O piano e a electrónica de Quest, agora com orquestra

Em resposta a uma encomenda do festival Westway Lab, Joana Gama e Luís Fernandes apresentam em Guimarães e Lisboa um novo concerto do seu duo Quest em colaboração com a Orquestra de Guimarães. É o grande destaque da quarta edição do festival.

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A uma semana de se apresentarem pela primeira vez com a Orquestra de Guimarães, Joana Gama e Luís Fernandes ainda não tinham uma noção exacta daquilo a que soaria a sua primeira experiência enquanto Quest com o ensemble de 14 músicos com que se apresentarão a sexta-feira, 7 de Abril, no Centro Cultural Vila Flor, Guimarães, e a 8, sábado, no Teatro Maria Matos, Lisboa. Só nos últimos dias os sons que imaginaram e transmitiram ao maestro José Alberto Gomes – e que até há pouco apenas tinham ouvido numa pouco real simulação em MIDI – ganharam vida a acompanhar o duo de piano e electrónica.

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A uma semana de se apresentarem pela primeira vez com a Orquestra de Guimarães, Joana Gama e Luís Fernandes ainda não tinham uma noção exacta daquilo a que soaria a sua primeira experiência enquanto Quest com o ensemble de 14 músicos com que se apresentarão a sexta-feira, 7 de Abril, no Centro Cultural Vila Flor, Guimarães, e a 8, sábado, no Teatro Maria Matos, Lisboa. Só nos últimos dias os sons que imaginaram e transmitiram ao maestro José Alberto Gomes – e que até há pouco apenas tinham ouvido numa pouco real simulação em MIDI – ganharam vida a acompanhar o duo de piano e electrónica.

Quest nasceu do encontro casual entre os dois músicos, em 2012, enquanto participantes no programa 100Cage com que o Maria Matos celebrou o centenário do nascimento do compositor vanguardista John Cage. Apesar de provenientes de universos de base bastante distintos – Joana é pianista de formação clássica, ligada à apresentação de reportório erudito, com um interesse particular em obras contemporâneas e várias colaborações com coreógrafos; Luís é membro dos Peixe:Avião e autor do projecto Landforms, movendo-se entre o rock de vistas largas e a electrónica experimental –, a descoberta de uma afinidade musical, a proximidade geográfica e, sobretudo, o aventureirismo de ambos acabaram por estabelecer uma parceria que rapidamente deu frutos com um espantoso álbum homónimo lançado em 2014.

Desde então, foram continuando a trabalhar juntos e, em 2016, integraram o violoncelista Ricardo Jacinto num novo projecto designado Harmonies, trabalhado a partir de pistas musicais fornecidas pela obra de Erik Satie. Antes disso, no entanto, o programador do Vila Flor e do festival Westway Lab, Rui Torrinha, percebeu que a originalidade da proposta musical do duo Quest se prestava a desafios menos convencionais e lançou-lhes o isco de uma parceria com a Orquestra de Guimarães. “Eu e a Joana partilhamos um bocado de loucura e temos a tendência para aceitar certas coisas sem equacionar muito bem o que isso implica”, diz Luís Fernandes ao PÚBLICO acerca da pouca hesitação em acolher o convite de Torrinha. “Ficámos muito entusiasmados e a resposta foi um sim redondo.” Claro que depois, antes sequer de esboçarem a primeira nota, foram necessárias algumas reuniões preliminares para definir os contornos exactos da colaboração – nomeadamente, a dimensão do ensemble que os acompanharia, com cordas, sopros e percussão.

Sob o efeito de Eliot

Há exactamente um ano, aproveitando uma residência nos Açores a convite do Festival Tremor, Joana e Luís começaram a trabalhar nas primeiras ideias dos sete temas do concerto (que será disco mais tarde) At the Still Point of the Turning World, título surripiado ao poema Burnt Norton de T.S. Eliot. Desde o início, a ideia de juntar Quest e Orquestra de Guimarães pressupunha a composição de material novo, processo a que Joana e Luís se dedicaram replicando os passos do primeiro disco, experimentando e gravando o material que depois deixaram repousar, peneiraram e esculpiram até lhe atribuir uma forma mais definida. “Tendo sempre presente que eram temas que iríamos tocar com orquestra”, ressalva a pianista.

A ocasião serviu também para Joana e Luís explorarem algumas ideias em que tinham pensado anteriormente e que passavam por uma maior ligação ao ritmo. À medida que iam definindo o espaço de actuação de cada um, iam também criando uma partitura e um conjunto de instruções que depois eram passadas com absoluto detalhe para o maestro, responsável pelos arranjos e orquestrações. No tema mais electrónico e abstracto do conjunto, revela Luís Fernandes, “as instruções para orquestra nem sequer requerem partitura – definimos um conjunto de regras que os músicos têm de seguir e que nós achamos que resultará numa textura muito interessante”. É uma das ideias em que assumem tentar “subverter um pouco a orquestra”, forçando-a a adaptar-se à linguagem musical dos Quest. Ainda assim, e sem que, segundo Joana Gama, esta colaboração represente “uma mudança drástica” relativamente ao que haviam apresentado em Quest e Harmonies, atrevem-se também a um ou outro momento em que a orquestra é deixada num papel mais clássico.

A ausência de uma mudança drástica significa que a ideia de espaço trabalhada pelo piano e pela electrónica não será ameaçada por uma entrada de rompante da orquestra, não transformando, por isso, a música com um sentido majestático que nunca teve. “Se às vezes há uma sobrecarga textural”, enquadra a pianista, “tem que ver com algo mais emotivo em termos de adensamento do que propriamente uma grande complexificação.” E à semelhança do que antes acontecia, se Luís processava electronicamente o som do piano de Joana, também agora deverá usar esse dispositivo para retrabalhar o som de alguns instrumentos do ensemble.

O concerto de Guimarães será gravado “da forma mais profissional possível” para garantir que as partes da orquestra ficam registadas para uma posterior edição em disco. Guardam para mais tarde a decisão de respeitar ou adulterar a interpretação original destes sete temas baptizados com referências ao citado poema de T.S. Eliot que versa a passagem do tempo. A possibilidade de os temas não ficarem encerrados após a primeira apresentação é algo, aliás, que Joana Gama lembra ser habitual no universo da música escrita. “Estamos tranquilos em relação a isso, porque também acontece com o Pinho Vargas, o Stockhausen ou o Xenakis, que também mudam algumas coisas quando as obras são estreadas. Só depois de se perceber em definitivo que resulta é que se fecha a partitura.”

A quarta edição do Westway Lab decorre entre 5 e 8 de Abril em Guimarães, e acolhe uma série de concertos, residências, conferências, debates e showcases, pretendendo funcionar como espaço de encontro entre criadores nacionais e internacionais. Além do concerto que junta Quest e Orquestra de Guimarães, estão previstas actuações de XIXA, You Can’t Win, Charlie Brown, Lince ou :Papercutz.