geral do Património Cultural tem mantido uma opacidade completa nesta matéria. Sabemos que a renda [no MARL] era muito onerosa e a solução nunca foi boa, mas não se pode mudar aquela reserva arqueológica em 15 dias. Mudar um tanque com um piroga com mais de 2000 anos não é como mudar um móvel da sala.”

Para José Arnaud, o que se passa com o CNANS é o que se passa com a arqueologia no geral – o “desmantelamento de todo o edifício que se construiu em 1997 e que pôs a arqueologia a falar com outras ciências, como a antropologia e a paleobotânica, que fez com que a arqueologia contasse”.

Hoje, com o “mesmo PS no Governo”, assiste-se a uma “situação que é de negligência criminosa” – a lei manda proteger o património, mas o Estado não tem como ou não sabe, diz o presidente da associação dos arqueólogos, alertando para o que aconteceu recentemente no Parque Arqueológico do Vale do Côa, com a vandalização de uma gravura com mais de dez mil anos.