Museu da Cortiça de Silves, premiado internacionalmente, está encerrado há oito anos
A câmara pretende recuperar o espólio que perdeu a favor de uma empresa privada numa venda em hasta pública. A declaração de “interesse público” aguarda decisão do Ministério da Cultura
A reabertura do museu da cortiça de Silves, encerrado em 2009, continua incerta. O espólio pertence a uma empresa privada e o edifício é propriedade da Caixa Geral de Depósitos. A câmara diz querer defender estes bens culturais, aguardando que o Ministério da Cultura lhes atribua a classificação de “interesse público”. Mas enquanto dura este impasse, o edifício vai-se degradando e o património está fechado dentro de quatro paredes. Aquele que, em 2001, foi considerado o “Melhor Museu Europeu”, na categoria de património industrial, tendo-lhe sido atribuído o prémio Luigi Micheletti, vai passar este Dia Internacional dos Museus, que hoje se comemora, envolto em ervas daninhas.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A reabertura do museu da cortiça de Silves, encerrado em 2009, continua incerta. O espólio pertence a uma empresa privada e o edifício é propriedade da Caixa Geral de Depósitos. A câmara diz querer defender estes bens culturais, aguardando que o Ministério da Cultura lhes atribua a classificação de “interesse público”. Mas enquanto dura este impasse, o edifício vai-se degradando e o património está fechado dentro de quatro paredes. Aquele que, em 2001, foi considerado o “Melhor Museu Europeu”, na categoria de património industrial, tendo-lhe sido atribuído o prémio Luigi Micheletti, vai passar este Dia Internacional dos Museus, que hoje se comemora, envolto em ervas daninhas.
A história deste espaço cultural não pode ser dissociada da queda do empreendimento “Fábrica do Inglês”, que pertencia a uma cadeia regional de supermercados que faliu. No final dos anos 90, a antiga unidade industrial foi recuperada e adaptada para funcionar como pólo de animação turística, tendo como âncora o museu da cortiça. O promotor, a empresa de distribuição alimentar algarvia — Alicoop/Alisuper, acabaria por não resistir à concorrência. Já em fase de pré-falência do grupo, é a família Nogueira, originária do Douro, a adquirir, em 2012, a rede das 49 lojas da Alisuper.
Os dois principais bancos credores — Caixa Geral de Depósitos (CGD) e Millennium/BCP —, com milhões de crédito mal parado, forçaram a insolvência da Alicoop/Alisuper, arrastando consigo a “Fábrica do Inglês”. Depois, num leilão realizado em 30 de Maio de 2014, a CGD viria a arrematar a compra de todos os edifícios, incluindo a ala onde estava instalado o museu. O espólio da antiga fábrica foi vendido à parte das paredes que o albergavam. Quem o comprou, por 36 mil euros, foi a família Nogueira. Nessa altura, a câmara tentou a aquisição mas ficou a mil euros da melhor oferta. Um mês depois, o espólio foi vendido por mais cerca de 4 mil euros à empresa Rustinativa, Ldª. O município respondeu ao desafio dos privados, atribuindo a classificação de “interesse municipal” ao espólio, o que lhe permitiria exercer o direito de preferência em caso de venda. Não foi isso que aconteceu. O município, disse a presidente da Câmara, Rosa Palma, “não recebeu, como seria obrigatório, a comunicação para poder exercer o direito de preferência na venda”. Por isso, acrescentou, avançaram com um processo em tribunal. Em 22 de Maio de 2016, foi efectuada uma nova transacção para a empresa “Excelentemagia — Unipessoal, Ldª. Em Junho de 2016, o município intentou uma acção contra as duas empresas.
A direcção regional da Cultura do Algarve, entretanto, desencadeou, há cerca de um ano, um processo para classificar a “Fábrica do Inglês” como bem cultural de “interesse público” de âmbito nacional. Em declarações ao PÚBLICO, Rosa Palma adiantou que a autarquia manifestou a “intenção de compra do espólio” e tem mantido “conversações com a Caixa Geral de Despósitos no sentido de avaliar a forma de preservar todo o espaço, incluindo os imóveis”. O espaço, abandonado, avoluma sinais de degradação.
Na câmara, entretanto, foi apresentado um pedido de “informação prévia” para que viesse a ser instalado um supermercado Aldi no imóvel que funcionou como um espaço de animação turística/espectáculos, mas a pretensão foi rejeitada.
O antigo director do Museu, Manuel Ramos, defende que “só a câmara pode ser dona da ‘Fabrica do Inglês’, dado o seu manifesto interesse público”. Os cinco edifícios da antiga unidade fabril construída em 1894 estão classificados de “interesse municipal” desde 2010. O historiador admite que a falta de verbas possa limitar os objectivos que preconiza, mas acha que não é razão para inviabilizar o projecto. O município, defende, “deverá proceder a um aluguer de longa duração para que sejam ali instalados todos os serviços da área cultural”. Nesse sentido, entende que o museu deve retomar a projecção internacional que obteve e que foi metida na gaveta. “Pode ser alargado, porque há material suficiente e tem peças únicas”, enfatiza.
O museu é a principal montra da história do concelho de Silves ligada à extracção e indústria da cortiça. No último 1º de Maio foi inaugurado um conjunto escultórico de “Homenagem aos Corticeiros”, da autoria de Carlos Correia. Em 1890, destacou a presidente da câmara durante a cerimónia inaugural, 40% dos trabalhadores nacionais desta indústria trabalhavam em Silves. “Muitos de nós somos filhos ou netos de corticeiros”, enfatizou.