EUA afirmam que "o domínio da família Assad está a chegar ao fim"

Secretário de Estado norte-americano, Rex Tillerson, aconselha a Rússia a “realinhar-se com os Estados Unidos”. Presidente Vladimir Putin responde que aceita críticas, mas espera que os comportamentos mudem

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Rex Tillerson chega esta terça-feira a Moscovo Joshua Roberts/REUTERS

À falta de tweets de Donald Trump sobre o estado da relação entre Washington e Moscovo, coube ao homem que representa a política externa norte-americana esforçar-se por explicar ao mundo que futuro vê quando olha para as palmas das mãos do Presidente sírio, Bashar al-Assad. Rex Tillerson só chegou à capital russa esta terça-feira, já ao fim da tarde, mas deixou um novo recado para Putin durante uma passagem por Itália, horas antes: "É óbvio para todos nós que o reinado da família Assad está a chegar ao fim."

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À falta de tweets de Donald Trump sobre o estado da relação entre Washington e Moscovo, coube ao homem que representa a política externa norte-americana esforçar-se por explicar ao mundo que futuro vê quando olha para as palmas das mãos do Presidente sírio, Bashar al-Assad. Rex Tillerson só chegou à capital russa esta terça-feira, já ao fim da tarde, mas deixou um novo recado para Putin durante uma passagem por Itália, horas antes: "É óbvio para todos nós que o reinado da família Assad está a chegar ao fim."

O secretário de Estado norte-americano esteve na cimeira do G7, na pequena cidade italiana de Taormina, e foi de lá que enviou mais recados a Moscovo, para que o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, saiba qual é o novo ponto de partida dos Estados Unidos nas negociações sobre a guerra na Síria.

Como tem sido difícil detectar uma posição firme saída da Casa Branca, as declarações de Tillerson em Itália são o mais próximo de uma luz, ainda que ténue, sobre o futuro após o ataque norte-americano contra uma base aérea síria, na semana passada.

Tal como tem feito desde esse ataque, Rex Tillerson continuou a pressionar as autoridades russas sobre o envolvimento do país na guerra na Síria – revertendo a posição norte-americana anterior ao ataque químico na província de Idlib, que matou 89 pessoas, incluindo crianças.

E, talvez mais importante do que isso, tentou amarrar os líderes do G7 a uma obrigação de contribuírem activamente para o combate contra o autoproclamado Estado Islâmico e para "estabilizar a situação na Síria". Essa mensagem foi passada nas conversações em Itália e resumida na conta do Departamento de Estado norte-americano no Twitter: "Para estabilizar a Síria vamos precisar da participação directa do G7."

Mas pelo menos um dos parceiros dos Estados Unidos no grupo das economias mais desenvolvidas do mundo não está muito aberta à ideia de encostar ainda mais a Rússia à parede – para a Itália, as sanções aplicadas após a anexação da Crimeia são suficientes, e por isso não aprovou uma proposta do Reino Unido para aplicar mais sanções à Rússia na sequência do ataque com armas químicas na Síria. "Não devemos encurralar a Rússia", avisou o ministro dos Negócios Estrangeiros italiano, Angelino Alfano.

"Narrativas falsas"

Enquanto Rex Tillerson voava para Moscovo, o Presidente da Rússia também tratou de deixar as coisas bem claras sobre o pé em que estão as relações com os Estados Unidos. Em resposta ao apelo de Tillerson para que a Rússia volte a "realinhar-se com os Estados Unidos, outros países ocidentais e os países do Médio Oriente que procuram uma solução para a crise síria", Vladimir Putin subiu a parada e foi além da acusação feita na semana passada por outros responsáveis russos de que o ataque na província de Idlib aconteceu após a explosão de um armazém dos rebeldes.

"Temos informação de que está a ser preparada uma provocação semelhante em outras partes da Síria, incluindo nos subúrbios a Sul de Damasco, onde eles estão a planear mais uma vez plantar uma substância e acusar as autoridades sírias de usarem armas químicas", disse Putin, durante uma conferência de imprensa ao lado do Presidente italiano, Sergio Mattarella, em Moscovo.

Logo a seguir, a Casa Branca acusou a Rússia de estar a encobrir este ataque com armas químicas dizendo que há relatórios das agencias de espionagem sobre o ataque, e acusou os Governos russo e sírio de tentarem confundir o mundo sobre o ataque através de “narrativas falsas”.     

Quanto à acusação norte-americana de que a Rússia anda com os amigos errados (o Irão, a Síria e o movimento islamista Hezzbollah), Putin disse apenas que está disposto a tolerar as opiniões negativas sobre o papel da Rússia na Síria, mas espera que "os comportamentos acabem por perder força", numa referência ao ataque norte-americano contra a Síria. Em linha com o que vinha sendo pedido por outros responsáveis russos, Vladimir Putin repetiu o pedido para que o ataque na província de Idlib seja investigado de forma independente.

Em relação a esse ataque, o secretário de Estado norte-americano repetiu o principal argumento apresentado pelo Presidente Donald Trump: "Foi um caso de segurança nacional." 

"O ataque foi uma resposta directa ao uso de armas químicas pelo regime sírio, sob a liderança de Bashar al-Assad", afirmou Rex Tillerson. "Acreditamos que foi em defesa do interessa nacional [dos EUA] por causa da ameaça que o armamento químico inseguro representa perante as condições caóticas no terreno na Síria. Há um combate contra o Estado Islâmico, uma guerra civil, uma presença numerosa de elementos da Al-Qaeda, e por isso é importante para nós que quaisquer armas encontradas sejam protegidas e acabem por ser destruídas", disse o secretário de Estado norte-americano, reforçando assim o argumento do interesse nacional – que serve também para tentar aplacar as críticas de muitos apoiantes de Donald Trump da direita nacionalista e de vários membros do próprio Partido Republicano, que defendem uma postura não intervencionista.

O secretário de Estado norte-americano comentou também a aliança entre o Governo da Síria, o Irão e o movimento islamista libanês Hezbollah, dizendo que é "contrário aos interesses da Rússia", e que Moscovo "deveria realinhar-se com os Estados Unidos"."Espero que a Rússia reconheça que se alinhou com um parceiro não confiável", disse Rex Tillerson em Itália, antes de partir para a Rússia.O responsável traçou outra linha vermelha, ao dizer que os EUA "não podem voltar a permitir o uso de armas químicas".

Este é um dos principais problemas das possíveis consequências do ataque norte-americano da semana passada – se voltarem a ser usadas armas químicas na Síria, os Estados Unidos terão poucas opções: ou lançam um novo e ineficaz ataque limitado e com poucos estragos como o da semana passada; ou não fazem nada e arriscam-se a ver a sua posição enfraquecida; ou lançam um ataque mais alargado, o que pode fazer o país mergulhar de cabeça na guerra na Síria.

Apesar destas declarações, Tillerson reafirmou que a prioridade dos Estados Unidos na Síria e no Iraque é "derrotar o Estado Islâmico". Muitos analistas têm dito que contribuir para o fim de Assad e querer derrotar o Estado Islâmico ao mesmo tempo é uma tarefa impossível de cumprir, mas Washington garante que uma não impede a outra, apesar de não haver sinais do plano que tem a longo prazo para a Síria.Sobre este assunto, Rex Tillerson disse apenas que os Estados Unidos "vão analisar opções estratégicas para pôr fim à violência na Síria".