Crise pôs os portugueses a comer melhor

Aumentou legumes, frutos e leguminosas. Pela primeira vez, a carne de aves superou a de suínos. Porém, os portugueses continuam a comer o dobro das calorias necessárias.

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Pela primeira vez em 40 anos as leguminosas ganham peso no prato dos portugueses Manuel Roberto

Os portugueses continuam a comer demasiado e a afastar-se do padrão alimentar mediterrânico, mas no pico da crise começaram a comer um bocadinho melhor. Entre 2012 e 2016, aumentaram a ingestão de legumes, frutos e, pela primeira vez em 40 anos, das leguminosas como o feijão, o grão e a ervilha. A conclusão pode ser extraída da Balança Alimentar Portuguesa (BAP), divulgada ontem pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), que, a partir da análise aos produtos alimentares disponíveis para consumo, permite calcular como se alimentaram os portugueses naquele período.

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Os portugueses continuam a comer demasiado e a afastar-se do padrão alimentar mediterrânico, mas no pico da crise começaram a comer um bocadinho melhor. Entre 2012 e 2016, aumentaram a ingestão de legumes, frutos e, pela primeira vez em 40 anos, das leguminosas como o feijão, o grão e a ervilha. A conclusão pode ser extraída da Balança Alimentar Portuguesa (BAP), divulgada ontem pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), que, a partir da análise aos produtos alimentares disponíveis para consumo, permite calcular como se alimentaram os portugueses naquele período.

Quando comparada com o padrão alimentar recomendado, a disponibilidade alimentar em Portugal continua a pecar por um excesso de “carne, pescado e ovos” e “óleos e gorduras” e por um défice dos hortícolas, dos frutos e das leguminosas secas. Ainda assim, e sobretudo nos anos mais atingidos pela crise social e económica, o INE registou melhorias na disponibilidade destes três últimos grupos e chega mesmo a precisar que a maior aproximação ao padrão da dieta mediterrânica (muito baseada em peixe, azeite extra-virgem, vinho tinto com moderação, produtos frescos e grãos de cereais) “ocorreu com o início da recessão económica em Portugal em 2011 e 2012”, tendo-se registado, a partir daí, novo aumento do consumo de carne e alimentos ricos em açúcar.

Descontadas as oscilações, o consumo de hortícolas que representava 15% dos alimentos consumidos em 2012 passou para os 16,2%, em 2016. Neste ano, as disponibilidades diárias de hortícolas totalizaram 295,9 gramas por habitante, num aumento de 36,3 gramas relativamente às disponibilidades médias diárias do quinquénio 2008/2011. Do mesmo modo, o peso dos frutos aumentou de 11,7% para 12,7%, entre 2012 e 2016. E quanto às leguminosas secas, onde prepondera o feijão, aumentaram de 0,5 para 0,6%. Parece pouco, mas a bastonária da Ordem dos Nutricionistas, Alexandra Bento, encontrou neste ligeiríssimo aumento um forte motivo de aplauso. “Ao longo dos últimos quarenta anos, a disponibilidade de leguminosas baixou sempre. Sendo um alimento de origem vegetal com uma grande riqueza proteica, e num momento em que se alerta muito os consumidores para a necessidade de reduzirem os alimentos proteicos de origem animal, esta inversão é importantíssima”, sublinha, atribuindo a mudança ao facto de 2016 ter sido o Ano Internacional das Leguminosas e de ter, consequentemente, “havido um trabalho intenso das organizações de saúde de alerta para os benefícios das leguminosas”.

Mais aves e menos carne vermelha

Apesar das melhorias, os hábitos portugueses à mesa continuam distantes do recomendado: 23% dos alimentos consumidos devem ser hortícolas, 20% frutos e 4% leguminosas. Daí que o INE conclua que as disponibilidades alimentares "continuam a evidenciar uma oferta alimentar excessiva e desequilibrada".

Aumentar

Um dos problemas é a excessiva ingestão de “carne, pescado e ovos”. Neste grupo, a oferta alimentar aumentou dos 16% de 2012 para os 16,5% de 2016, contra os 5% recomendados na Roda dos Alimentos. Estes resultados estão em linha com o último Inquérito Alimentar Nacional e de Actividade Física, divulgado em meados de Março. Mas também aqui Alexandra Bento encontra motivos de congratulação: as carnes vermelhas têm vindo a perder terreno para as carnes brancas. De resto, em 2012-2016, a oferta de carne de suínos (31,5%) foi pela primeira vez inferior à de carne de animais de capoeira (36,7%). A carne de bovino, por seu turno, manteve-se em terceiro lugar (21,5%). “Aqui pesam as razões económicas. Mas creio que os alertas da Organização Mundial de Saúde sobre a necessidade de reduzir ao mínimo o consumo de carnes vermelhas, enchidos e fumados, também tiveram algum peso”, interpreta a nutricionista. Nos cinco anos analisados, a disponibilidade das carnes brancas aumentou 16,1%, enquanto nos bovinos o aumento foi de apenas 8,6%.

Calorias disponíveis são o dobro das necessárias

Outra das conclusões é que as disponibilidades alimentares per capita entre 2012-2016 diminuíram 2,7% face ao quinquénio anterior, numa circunstância a que também “não será alheia a recessão da economia portuguesa ocorrida entre 2011 e 2013”, segundo o INE. É, ao contrário do que pode parecer, uma boa notícia, dado que os portugueses ainda ingerem quase o dobro das calorias necessárias: 3895 por dia, no ano de 2016, contra as 2000 recomendadas.

Olhando para a média registada no período que vai de 2008 a 2011, esta foi de 3938 quilocalorias/dia/pessoa; baixou para uma média de 3834 quilocalorias, no período 2012-2016. Continua a ser, como sublinha o INE, um aporte calórico suficiente para “suprir as necessidades de consumo recomendadas de dois adultos”.

Este excesso mostra como “a oferta alimentar revela desequilíbrios quando comparada com o padrão alimentar recomendado”. E, mesmo se considerarmos que os dados do INE não levam em conta o desperdício alimentar, será lícito concluir que os portugueses continuam a comer mais do que deviam. “Estes números já contemplam o desperdício antes da venda mas não equacionam o desperdício que ocorre entre o comprar e o levar para casa ou para o restaurante, aquando da confecção ou da ingestão dos alimentos, mas é verdade que a disponibilidade energética continua a ser excessiva. É preciso mudar esta tendência”, alerta Alexandra Bento, lembrando que, a somar-se ao excessivo aporte energético, “subsiste outro problema: as pessoas consomem mais energia de fonte animal do que vegetal”.

 

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