Guerra pelo poder no Paraguai faz um morto e deixa Parlamento em chamas
Senado votou em segredo para aprovar proposta de emenda constitucional para que o Presidente Horacio Cartes possa concorrer a um segundo mandato em 2018.
O Parlamento do Paraguai foi incendiado, num violento protesto quando se soube de algo que tem todos os ingredientes para fazer suspeitar de uma conjura para pôr em causa a democracia que os paraguaios aprenderam a valorizar, após 35 anos de ditadura militar: uma votação secreta de senadores, não no hemiciclo mas numa sala qualquer do Congresso, para aprovar uma proposta de mudança da Constituição que permitiria ao Presidente Horacio Cartes recandidatar-se em 2018.
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O Parlamento do Paraguai foi incendiado, num violento protesto quando se soube de algo que tem todos os ingredientes para fazer suspeitar de uma conjura para pôr em causa a democracia que os paraguaios aprenderam a valorizar, após 35 anos de ditadura militar: uma votação secreta de senadores, não no hemiciclo mas numa sala qualquer do Congresso, para aprovar uma proposta de mudança da Constituição que permitiria ao Presidente Horacio Cartes recandidatar-se em 2018.
Entre o caos das chamas e da repressão policial, com balas de borracha e polícia a cavalo, houve muitos feridos e um morto: Rodrigo Quintana, de 25 anos, líder da ala juvenil do Partido Liberal Radical Autêntico, baleado com munição real pela polícia.
Tinha nove chumbos no corpo, resultado do disparo de um único tiro de caçadeira dado a distância média, afirmou em conferência de imprensa o director de Medicina Legal e Ciências Forenses do Ministério Público, Pablo Lemir. Um perfurou-lhe o pulmão, e causou a morte por asfixia.
Rodrigo Quintana foi morto num episódio confuso, em que alguns polícias invadiram as instalações do Partido Liberal. Foram detidos cinco agentes, e o ministro do Interior colocou o cargo à disposição, num momento de grande delicadeza em Assunção. Mais manifestantes chegavam este sábado à capital, e temia-se a continuação da violência.
Na sequência dos protestos, foram detidas mais de 200 pessoas e entre o resto dos feridos estão jornalistas e políticos, como o presidente do Senado, Roberto Acevedo, que se opõe à mudança da Constituição. Há notícias de protestos e motins noutras zonas deste país de 6,8 milhões de habitantes, fortemente marcado pela memória da ditadura do general Alfredo Stroessner, de 1964 a 1989.
É por causa da ditadura que, desde 1992, os chefes Estado do Paraguai estão limitados a um mandato não renovável de cinco anos, como um mecanismo de protecção da democracia. A morte de Quintana, e as detenções, evocam nos paraguaios a recordação dos tiros que mataram vários militantes pela democracia, fez 18 anos esta semana, na praça em frente ao Congresso – o episódio conhecido como Março Paraguaio, em que foi morto um vice-presidente, e se tornou um momento icónico do caminho gradual de regresso à democracia.
A tentativa de Horacio Cartes e do Partido Colorado forçarem a alteração da Constituição não é tranquilizadora, numa América do Sul já preocupada com a instabilidade venezuelana. O Presidente manteve-se calado e apenas emitiu um curto comunicado no Twitter, pouco tranquilizador: apelou à calma e criticou a oposição e os media por encorajarem o ataque ao Parlamento: “Isto demonstra que um grupo de paraguaios envolvidos na política e em meios de comunicação de massas não pouparam esforços para destruir a democracia”.
A proposta de alteração da Constituição foi aprovada por 25 senadores – dois a mais do que o mínimo exigido, e tem ainda de ir à câmara baixa do Parlamento, onde a Reuters diz que tem amplo apoio. Depois, terá ainda de ser submetida a referendo.
O Senado paraguaio já se tornou célebre por ter destituído com uma notável rapidez o Presidente de esquerda Fernando Lugo, em 2012, num processo considerado na altura "ilegítimo" por vários governos da América Latina.
Lugo, afastado por "mau desempenho das suas funções" por uma maioria do Partido Colorado que tem dominado a vida política paraguaia desde 2008, é agora senador, pela Frente Guasu, e gostaria de recandidatar-se – algo que a Constituição também não permite.