Hopkins lê Pessoa
Traduzir é uma maneira de ler que obriga a pensar bem no que se está a ler. Ao pegar numas palavras e po-las noutra língua também somos obrigados a ler aquilo que escrevemos, não só na língua em que a escrevemos como na língua em que foi originalmente escrita.
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Traduzir é uma maneira de ler que obriga a pensar bem no que se está a ler. Ao pegar numas palavras e po-las noutra língua também somos obrigados a ler aquilo que escrevemos, não só na língua em que a escrevemos como na língua em que foi originalmente escrita.
Pode-se escrever com facilidade, sem ler o que se está a dizer. Mas traduzir atrasa-nos e aproxima-nos. Para traduzir escolhi as obras de Samuel Beckett de que eu mais gostava. Mas, depois de traduzi-las, mudei de opinião. De umas deixei de gostar tanto. De outras passei a gostar mais ainda.
Imprimir à mão, uma a uma, frases d'O Livro do Desasossego de Fernando Pessoa, na bela tradução inglesa de Margaret Jull Costa, deve ser uma maneira de ler ainda mais íntima, já que não envolve a violência de transformar palavras já muito bem escritas noutras palavras nunca tão bem escritas.
Foi o que fez Tim Hopkins. Está desde 5 de Maio de 2015 a imprimir à unha (com duas Adanas) The Book Of Disquiet. O site que ele foi documentando — thebookofdisquiet.wordpress.com — dá uma boa ideia do humor, da originalidade expressiva, inteligência e empatia literária desta edição. No mínimo é uma obra-prima da tipografia. Cheira-me que é muito mais do que isso: uma maneira nova, witty e desconcertantemente rica de ler Pessoa.
Quando o PÚBLICO chamou a atenção para ela já a edição (de 50 exemplares) estava esgotada. Quem estiver em Londres até dia 20 pode ir à excelente bookartbookshop em Hoxton ver o épico — e lírico — em Pessoa. É obra!