Nas contas do novo G1+6 sobra combate ao terrorismo e falta tudo o resto
Todos os países do G7 concordam em reforçar a luta contra o Daesh e querem que o Facebook e o Twitter façam mais por isso. Mas em temas como o clima e os refugiados os EUA travaram a hipótese de um consenso.
Depois de uma passagem por Bruxelas, onde puxou as orelhas aos outros líderes da NATO quase como se estivesse num comício de campanha nos Estados Unidos, o Presidente Donald Trump aterrou na ilha italiana da Sicília para confirmar uma ideia que já tinha ficado desde a sua eleição, em Novembro do ano passado: com ele na Casa Branca, poucos ficariam surpreendidos se o grupo das sete economias mais avançadas do mundo mudasse o nome de G7 para G1+6.
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Depois de uma passagem por Bruxelas, onde puxou as orelhas aos outros líderes da NATO quase como se estivesse num comício de campanha nos Estados Unidos, o Presidente Donald Trump aterrou na ilha italiana da Sicília para confirmar uma ideia que já tinha ficado desde a sua eleição, em Novembro do ano passado: com ele na Casa Branca, poucos ficariam surpreendidos se o grupo das sete economias mais avançadas do mundo mudasse o nome de G7 para G1+6.
Quinta-feira, na cimeira da NATO, Trump obrigou 27 primeiros-ministros e Presidentes da República a ouvirem uma reprimenda em público sobre a falta de participação no orçamento da aliança atlântica – algo que o seu sucessor, Barack Obama, já tinha dito várias vezes, mas em privado ou com mais gentileza quando precisou de falar para toda a gente ouvir.
E, mais importante do que aquilo que disse, foi aquilo que não disse: pela primeira vez desde o fim da II Guerra Mundial, um Presidente dos Estados Unidos não repetiu as palavras que garantem que um ataque contra um dos aliados é o mesmo que um ataque contra todos eles.
Esta sexta-feira, o Presidente norte-americano voltou a encontrar-se com alguns dos líderes que também estiveram na cimeira da NATO, desta vez na estância turística de Taormina, no Mediterrâneo, para a cimeira do G7. A avaliar pelo resultado das discussões no primeiro dos dois dias de reunião, o Oceano Atlântico cresceu mesmo para os lados desde que Donald Trump chegou à Casa Branca, e será difícil que a distância entre os dois continentes volte a encurtar nos próximos anos.
Reforço do combate ao terrorismo
De todos os assuntos em discussão, só um foi arrumado sem grande debate, como era esperado: Estados Unidos, Canadá, França, Itália, Alemanha, Reino Unido e Japão "mostraram a sua determinação em continuar e reforçar a luta contra o terrorismo", anunciou o anfitrião da cimeira, o primeiro-ministro italiano, Paolo Gentiloni. Em relação às crises migratórias, ao comércio global e ao clima, o saldo foi o que já se antecipava: há seis a puxar para um lado e um gigante a puxar para o outro.
A porta-voz da determinação no combate ao terrorismo foi a primeira-ministra britânica, Theresa May, ainda a gerir as consequências do atentado suicida de segunda-feira num concerto em Manchester que matou 22 pessoas. Numa declaração um pouco diferente do que é habitual nestas cimeiras, os líderes do G7 acolheram a proposta da primeira-ministra do Reino Unido para, todos juntos, apontarem o dedo a empresas como o Facebook e o Twitter – acusadas de não fazerem tudo o que está ao seu alcance para evitarem ser "uma ferramenta poderosa para os terroristas".
"O G7 apela aos fornecedores de serviços de comunicação e às empresas de redes sociais que aumentem de forma substancial os seus esforços para enfrentarem o problema do conteúdo terrorista", lê-se numa declaração assinada por todos os países do grupo.
De acordo com a proposta de Theresa May, o G7 deixa a porta aberta à discussão de medidas legais para que essas empresas sejam obrigadas a apagar contas que partilhem vídeos ou fotografias que glorifiquem o terrorismo. Para já, os líderes políticos ficam-se por um apelo a uma decisão voluntária.
Empresas como o Facebook e o Twitter já encerram contas e apagam conteúdo desse tipo, e disponibilizam aos seus utilizadores ferramentas de denúncia, mas o Reino Unido considera que não fazem o suficiente – Theresa May quer que os donos dessas empresas apresentem às autoridades manuais de procedimentos internos mais claros do que aqueles que existem hoje em dia, e que gastem mais dinheiro em tecnologia para tornarem essa caça mais rápida e mais eficaz.
As empresas em causa – a maioria delas fundadas nos Estados Unidos – têm colaborado com as autoridades em várias investigações, quer de forma voluntária, quer obrigadas por lei, mas resistem a uma abertura total das suas portas, para salvaguardarem o direito à privacidade e para que as chaves dessas portas não acabem por cair também nas mãos de piratas informáticos, o que poderia enfraquecer as estruturas da Web e prejudicar a confiança que existe hoje em dia no comércio electrónico e nas transacções bancárias, por exemplo.
EUA vetam documento sobre migrações
Mas o acordo entre as sete economias mais avançadas do mundo ficou-se pelo reforço do combate ao terrorismo. Ou melhor, os outros assuntos são pacíficos para seis dos sete países, ficando apenas os Estados Unidos – e todo o seu enorme poder de negociação – fora das contas.
Em Taormina, no Mediterrâneo, onde desde o início do ano já morreram mais de 1300 pessoas na travessia entre o Norte de África e a Europa, o Presidente norte-americano rasgou a proposta de declaração que os outros seis chefes de Governo esperavam apresentar ao mundo no final da cimeira.
A Itália tinha preparado um documento de cinco páginas sobre a crise migratória e os refugiados, sublinhando que a responsabilidade dessa crise é de todo o mundo e não de um país em particular, e queria sublinhar o contributo positivo de refugiados e migrantes na Europa. Mas, segundo o jornal britânico The Guardian, a delegação norte-americana atirou esse documento para o lixo e pôs em cima da mesa uma outra, para o G7 "pegar ou largar" – a Administração Trump reconhece os direitos humanos dos migrantes, mas afirma que os países "têm o direito a controlar as suas próprias fronteiras e a estabelecer limites claros para a entrada de migrantes, como parte das suas preocupações de segurança nacional".
No documento original, os italianos queriam chamar a atenção para outros problemas que contribuem para as crises migratórias, como as alterações climáticas – que levam cada vez mais à saída de muitas pessoas das suas terras áridas, por exemplo. Mas também esse esforço ficou pelo caminho, até porque a posição dos Estados Unidos sobre o importante acordo sobre o clima assinado em Paris no ano passado ainda é um mistério.
Durante a campanha eleitoral norte-americana, Donald Trump prometeu sair desse acordo, que na sua opinião limita as possibilidades de crescimento económico dos Estados Unidos ao travar as emissões de dióxido de carbono. No primeiro dia da cimeira do G7, as discussões confirmaram que Trump não vai comprometer-se com uma decisão nem este fim-de-semana nem nos próximos dias, mas a sua equipa de negociadores fez saber que a posição do Presidente norte-americano em relação ao Acordo de Paris "evoluiu". Falta saber para onde – se Trump vai comprometer-se com o que Barack Obama assinou, o que é pouco provável; ou se vai querer negociar a forma como os EUA tinham planeado reduzir as emissões, apostando mais no desenvolvimento de tecnologia para reduzir os impactos das mesmas políticas.