Acontecimento: a electrónica cinematográfica dos The Blaze
Videoclipes magnetizantes, poesia electrónica e vozes adulteradas, num universo de amor, loucura e liberdade. São dois franceses. The Blaze.
Um belo dia anda-se pelas avenidas infindáveis da internet, carregadas de mediania, de lixo, de estetização normalizadora e repousa-se os olhos no videoclipe de uns tais The Blaze sem grandes esperanças. Surgem uns caracteres árabes e dois homens num apartamento de um qualquer subúrbio de cidade que mais tarde percebemos ser Paris. A música é um som house de características familiares, mas ainda assim com um toque de estranheza, de ritmo evolutivo e voz alterada digitalmente por cima.
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Um belo dia anda-se pelas avenidas infindáveis da internet, carregadas de mediania, de lixo, de estetização normalizadora e repousa-se os olhos no videoclipe de uns tais The Blaze sem grandes esperanças. Surgem uns caracteres árabes e dois homens num apartamento de um qualquer subúrbio de cidade que mais tarde percebemos ser Paris. A música é um som house de características familiares, mas ainda assim com um toque de estranheza, de ritmo evolutivo e voz alterada digitalmente por cima.
No vídeo, os dois homens dançam agora num terreno de cumplicidade só deles. E é só isto. Dois homens dançando num apartamento noite dentro, sem que se perceba exactamente o que os move, num terreno ambíguo onde a masculinidade se alia à amizade ou ao amor, e onde a liberdade, a loucura, a pele e a juventude nos entra pelos olhos adentro. Duas pessoas partilhando a intimidade, podiam ser amantes, ou os melhores amigos. E isto foi provavelmente o melhor videoclipe que vimos em muito tempo. Foi o ano passado e nunca mais dissociámos aquela canção, Viril, do videoclipe, como se The Blaze tivessem descoberto um novo formato: a vídeo-canção. Depois procuramos saber mais sobre eles. Nada. Mistério.
Até que em Janeiro deste ano surgiu um novo vídeo. Territory. Chamar-lhe vídeo parece pouco. É como se fosse um microfilme. Mais uma vez, o contexto humano é árabe. Desta vez estamos na Argélia. A música é outra vez um som house atmosférico, de crescendos e espirais melódicas, com efeitos dub e outra vez aquela voz adulterada, que se ajusta na perfeição às imagens, com um homem reconhecendo-se no seio familiar, com pessoas de várias gerações abraçando-se. Não é, mais uma vez, claro o que as move, mas fica-se preso, como se afinal o que contasse fosse o ambiente e a celebração emocional que se seguirá, com tudo a desembocar numa zona masculina de auto-expressão pela performance corporal, num terreno aberto às mais diversas interpretações, mas onde o que permanece é o elixir da liberdade. Outra vez um tratado em forma de vídeo-canção.
Os The Blaze são os franceses Guillaume e Jonathan Alric, são primos, e são ambos músicos-produtores e realizadores. Os vídeos e a música são da sua autoria e acabam de lançar o seu primeiro EP. Ou seja, o seu envolvimento musical é igual ao seu investimento visual. Não existe dissociação. Em Territory existem apenas cinco canções as duas já mencionadas, mais outras três na mesma linha mas eis um registo que vale mesmo a pena.
Não temos os ambientes visuais nocturnos e os rituais de fraternidade, mas existe uma mantra electrónica com qualquer coisa de poesia hipnótica repetindo-se infinitamente, acabando por libertar uma sugestão de pureza atrás de si. Mesmo sem imagens a música do duo sobrevive ao embate, mas na verdade essa nem é uma questão para os The Blaze. O seu território é o dos objectos híbridos e é aí que irão permanecer.