Investidores penalizados na venda do Novo Banco à Lone Star
Contrato assinado com fundo americano prevê um bail-in obrigacionista: a permuta de títulos com alguma protecção por outros de maior risco.
O negócio de venda do Novo Banco ao Lone Star vai forçar os obrigacionistas seniores da instituição portuguesa a substituírem os seus títulos por obrigações subordinadas ou perpétuas, de maior risco. A operação de troca não era do conhecimento de todos os intervenientes e estava ontem a acentuar a celeuma entre os investidores e o meio financeiro, também surpreendidos com a garantia dada pelo Fundo de Resolução de assumir perdas até 3,9 mil milhões de euros de activos problemáticos, se necessário.
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O negócio de venda do Novo Banco ao Lone Star vai forçar os obrigacionistas seniores da instituição portuguesa a substituírem os seus títulos por obrigações subordinadas ou perpétuas, de maior risco. A operação de troca não era do conhecimento de todos os intervenientes e estava ontem a acentuar a celeuma entre os investidores e o meio financeiro, também surpreendidos com a garantia dada pelo Fundo de Resolução de assumir perdas até 3,9 mil milhões de euros de activos problemáticos, se necessário.
Trinta e dois meses depois, esta sexta-feira, a história repetiu-se com os mesmos protagonistas: Governo, Banco de Portugal e banca. E no centro, outra vez o Novo Banco. E, pelo meio um fundo de investimento imobiliário norte-americano classificado de “abutre” pela “gerigonça” que apoia o primeiro-ministro. E a polémica rebentou.
O contrato já assinado entre o Fundo de Resolução, gerido pelo Banco de Portugal, e o Lone Star, prevê um bail-in obrigacionista: a permuta de títulos com alguma protecção, por outros de maior risco, como condição para a venda do Novo Banco se finalize. No total, da troca de títulos terão de sair 500 milhões de euros de obrigações perpétuas que, pela sua natureza, irão reforçar o capital do Novo Banco.
Embora a operação seja voluntária, torna-se na prática obrigatória, pois coloca uma espada sobre os investidores. É que se estes não aceitarem trocar as suas obrigações, o banco caminha para a liquidação, arriscando mais as suas aplicações. Terá agora de haver uma assembleia-geral de obrigacionistas para aprovar a medida, e, assim, garantir a venda de 75% do Novo Banco ao Lone Star. Depois fica a faltar a autorização das entidades competentes: Banco Central Europeu e Comissão Europeia.
A concretizar-se toda a operação, e depois de concluída a capitalização da CGD, António Costa fecha o último tema financeiro sensível herdado de Pedro Passos Coelho. Ontem, em declarações públicas, o primeiro-ministro recuperou a argumentação do líder do PSD, em Agosto de 2014, na resolução ao BES, de que poupou os contribuintes, mas passa a mensagem de que só interveio porque o seu antecessor não fez o trabalho de casa.
Com a aproximação de Agosto de 2017, a data para fechar o Novo Banco, o primeiro-ministro evocou, nos bastidores, urgência no dossiê. Desde logo porque as restantes vias que se abriam não eram as favoráveis: a falência ou a nacionalização. Ambas as soluções manteriam vivas as preocupações em torno da banca, para além de porem em causa as metas macroeconómicas, num momento em que o desemprego está a cair, o PIB a crescer mais do que o previsto e há a expectativa de saída do procedimento por défice excessivo.
E foi neste cenário que ontem, ao final da tarde, António Costa apareceu ao lado do ministro das Finanças, Mário Centeno, sorridente a passar mensagens: o negócio foi concluído, evita a liquidação e, não terá envolvimento directo do Estado. Só o sistema financeiro irá sofrer os custos. E apenas se os encargos decorrentes do seu envolvimento, através do Fundo de Resolução, subirem. Isto, porque a “garantia” de 3,9 milhões de euros passa a ser uma contingência colocada no Fundo de Resolução, que será usada se o rácio de capital da instituição descer abaixo dos 12,5%. E só em resultado da desvalorização dos activos problemáticos, e caso os aumentos de capital que o Lone Star irá fazer (que serão de mil milhões) e a actividade não gerar lucros que tapem o défice. Na substância, trata-se de uma garantia dada ao investidor norte-americano pelo Fundo de Resolução.
Banca na expectativa
Apesar de a APB já ter reclamado, a solução dificilmente desencadeará um movimento generalizado de contestação no sector bancário (que financia o Fundo de Resolução), pois o impacto nas contas não é imediato. Se as responsabilidades para com o Novo Banco dispararem, dos actuais 4,9 mil milhões até, no máximo, 8,6 mil milhões, a prestação que hoje é paga ao Estado não se altera.
Fontes do sector consultadas, esta sexta-feira, pelo PÚBLICO foram claras: comentários só no fim do jogo. É o mesmo que dizer que só se vão pronunciar quando souberem o preço que vão pagar para “salvarem” o Novo Banco da liquidação. Questionam ainda o facto de também terem carteiras inundadas de activos problemáticos e de não receberem ajuda do Fundo de Resolução.
Mas no final, vai prevalecer o pragmatismo dos banqueiros: o tema está fechado e os danos adicionais são a perder de vista, no mínimo para além de 2046. E todos, BCP, BPI, Santander, por exemplo, optaram por se colocar na posição de espectadores, sem avançar com ofertas de compra do Novo Banco, que manterá António Ramalho como presidente.
Nas próximas semanas, à mediada que os detalhes da operação forem sendo conhecidos, a banca vai apurar o impacto do aumento da sua exposição ao Fundo de Resolução. E, evidentemente avaliar até que ponto há condições para reagir juridicamente. Um conflito com as autoridades é incerto e será sempre prolongado e com efeitos na imagem do sector cuja credibilidade, desde a crise de 2008, se tem degradado por erros de governação e actos dolosos de alguns gestores. E no combate com os partidos, que tem um tempo de curto de acção, os banqueiros perdem sempre. Não se espera, por isso, nenhum vento de revolta a agitar o mundo da alta finança.