Depois da morte de Chris Cornell: “Já só resta Eddie Vedder. Deixem isso assentar.”

O chamado som de Seattle foi ficando sem ícones e frontmen ao longo dos anos. Uma análise e o espelho das redes sociais, que clamam pela protecção do vocalista dos Pearl Jam.

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Agora, Eddie Vedder está sozinho.

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Agora, Eddie Vedder está sozinho.

A morte de Chris Cornell, o vocalista dos Soundgarden, na quarta-feira à noite pôs os fãs de rock a reflectir sobre a era grunge e muitos chegaram a uma conclusão dolorosa: Vedder, o vocalista dos Pearl Jam, é o único dos ícones do movimento que ainda está vivo.

A história do grunge também é uma história de morte.

Durante a década de 1980, este som (por muito ruidoso que fosse) foi relegado a uma meia-dúzia de bandas de editoras independentes da zona noroeste da costa do Pacífico dos EUA. As canções deste género musical eram tão lúgubres como o céu cinzento de Seattle e o consumo de heroína não era invulgar nos seus praticantes de guitarra na mão. Antes de este género musical explodir nos headphones de adolescentes descontentes da América tradicional, os seus números já estavam a diminuir.

Andrew Wood, vocalista dos Mother Love Bone – que, segundo o New York Times “podia ter sido a primeira das grandes estrelas do rock de Seattle” –, morreu de uma overdose de heroína em 1990. Stefanie Sargent, da banda punk 7 Year Bitch, morreu da mesma maneira, dois anos depois.

Ainda assim, com os êxitos de estreia dos Nirvana e dos Soundgarden a abrir caminho, o grunge invadiu finalmente as ondas sonoras da América, juntamente com as tabelas da Billboard. Em 1994, o género estava provavelmente no seu auge.

Nesse ano, os Pearl Jam tiveram o seu segundo álbum que foi n.º 1 de vendas, Vitalogy. O segundo álbum dos Stone Temple Pilots, Purple, estreou-se na primeira posição das vendas nesse Verão. Jar of Flies, dos Alice in Chains, tornou-se o primeiro EP – extended play, que designa um disco demasiado curto para ser um álbum completo mais demasiado longo para ser um single – a chegar ao topo das tabelas de vendas. E as canções dos Soundgarden e dos Nirvana continuaram a tocar em altifalantes de centros comerciais e em rádios de carros.

Também foi nesse ano que o vocalista dos Nirvana, Kurt Cobain – o líder deste género musical –, apontou uma arma à cabeça e puxou o gatilho, suicidando-se. Na altura, corria-lhe heroína pelas veias.

Foi a primeira grande figura a morrer, mas estava longe de ser a última.

“Como a música deles deixa bem claro, a vida era intoleravelmente dolorosa para muitos dos pares de Cornell”, escreveu Chris Richards, o principal crítico de música pop do Washington Post. “O cantor Layne Staley e o baixista Mike Starr, dos Alice in Chains, morreram ambos de causas relacionadas com drogas, em 2002 e 2011, respectivamente. Em 2015, o vocalista dos Stone Temple Pilots, Scott Weiland, morreu de uma overdose no autocarro da digressão.”

Cornell enforcou-se num quarto de hotel de Detroit, depois de actuar no que viria a tornar-se o seu último concerto com a banda, que ele encerrou com a música In My Time of Dying, dos Led Zeppelin.

No entanto, Vedder, dos Pearl Jam, ainda perdura. Há muito que esta banda assumiu o posto de banda mais duradoura do grunge, tendo lançado álbuns de maneira consistente nos últimos 25 anos.

Vedder era um frontman diferente e os Pearl Jam eram uma banda diferente das outras bandas da era grunge, apesar de os seus membros fundadores incluírem alguns membros dos Mother Love Bone.

No seu auge comercial, os Pearl Jam compunham canções que não eram tão zangadas; eram mais melódicas, mais prontas para serem tocadas em estádios. Para alguns, a banda era mais suave, mais fácil de digerir pelas massas.

Entre estes estava o próprio Cobain, que disse uma vez: “Eles são uma banda de rock segura. São uma banda de rock agradável de que toda a gente gosta”. Noutra ocasião, afirmou: “Acho ofensivo ser metido no mesmo saco de bandas como os Pearl Jam”, de acordo com livro Your Favourite Band is Killing Me, do crítico de rock Steven Hyden.

Ao contrário de muitos dos seus contemporâneos, não se sabia de consumos de heroína por parte de Vedder. Não falava sobre isso em entrevistas, à excepção de referências vagas ao consumo de drogas nos primeiros tempos da banda.

Apesar da expressão “vendidos” aparecer muitas vezes nas descrições dos Pearl Jam na altura, Vedder – tal como Cobain e Cornell antes dele – não gostava da fama. Mas, em vez de se virar para as drogas, simplesmente começou a compor canções que os fãs leais achavam muito mais apelativas do que um público mainstream.

"No início dos anos 2000, os Pearl Jam estavam a tratar de diluir a emotividade de natureza operática dos seus discos anteriores mais populares, de forma a agradar aos seus mais incondicionais seguidores", escreveu Hyden. “A maneira como Vedder conduziu propositadamente os Pearl Jam para um público significativamente mais pequeno continua a ser notável. À excepção dos Radiohead, mais nenhuma banda foi tão deliberada em descobrir precisamente as pessoas que queria que se importassem com a sua música.”

Apesar da aparente boa saúde de Vedder e do facto de ele continuar a fazer música nova, os fãs de rock – armados com piadas e tributos – preocuparam-se publicamente com ele no Twitter.

Algumas pessoas, é claro, podem indignar-se com a ideia de Vedder ser o último ícone deste género musical.

Entre elas podem estar o baterista dos Nirvana, Dave Grohl, e Mark Arm, dos Mudhoney. Afinal, os dois estão bem vivos. Mas a verdadeira fama de Grohl veio de ser o vocalista dos Foo Fighters, mais tarde, e, apesar de os Mudhoney terem ajudado no nascimento do grunge, nunca alcançaram o sucesso comercial transversal dos Soundgarden, dos Nirvana, dos Stone Temple Pilots ou dos Alice in Chains.

Para muitos, o peso do legado do grunge está agora exclusivamente nos ombros de Vedder.

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post

Tradução: Rita Monteiro