“O artista certo que fez a peça certa para Veneza”
As seis esculturas de José Pedro Croft já estão a caminho da Villa Hériot. Medida Incerta, a representação portuguesa na bienal, com curadoria de João Pinharanda, abrirá ao público a 10 de Maio.
As obras com que José Pedro Croft representará Portugal na Bienal de Artes de Veneza, em Itália, saíram esta segunda-feira da Póvoa de Varzim, “nuns camiões imensos”, em direcção a Mestre, onde deverão chegar no final desta semana, explicou o artista plástico na conferência de imprensa de apresentação do projecto Medida Incerta que esta manhã se realizou no Palácio da Ajuda, em Lisboa. Em seguida, as seis monumentais esculturas serão transportadas para a ilha da Giudecca num barco-grua e serão colocadas nos jardins da Villa Hériot, onde a partir do dia 26 de Abril começarão a ser montadas.
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As obras com que José Pedro Croft representará Portugal na Bienal de Artes de Veneza, em Itália, saíram esta segunda-feira da Póvoa de Varzim, “nuns camiões imensos”, em direcção a Mestre, onde deverão chegar no final desta semana, explicou o artista plástico na conferência de imprensa de apresentação do projecto Medida Incerta que esta manhã se realizou no Palácio da Ajuda, em Lisboa. Em seguida, as seis monumentais esculturas serão transportadas para a ilha da Giudecca num barco-grua e serão colocadas nos jardins da Villa Hériot, onde a partir do dia 26 de Abril começarão a ser montadas.
A pré-inauguração de Medida Incerta, com curadoria de João Pinharanda, está marcada para 9 de Maio e a abertura ao público para o dia seguinte. Será o final de um processo que se iniciou em Julho de 2015 e que não terminará com a exposição em Veneza, considerando a aquisição das peças pela Câmara Municipal de Matosinhos — o estudo da sua colocação está a ser feito em conjunto pelo artista e pelo arquitecto Guilherme Machado Vaz na "Casa da Arquitectura".
A Câmara Municipal de Lisboa, soube-se esta segunda-feira, fez uma compra antecipada de uma obra com a mesma escala e características das apresentadas em Veneza, como apoio directo ao artista no âmbito da Bienal. A obra, ainda por conceber, será adaptada ao contexto que houver para a sua instalação. "Será criada propositadamente para as características do exterior do Museu de Lisboa e tenho toda a liberdade para propor [o que considerar melhor]", confidenciou ao PÚBLICO o artista no final da conferência de imprensa.
Mas até lá, e durante os próximos seis meses, as esculturas que Croft criou para a 57.ª Exposição Internacional de Arte – La Biennale di Venezia, que tem por lema “Viva Arte Viva”, habitarão os jardins da Villa Hériot, um complexo arquitectónico novecentista que, no seu interior, albergará uma exposição complementar às peças, contextualizando o trabalho deste artista plástico que nasceu no Porto em 1957.
Ali vão estar expostos maquetes de vários dos seus projectos e catálogos monográficos, e será projectado um filme que fez com outros filmes que Solveig Nordlund, Margarida Ferreira de Almeida e Leonel Sousa fizeram sobre ele. “São pequenos excertos desses filmes que monto como se fosse uma colagem, intercalados com fotografias de viagens ou de coisas que remetem para um imaginário."
Uma ilha para Portugal
O que o crítico e historiador de arte João Pinharanda acha extraordinário nesta Medida Incerta, para além do valor que a obra tem em si, e que não se perderá quando vier a ser colocada em Matosinhos ou em Lisboa, é “o lugar certo” que a peça ocupa em Veneza.
“Quando eu disse que tinha hesitado muito pouco ao escolher este artista, mas que o artista tinha ultrapassado as expectativas do convite, queria dizer que ele fez a peça certa. Neste caso, não é só o artista que está certo, é também a peça que está certa. Eu podia ter escolhido um artista certo que tivesse feito uma peça que não acertava. José Pedro Croft é o artista certo que fez a peça certa para Veneza”, disse o comissário ao PÚBLICO.
“Portugal não tem pavilhão. Pois, não. Portugal tem por agora uma ilha”, disse por sua vez o ministro da Cultura, Luís Filipe de Castro Mendes, também presente na conferência de imprensa ao lado de Paula Varanda, directora-geral das Artes, e do secretário de Estado da Cultura, Miguel Honrado. "O que vamos fazer a Veneza é também dialogar com todo o peso histórico, com toda a densidade artística daquela cidade."
Referindo-se à representação portuguesa, considerou que a ilha que Portugal ocupa há duas edições “reúne condições únicas” para a apresentação quer do projecto de Álvaro Siza (que aconteceu na bienal de arquitectura no ano passado), quer do projecto deste ano.
José Pedro Croft “soube vencer todas as dificuldades e resolver todos os problemas que se lhe depararam, encontrando forças para construir o seu projecto como um edifício coerente e sem falhas”, afirmou João Pinharanda. “Soube adaptar-se às incertezas que a vida nos reserva”, acrescentou o ministro.
Ao libertar “a energia necessária para pensar este projecto”, Croft alcançou um resultado que Pinharanda considera “situar-se bem para além do desafio que lhe foi colocado”. O desafio de ambos, curador e artista, era o de ocupar uma praça em processo de estaleiro de obra, com dimensão de 70 por 30 metros, o Campo di Marte, frente ao conjunto de edifícios da autoria de Álvaro Siza que ali estão a ser construídos. Foi para aí que as seis esculturas de José Pedro Croft foram pensadas, mas dificuldades de “calendário, administrativas e de construção” obrigaram a que a localização das peças fosse alterada para a Villa Hériot. Embora, a convite do arquitecto, José Pedro Croft esteja a fazer uma fonte que completará o conjunto de habitações sociais na Giudecca e que ali ficará em permanência.
O curador considera que esta nova localização enriqueceu o projecto: "Estamos agora numa Veneza mais típica, mais reconhecível, uma Veneza de arquitectura privada e de veraneio. E estávamos numa Veneza pouco reconhecida, a Veneza da Giudecca, operária e social.”
As obras que Croft criou para a Giudecca são “feitas das memórias da arte moderna (de Sol Lewitt e Mondrian; de de Chirico e Medardo Rosso), da arte antiga (de Carpaccio, Palladio, Tintoretto ou Tiepolo) e do urbanismo infinito da cidade”, explicou o curador.
Não é só por Medida Incerta ter espelhos que é a peça certa para Veneza, diz João Pinharanda, que lembra que os espelhos em Veneza são "mais do que qualquer coisa que absorve a cidade e a reflecte", são "a própria história de Veneza, metaforicamente e sem ser metaforicamente". Isto porque é sobre um espelho de água que a cidade cresce e foi em Veneza que o espelho foi inventado como objecto de luxo, explica. "Na cidade dos espelhos, os grandes espelhos de Croft, rebrilhando, trazem a paisagem da cidade para dentro da escultura e despedem-na para longe", considera Pinharanda. "[Estas esculturas] absorvem simultaneamente toda a memória de Veneza e lançam-na para uma outra medida. São portadoras de uma energia imensa e fiquei comovido quando as vi terminadas”, confessa o curador.
Notícia corrigida às 20h58 esclarecendo os detalhes da aquisição pela Câmara Municipal de Lisboa