“É impossível negociar o trabalho extraordinário dos médicos até à greve”
Responsável da Administração Central do Sistema de Saúde pelas negociações com os sindicatos diz que as negociações estão no bom caminho, mas admite que há temas demasiado complexos para serem fechados antes da greve de 10 e 11 de Maio.
A menos de duas semanas da greve dos médicos, Pedro Alexandre, o responsável da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) pela negociação com os sindicatos do sector, e que tem estado em todos os encontros do último ano, está confiante de que o protesto de 10 e 11 de Maio, véspera da visita do Papa, será desmarcado.
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A menos de duas semanas da greve dos médicos, Pedro Alexandre, o responsável da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) pela negociação com os sindicatos do sector, e que tem estado em todos os encontros do último ano, está confiante de que o protesto de 10 e 11 de Maio, véspera da visita do Papa, será desmarcado.
O jurista admite, contudo, que temas como a redução do trabalho extraordinário, das horas dedicadas ao serviço de urgência ou o número de utentes por médico de família — de que os sindicatos não abrem mão — não podem ser fechados em tão pouco tempo.
A menos de duas semanas da greve dos médicos há só mais um encontro para negociar. Qual é a expectativa que tem?
Temos tido reuniões frequentes com os sindicatos médicos mesmo antes do pré-aviso. A próxima reunião é dia 5 de Maio e temos tentado convergir nas negociações.
A greve vai acontecer?
Só as estruturas sindicais podem dizer isso. Pessoalmente estou com muita esperança de que não venha a ocorrer, até porque está marcada para uma altura em que vamos receber o Papa. Além de que as posições não são assim tão afastadas e tem havido um esforço de ambas as partes na aproximação.
As negociações decorrem há um ano e os sindicatos falam em grandes atrasos. Qual a sua visão enquanto tutela?
A questão da reposição do pagamento das horas extraordinárias foi o ponto mais sensível e desde o dia 1 de Abril que está a ocorrer. Pode não ter sido no timing desejado mas em 2017 vai-se assistir à reposição integral das majorações do trabalho extraordinário que vinham a ser retiradas desde 2011. Foi possível chegar a esse acordo e é um aspecto muito positivo.
Mas os médicos dizem que não estão a ser tratados como noutras áreas, onde o pagamento do trabalho extraordinário foi totalmente reposto já neste ano.
Tem sido feito um esforço imenso e no ano passado assistimos à reposição salarial. Foi para todos os trabalhadores da administração pública. Neste ano estamos a assistir a algumas reposições no sector da saúde. Não posso dizer que o sector da saúde está a ser discriminado negativamente.
A questão das horas extraordinárias não foi o suficiente para os sindicatos recuarem. O que podem garantir resolver na próxima semana para haver acordo?
As negociações com os sindicatos médicos não se esgotam neste processo. Tem havido um conjunto de reuniões periódicas das quais têm resultado acordos. Conseguimos negociar um novo regime de procedimento simplificado de concurso para os médicos que acabam a sua especialidade. No espaço de um mês estamos a colocar os médicos recém-especialistas, quando chegava a demorar seis meses. Foi também possível negociar uma alteração ao regulamento dos concursos do pessoal médico e em 2017 vamos abrir um concurso centralizado para mobilidade de médicos. Com este Governo assistiu-se a uma alteração dos acordos colectivos de trabalho em que se veio clarificar o descanso compensatório.
Mas então porque dizem os sindicatos que não tem havido concretização?
Os timings nem sempre são coincidentes. Uma parte espera uma coisa muito rápida e a outra não pode ir ao encontro dessa expectativa, o que não significa que não estejam a convergir. O calendário negocial está previso para decorrer até Setembro e vai da redução do número de horas de trabalho extraordinário [a que estão obrigados os médicos] e as [horas que os médicos fazem nas] urgências, até à redução das listas de doentes por médico de família, que são matérias que não poderiam ser concluídas até à greve.
Mas os sindicatos já disseram que sem esses pontos seria quase impossível cancelar a greve. Consegue dar alguma garantia até à greve?
São dois pontos que está previsto negociar e que fazem parte do todo mais vasto. Quer uma parte quer outra têm vontade de negociar, mas não vou dizer que no [próximo] encontro de 5 de Maio temos a situação resolvida. Mas também não me parece que as estruturas sindicais exijam já no dia 5 uma alteração.
Mas quando fala em esperança de não haver greve não é certamente pela visita do Papa. O que vão apresentar de muito concreto?
Estes dois temas que surgiram recentemente foram dois temas que o Governo se disponibilizou a trazer para a mesa negocial e isso demonstra a vontade de chegar a um consenso. É o ponto de partida mais importante. É impossível negociar estes dois temas numa semana, até à greve. É preciso fazer cálculos de impacto ao nível das entidades.
Outra das preocupações dos sindicatos é com os 700 jovens médicos que podem ficar sem vaga numa especialidade. O que acontecerá aos mais de 100 médicos que já nos dois últimos concursos ficaram sem vaga? Vão poder continuar no SNS?
O número de vagas depende da capacidade formativa identificada pela Ordem dos Médicos para cada serviço. O sistema tem garantido a todos a frequência do chamado Ano Comum, que é o que assegura o acesso à profissão. A segunda etapa é o acesso à especialidade e está condicionado às vagas identificadas.
Mas o vínculo com o SNS está garantido?
Os médicos que ficaram sem vaga em 2015 têm contrato até Junho, quando decorre o novo processo de escolhas. E do que sabemos estes médicos tiveram resultados muito mais favoráveis [no novo exame] e poderão ingressar na especialidade. Só nessa altura vamos saber a dimensão do resto.
Quantos médicos e enfermeiros já contrataram e prevêem contratar neste ano?
Temos duas épocas para os médicos que concluíram a formação. Será aberto em Maio um concurso para mais de 1000 médicos. Serão colocados no prazo de um mês. Cerca de 80% dos médicos que formamos são contratados pelo SNS.
Mas depois há outros concursos para necessidades específicas que em mais de metade dos casos ficam desertos.
Houve muitos concursos que ficaram desertos porque desde a abertura até à conclusão do concurso mediavam vários meses e isso agora já não é assim. Também nunca abrimos o número de vagas igual ao de médicos que se formou, são sempre mais a pensar em médicos que possam querer voltar ao sistema.
E quando vão abrir concursos para assistentes graduados sénior? É precisamente outro dos motivos na base da greve.
Temos essa intenção. O pedido para cerca de 200 vagas já está formalizado mas carece de autorização do Ministério das Finanças.
E as contratações de enfermeiros?
Há duas realidades. Os hospitais EPE têm vindo progressivamente a contratar. Temos o maior número de enfermeiros desde que há registo, com 40.959, o que é um saldo líquido de mais 1800 enfermeiros no sistema [face a 2015]. Nos médicos temos mais 1000 especialistas e no total, incluindo internos, temos mais 1700 médicos. Depois há um concurso que vem desde 2015 para 774 enfermeiros nos cuidados primários e que teve mais de 10 mil candidatos. O júri esteve a avaliar as candidaturas e em Maio iremos publicar a lista provisória e até Julho começarão a ser chamados para preencher os postos de trabalho. Temos vindo progressivamente a repor e criar condições para que os profissionais se sintam bem no SNS depois de sairmos de uma situação em que o país esteve pouco favorável a estas melhorias.