Queixas dos consumidores portugueses são as que mais demoram a ser atendidas na UE

Painel de Avaliação da Justiça na União Europeia revela que tribunais portugueses continuam demasiado lentos, apesar de terem melhorado.

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Enric Vives-Rubio

A administração pública demora em média cerca de dois anos a responder às queixas dos consumidores em Portugal, país que surge no fundo da tabela, quanto ao tempo médio de resolução destes casos, no mais recente Painel de Avaliação da Justiça na União Europeia. A situação retrada no relatório não tem par em nenhum outro país. “O que pode dever-se à complexidade dos procedimentos e, nalguns casos, à falta de equipamentos para digitalizar os processos”, lê-se no relatório.

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A administração pública demora em média cerca de dois anos a responder às queixas dos consumidores em Portugal, país que surge no fundo da tabela, quanto ao tempo médio de resolução destes casos, no mais recente Painel de Avaliação da Justiça na União Europeia. A situação retrada no relatório não tem par em nenhum outro país. “O que pode dever-se à complexidade dos procedimentos e, nalguns casos, à falta de equipamentos para digitalizar os processos”, lê-se no relatório.

O documento, que reporta dados relativos a 2015 na maioria dos seus capítulos, avalia também a eficiência dos tribunais em tipos de litígios que contribuem de forma decisiva para o funcionamento da economia. Os dados são díspares quanto a Portugal. É, juntamente com o Chipre, o pior classificado no tempo médio de duração dos recursos de sentenças relacionadas com casos de comunicações electrónicas, que em 2014 demoram nada menos de 1920 dias. Mas fica a meio da tabela no que concerne aos recursos em litígios relacionados com questões de concorrência e em segundo melhor lugar quando se fala dos recursos judiciais relacionados com a defesa do consumidor.

Tribunais precisam de 700 dias para resolver litígios

De uma forma geral, e incluindo outro tipo de litígios além dos comerciais, como os cíveis e os administrativos, os tribunais continuam a demoraram muito tempo a alcançar a sua resolução, muito embora tenham registado grandes melhorias em relação a 2010. Segundo o documento, só o Chipre ficou, em 2015, pior classificado do que Portugal no que a esta questão concerne.

Os tribunais nacionais de primeira instância precisaram em média de cerca de 700 dias para resolver este tipo de processos – quando em Espanha, por exemplo, bastaram pouco mais de 200. Se olharmos para as estatísticas de 2010 verificamos, mesmo assim, que se registou um grande progresso: há sete anos a demora chegava aos 1100 dias, o que tornava Portugal recordista dos atrasos.

E se no capítulo das pendências na justiça cível, comercial e administrativa (ou seja, número de casos por mil habitantes por resolver) Portugal ficou acima de todos os outros países analisados em 2015, nem tudo são, apesar disso, más notícias: a taxa de resolução processual nacional, que mede a capacidade do sistema para enfrentar a procura – medindo o volume de litígios resolvidos por comparação com aqueles que deram entrada em determinado período – cifrou-se nos 124%, a mais alta da UE a seguir à Estónia.

Seja como for, Portugal continua a pertencer ao pequeníssimo grupo de escassos Estados-membros que não possuem mecanismos especiais para lidar com os atrasos na justiça. Na maioria dos países a ultrapassagem dos prazos implica alocação de mais recursos humanos e financeiros, bem como várias outras medidas destinadas a resolver o problema.  

400 dias para julgar casos de branqueamento

Pela primeira vez, a Comissão Europeia monitorizou a duração dos processos na primeira instância de branqueamento de capitais. As estatísticas mostram que os tribunais portugueses demoram mais tempo que a maioria dos seus congéneres a lidar com a lavagem de dinheiro: cerca de 400 dias, uma duração semelhante à da Polónia e da Roménia, embora muito inferior à da Hungria, por exemplo, onde as acções deste tipo demoram cerca de três anos a serem resolvidas.

Em 2015, Portugal gastou pouco mais de 50 euros por habitante no funcionamento do sistema judicial, o que nos coloca no 17.º lugar da UE, atrás de Espanha, Itália, França ou da Polónia. Foi pouco mais de 3% do Produto Interno Bruto, mas mesmo assim registou-se uma subida em relação aos gastos de 2014. De resto, outros constrangimentos detectados em anos anteriores mantêm-se: é escassa a proporção de juízas nos tribunais superiores, se comparada com a dos seus colegas homens, e Portugal continua a ser dos poucos países que não disponibiliza online as sentenças de primeira instância.

Apesar de tudo, a percepção que os portugueses têm da independência do poder judicial melhorou substancialmente do ano passado para este ano: há mais pessoas a considerá-la como sendo bastante boa, por comparação com o que achavam em 2016.

Processos acumularam-se

Conceição Gomes, do Observatório Permanente da Justiça, explica a aparente discrepância entre a elevada taxa de resolução de resolução processual da justiça administrativa e também fiscal e as altas pendências com o facto de os processos se terem acumulado ao longo de anos nalguns destes tribunais. Mas chama a atenção para a existência de desempenhos muito distintos entre os tribunais, consoante a área geográfica em que estão inseridos, e nalguns casos até entre diferentes secções do mesmo tribunal. “Há um claro problema de gestão de recursos”, analisa, antecipando que podem estar ainda para surgir nos próximos anos eventuais melhorias resultantes do novo sistema de gestão dos tribunais portugueses, lançado no final de 2014.

A especialista sublinha, porém, que nem tudo se joga só nas áreas em que a justiça influencia de forma decisiva a economia de um país: “Há situações em que a ineficiência dos tribunais tem um impacto muito forte na vida das pessoas, como na área laboral, ou na de família e menores.” Dois anos de espera na vida de uma criança são uma eternidade, por exemplo. E o atraso de um tribunal na resolução de um caso de violência doméstica “pode significar a diferença entre a vida e a morte.”