Akihito vai ser o primeiro imperador do Japão a abdicar em 200 anos
Governo deu luz verde à lei que viabiliza a saída do imperador, mas recusa ir mais longe nas reformas à sucessão. Abdicação tem o apoio amplo dos japoneses.
O Governo japonês aprovou esta sexta-feira o diploma que permite a abdicação do imperador Akihito – a primeira em mais de dois séculos. A maioria da população concorda com a decisão do monarca de 83 anos, que a justifica com os seus problemas de saúde, mas continua a pairar o receio de uma crise de sucessão a médio prazo.
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O Governo japonês aprovou esta sexta-feira o diploma que permite a abdicação do imperador Akihito – a primeira em mais de dois séculos. A maioria da população concorda com a decisão do monarca de 83 anos, que a justifica com os seus problemas de saúde, mas continua a pairar o receio de uma crise de sucessão a médio prazo.
A lei, que deverá ser confirmada pelo Parlamento antes do encerramento dos trabalhos parlamentares, a meio de Junho, foi redigida especificamente para Akihito, uma vez que a legislação que regula a Casa Imperial do Crisântemo desde 1947 não prevê a abdicação. Akihito, por exemplo, ascendeu ao trono em 1989, após a morte do seu pai, o imperador Hirohito, no poder desde 1928. Não foi revelada qualquer data para a abdicação de Akihito, mas a imprensa japonesa aponta Dezembro de 2018 para a altura vista como ideal para a cerimónia, marcando os 30 anos da sua subida ao trono.
O Governo começou a planear a sucessão do imperador desde que, no Verão passado, Akihito fez uma rara declaração televisiva – apenas a segunda do seu reinado – em que manifestou a vontade em abandonar o trono. “Preocupa-me que se vá tornando cada vez mais difícil cumprir integralmente as minhas obrigações como símbolo do Estado”, disse o imperador. Akihito prepara-se para ser o primeiro imperador a abdicar do trono depois de Kokaku, em 1817, rompendo uma tradição de dois séculos. No entanto, na história imperial japonesa a abdicação em vida era comum e cerca de metade dos 125 imperadores fizeram-no, escreve o Japan Times.
A delicadeza do assunto obriga a que todos os intervenientes lidem com o tema com pinças. A Casa Imperial japonesa é a mais longa monarquia em funções do mundo, com alguns historiadores a apontarem para uma linha temporal que se estende por 2600 anos, tendo sobrevivido a várias crises e que nem a derrota na II Guerra Mundial pôs em causa.
A discussão em torno da abdicação foi vista pelos sectores mais reformistas como uma oportunidade para mudar outros aspectos que regulam a Casa Imperial, como a exclusão das mulheres da sucessão. Esta semana, a princesa Mako, neta de Akihito, revelou que pretende casar com um plebeu, o que lhe retira qualquer direito como membro da família real, incluindo a possibilidade de os seus filhos entrarem na linha de sucessão ao trono.
A grande preocupação é a possível falta de herdeiros nas gerações que se seguem. A família imperial tem hoje 18 membros, 13 dos quais são mulheres, nota o Guardian. O sucessor directo do imperador é o seu filho, o príncipe Naruhito, de 53 anos, que, porém, não tem filhos rapazes – apenas uma filha, Aiko. A linha de sucessão completa-se com o filho mais novo de Akihiro, o príncipe Akishino, e o filho deste, Hisahito, de dez anos. O reduzido número de membros masculinos na família imperial deixa no ar a possibilidade de uma crise sucessória na eventualidade, por exemplo, de Hisahito não ter qualquer filho.
A última vez que o debate sobre a lei da sucessão surgiu foi em 2005, quando o então primeiro-ministro, Junichiro Koizumi, defendeu a possibilidade de a filha de Akihiro poder ascender ao trono. A pressão dos conservadores foi mais forte e o nascimento de Hisahito, no ano seguinte, acabou por arrefecer o apetite reformista.
O legado de Akihito está ligado à memória do pós-guerra. Filho de Hirohito, que liderou o país durante o conflito, o imperador fez do pacifismo e do diálogo com os países da vizinhança as suas prioridades. Em 1992 realizou uma visita histórica à China, com o objectivo de sarar as feridas abertas durante o período da ocupação japonesa. Akihito também tentou trazer algumas mudanças à monarquia, tornando-se no primeiro imperador a recusar o título de divino – depois de este estatuto ter sido retirado ao pai após a guerra – e ao casar-se com uma plebeia.
Os japoneses parecem compreender a decisão de Akihito. Uma sondagem realizada na altura em que o imperador falou ao país mostrava que cerca de 90% da população apoiava o pedido de abdicação. Uma grande maioria (76%) dos que concordam com a saída de Akihito é também favorável a tornar a figura da abdicação permanente.