Ainda não há motim, mas há cada vez mais republicanos fartos de Trump

Demissão do director do FBI foi criticada por senadores do Partido Republicano. Um deles diz que o Presidente tem três opções: ou entrega as gravações das conversas com James Comey, ou desmente que elas existem, ou será intimado a entregá-las.

Foto
A popularidade de Donald Trump está nos 39% JIM LO SCALZO/EPA

Há um ano, no início de Maio de 2016, as eleições primárias para a escolha do candidato do Partido Republicano ainda não tinham acabado, mas já toda a gente sabia quem iria ser o nomeado – os eleitores tinham obrigado todos os opositores de Donald Trump a abandonarem a corrida, deixando muitas das grandes figuras do Partido Republicano em estado de choque.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Há um ano, no início de Maio de 2016, as eleições primárias para a escolha do candidato do Partido Republicano ainda não tinham acabado, mas já toda a gente sabia quem iria ser o nomeado – os eleitores tinham obrigado todos os opositores de Donald Trump a abandonarem a corrida, deixando muitas das grandes figuras do Partido Republicano em estado de choque.

A surpreendente vitória nas eleições gerais contra Hillary Clinton, em Novembro, levou o aparelho do partido a vergar-se perante o sucesso do seu novo Presidente, mas as tensões e os sinais de fractura parecem ter ressurgido na semana passada, depois de Trump ter despedido o director do FBI.

Em público, os principais líderes do Partido Republicano continuam a guardar as costas do Presidente. É isso que acontece com o líder da Câmara dos Representantes, Paul Ryan, um homem que causou uma das maiores polémicas no ano passado ao recusar-se a apoiar a nomeação de Trump, acabando por ceder um mês depois; e com Mitch McConnell, o líder da maioria no Senado.

Em ambos os casos, esse apoio passa muito pelo sucesso de importantes leis nas duas câmaras do Congresso – a destruição do Obamacare já começou na Câmara dos Representantes mas ainda tem de ser aprovada no Senado; e depois ainda há batalhas como as da reforma fiscal, por exemplo.

O Partido Republicano tem a maioria nas duas câmaras e um Presidente na Casa Branca, mas a prova de que isso por vezes pode não chegar é o problema que tem sido acabar com o Obamacare – em Março, Paul Ryan e Donald Trump tiveram de recuar de uma votação na Câmara dos Representantes em cima da hora porque não convenceram suficientes elementos no seu próprio partido.

Crises quase todos os dias

Por causa da necessidade de fazer passar leis no Congresso será difícil assistir a uma guerra aberta no Partido Republicano num futuro próximo, mas nos últimos dias foram muitas as vozes que começaram a pôr em causa publicamente decisões e declarações de Trump.

“Parece que temos uma crise em Washington quase todos os dias, e isso desvia as atenções", disse a senadora Susan Collins, do Partido Republicano. Collins referia-se ao despedimento de James Comey do cargo de director do FBI, uma decisão do Presidente que deixou muitos representantes do Partido Republicano entre a surpresa e choque.

Também os senadores Dean Heller (Nevada) e Jeff Flake (Arizona) têm criticado o Presidente norte-americano em várias ocasiões. "No Arizona educamos as pessoas para serem independentes. As pessoas querem alguém que lhes diga que vai votar ao lado de Trump nas coisas positivas e contra ele nas coisas negativas", disse o senador do Arizona, onde a construção de um muro na fronteira com o México e a possível saída do acordo comercial NAFTA é conversa que não dá votos.

Para além destes senadores, outros como o veterano John McCain e o libertário Ryan Paul podem acabar por fartar-se das polémicas na Casa Branca e pôr em perigo a maioria de 52-48 que o Partido Republicano tem actualmente no Senado – se não votarem contra, pelo menos podem exigir contrapartidas que ponham em perigo as propostas que saem da Casa Branca e da liderança do partido.

A somar às dúvidas com que muitos membros do Partido Republicano aceitaram a nomeação de Trump no ano passado, e à actual crise na Casa Branca por causa do despedimento do director do FBI, o futuro político do Presidente vai também ser condicionado por duas variáveis muito importantes. Por um lado, as eleições para o Congresso em Novembro de 2018 – os candidatos do Partido Republicano que procuram a reeleição em estados onde Hillary Clinton foi mais votada no ano passado tendem a afastar-se das propostas e das decisões mais polémicas de Trump; por outro lado, a falta de popularidade do Presidente e a forma negativa como a maioria dos inquiridos viu o despedimento do director do FBI pode também tornar Trump num activo tóxico, se esses números se mantiverem por muito tempo.

Na mais recente sondagem do Wall Street Journal e da NBC, a popularidade de Trump estava nos 39% – um valor invulgarmente baixo para um Presidente em início de mandato, mas ainda assim acima do pior das presidências de George W. Bush ou Jimmy Carter, na casa dos 20%. Mas se Trump não conseguir manter-se perto dos 40%, e deslizar por aí abaixo, é provável que muitas figuras do Partido Republicano comecem a afastar-se, e que a minoria do Partido Democrata passe a ter mais margem de manobra para actuar no Congresso.

Por agora, o grande problema para o Partido Republicano é um ciclo noticioso dominado pelas consequências do despedimento do director do FBI e pelo ambiente de cortar à faca na Casa Branca – Trump só deu uma hora à sua equipa de comunicação para desenhar um plano de defesa dessa decisão, e agora critica violentamente essa mesma equipa por não ter conseguido defender os argumentos do Presidente com eficácia.

Investigações não abrandam

O ex-director do FBI, James Comey, estava a liderar uma investigação criminal às suspeitas de ingerência russa nas eleições presidenciais norte-americanas com a possível colaboração de membros da equipa de Trump. Essas suspeitas estão também a ser investigadas por comissões na Câmara dos Representantes e no Senado, ambas lideradas por congressistas do Partido Republicano – apesar disso, a comissão do Senado intimou o ex-conselheiro de Segurança Nacional, Michael Flynn, a enviar documentos relevantes para a investigação, depois da recusa do general em fazê-lo de forma voluntária. Flynn foi despedido por Trump em Fevereiro, 18 dias depois de se ter sabido que o responsável tinha escondido do vice-presidente pormenores de reuniões com o embaixador da Rússia em Washington, Sergei Kisliak, durante a campanha para as presidenciais.

E o senador Mike Lee, também do Partido Republicano, juntou-se a vários outros colegas de partido nas críticas à ameaça velada que Donald Trump fez a James Comey através do Twitter, quando disse que podia haver gravações das conversas entre ambos.

Questionado sobre essas gravações, o senador do Partido Republicano disse ser "provavelmente inevitável" que tenham de ser entregues ao Congresso, se existirem de facto, e que Trump poderá vir a ser intimado a entregá-las se não o fizer de voluntária ou se não desmentir de forma categórica a sua existência.