“É preciso haver um campeão. E o mesmo se aplica a Portugal”

Alar Kolk, presidente da European Innovation Academy, que chega este Verão a Cascais, diz que ter um caso de grande sucesso é essencial para criar uma cultura de empreendedorismo.

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Alar Kolk criou o programa depois de ter visto o impacto do Skype na Estónia NUNO FERREIRA SANTOS

É um curso de Verão intensivo para criar uma startup. Ao longo de três semanas, Cascais vai receber empreendedores, gestores de multinacionais, e académicos de algumas das mais reputadas universidades americanas, como é o caso de Berkeley e Stanford. O objectivo é orientar 300 estudantes (100 dos quais portugueses) para que alguns consigam sair do curso com uma empresa e uma ideia de produto pronta a ser apresentada a potenciais investidores e clientes. Mas Alar Kolk, o académico estoniano criador da European Innovation Academy (que é uma entidade sem fins lucrativos), avisa que a maioria vai falhar: “A fasquia é tão alta, e é um programa tão intensivo, que 90% das equipas não criam uma startup.”

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É um curso de Verão intensivo para criar uma startup. Ao longo de três semanas, Cascais vai receber empreendedores, gestores de multinacionais, e académicos de algumas das mais reputadas universidades americanas, como é o caso de Berkeley e Stanford. O objectivo é orientar 300 estudantes (100 dos quais portugueses) para que alguns consigam sair do curso com uma empresa e uma ideia de produto pronta a ser apresentada a potenciais investidores e clientes. Mas Alar Kolk, o académico estoniano criador da European Innovation Academy (que é uma entidade sem fins lucrativos), avisa que a maioria vai falhar: “A fasquia é tão alta, e é um programa tão intensivo, que 90% das equipas não criam uma startup.”

A ideia nasceu na Estónia, um país conhecido pela tecnologia e cuja venda do Skype à Microsoft levantou uma onda de empreendedorismo. Estendeu-se depois a França e Itália. Kolk, que já foi vice-reitor da Universidade de Tecnologia de Tallin e é actualmente investigador em Stanford, admite que não tinha Portugal no radar – foram entidades portuguesas que o contactaram (a iniciativa é uma parceria com o município de Cascais, a aceleradora Beta-I, a Universidade Nova e o banco Santander). 

Numa conversa com o PÚBLICO, Kolk argumentou que a criação de um ambiente favorável às startups é um processo demorado. Mesmo quando há vontade política.

Quantas novas empresas saem de cada programa?
Pode parecer uma loucura, mas o programa está organizado de uma forma em que o mais provável é os participantes falharem. A fasquia é tão alta e é um programa tão intensivo que 90% das equipas não criam uma startup. Mas há 10% que seguem para aceleradores, incubadoras e investidores.

São uma organização não lucrativa. Qual é o objectivo?
O objectivo é simples: ensinar empreendedorismo. E fazê-lo de uma forma prática e não académica. O nosso objectivo é dar mais educação de empreendedorismo a jovens talentos. Isto começou pelo que vimos acontecer na Estónia quando o Skype foi comprado.

Quão grande foi o impacto dessa venda no empreendedorismo da Estónia? Em Portugal não temos nada comparável.
Houve três pessoas na Estónia que ganharam julgo que quase 400 milhões de dólares. Essas pessoas investiram em startups. Houve uma onda de empreendedorismo, criada por muitas pessoas que trabalhavam no Skype, ou que foram investidores no Skype, e que criaram centenas de empresas. Além disso, a história do Skype demonstrou que este tipo de sucesso é possível. É preciso haver um campeão. E o mesmo se aplica a Portugal. Quando tiverem o vosso unicórnio, isso demonstrará a muitas pessoas que esse sucesso é possível [uma startup é considerada um unicórnio quando atinge uma valorização superior a mil milhões de dólares; a Farfetch, criada por um português no Reino Unido e com operações em Portugal, é um destes casos].

O que pode acontecer se não houver um grande sucesso em Portugal? Sobretudo, quando há muitas políticas públicas a fomentar o empreendedorismo.
Mas há quanto tempo é que o fazem de forma sistemática? Na Estónia, demorou 20 anos. O presidente, o primeiro-ministro, toda a gente impulsiona o empreendedorismo. Se fizerem isso durante cinco ou sete anos e tiverem uma grande história de sucesso, nos dez anos seguintes irá mudar muita coisa. Mas mudanças estruturais demoram tempo.

Conhece bem o ecossistema português?
Em termos de políticas públicas, nem por isso. Conheço algumas startups. Em Portugal, ou em qualquer outro país, é muito fácil criar uma empresa com receitas de meio milhão de dólares. Cria-se um restaurante ou uma empresa de serviços e contratam-se quatro ou cinco pessoas. Mas uma startup que possa sair de Portugal e da Europa, requer outro tipo de competências.

As universidades não dão essas competências aos estudantes? É por isso que vocês existem?
As universidades são nossas parceiras. Mas ainda estão muito distantes das questões da comercialização e de lidar com clientes. As universidades estão mais focadas na educação académica. Para elas é muito complicado construir este conhecimento sobre comercialização. Mesmo as universidades de topo – MIT, Harvard, Stanford, Berkley – têm um corpo académico e depois convidam líderes das indústrias.

Com tanto foco no empreendedorismo, não há o risco de as universidades deixaram para trás esse lado mais académico e a formação noutro tipo de áreas, e centrarem-se muito em formar empresários?
Há dez anos havia muito poucas universidades na Europa que queriam fazer algo em parceria com a indústria e com empreendedores. Julgo que as universidades estão a ir na direcção certa ao estabelecer relações com a indústria e a construir uma cultura para além da cultura académica. Mas, mais uma vez, é preciso tempo. Nos EUA, os programas de ligação entre a academia e a indústria começaram há 50 anos.

Que diferenças viu nos ecossistemas de empreendedorismo dos países onde já fez este programa?
São completamente diferentes. Porque as pessoas são diferentes em termos de cultura, e nas formas de abordar e resolver problemas. A tomada de risco, o falhanço… Se compararmos os EUA com a Europa, há uma diferença enorme, claro. Mas se compararmos a Estónia com a Europa central, a Estónia é um país onde o risco é permitido. Se uma empresa falha, porque o produto ou as vendas falharam, há hipótese de recomeçar. Há 20 anos, a Estónia era um país relativamente pobre. A única opção que tinha era construir agressivamente novas indústrias e empresas. Havia uma necessidade. Se olharmos para os nórdicos ou para a Europa central, onde foram construídos sistemas de previdência social, a situação é diferente. É preciso incentivos e uma mudança cultural.

Está a dizer que é preciso estar desconfortável?
Sim. É preciso abraçar a mudança. Se houver mais pessoas dispostas a mudar, surgem novas empresas, novos serviços, novas tecnologias.

Notícia corrigida: o nome do entrevistado é Alar Kolk e não Alan Kolk.