Reguladores europeus aumentam pressão mas City ainda resiste

Várias instituições sedeadas em Londres estão a começar a preparar-se para uma deslocalização para a Europa Continental, mas ainda apenas de forma muito moderada.

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Bolsa de Londres Reuters/Toby Melville

De um lado estão os reguladores europeus e praças financeiras de média dimensão como Frankfurt, Paris ou Dublin. Do outro, os mercados de obrigações e derivados de Londres e as grandes instituições financeiras mundiais que querem evitar aumentos de custos. Nove meses passados desde a vitória do “Brexit”, já se assistem às primeiras movimentações nesta batalha pela predominância no sector financeiro europeu, mas prever quem será no final o vencedor é ainda uma tarefa difícil.

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De um lado estão os reguladores europeus e praças financeiras de média dimensão como Frankfurt, Paris ou Dublin. Do outro, os mercados de obrigações e derivados de Londres e as grandes instituições financeiras mundiais que querem evitar aumentos de custos. Nove meses passados desde a vitória do “Brexit”, já se assistem às primeiras movimentações nesta batalha pela predominância no sector financeiro europeu, mas prever quem será no final o vencedor é ainda uma tarefa difícil.

Para a City – o nome que se dá ao centro financeiro de Londres onde se reúne uma parte muito importante dos bancos de investimento e dos mercados de derivados e matérias-primas do mundo – os desafios lançados pela saída do Reino Unido da União Europeia são evidentes. Até agora, todas as instituições com sede em Londres tinham a possibilidade de actuar nos restantes países da União Europeia e todas as instituições de outros países europeus podiam actuar em Londres sem qualquer obstáculo.

A capital britânica consolidou nos últimos anos a sua posição como o grande centro financeiro da Europa, sem concorrentes à altura e apenas competindo à escala mundial com Nova Iorque. É em Londres que se encontram cerca de 40% dos activos europeus nas mãos de gestores de fundos e 60% do dinheiro transaccionado nos mercados de capitais. No sector financeiro britânico trabalham mais de 2,2 milhões de pessoas, incluindo os mais qualificados especialistas provenientes de todo o mundo.

Mas e agora? O que acontecerá quando, dentro de dois anos, Londres passar a ser uma cidade situada fora da União Europeia?

O problema irá estar no centro das negociações da saída do Reino Unido da UE e vários actores têm vindo nos últimos meses a preparar-se para todas as eventualidades. De um lado, estão as autoridades britânicas, decididas a não perder esta enorme vantagem para a sua economia. Do outro, as autoridades europeias, apostadas em não perder por completo o controlo sobre os centros de decisão do sistema financeiro internacional. No meio, estão várias instituições financeiras que, perante a incerteza quanto ao desfecho desta negociação, começam a tomar medidas que reduzam os riscos.

Do lado britânico, a aposta é convencer Bruxelas que tem também muito a perder com o levantamento de fronteiras financeiras rígidas entre as duas partes. O principal argumento: se é verdade que, neste momento, há cerca de 5500 instituições financeiras com sede no Reino Unido que usam o denominado “passaporte financeiro” para poder realizar operações no resto da União Europeia, não se pode esquecer que, do outro lado, há cerca de 8000 instituições europeias que fazem o mesmo em relação ao Reino Unido.

Há assim, acreditam os britânicos, motivos para que se abra a porta à concessão, de forma relativamente simples, de novos “passaportes financeiros”, que permitam que a forma como as diversas entidades actuam nos vários mercados europeus se possa manter quase inalterada.

Entre as autoridades europeias, contudo, são poucos os sinais de que haja vontade de manter tudo na mesma. Um papel fundamental nesta discussão tem vindo a ser desempenhado pelo Banco Central Europeu, que tem vindo a tornar claro aos grandes bancos internacionais que, se querem actuar na zona euro, vão ter de se sujeitar integralmente às exigências regulatórias europeias, não sendo possível pensar em beneficiarem de eventuais regimes mais favoráveis oferecidos pelo Reino Unido.

Perante isto, o que alguns bancos têm vindo a fazer é começar a preparar-se para as diversas eventualidades. Os responsáveis dos maiores bancos europeus e norte-americanos têm assumido que irão começar brevemente a deslocar algumas das suas operações para a Europa continental. Nesta fase, ainda a cerca de dois anos da efectivação da saída do Reino Unido da UE, as mudanças previstas são de pequena dimensão, e a ideia parece ser a de ir saindo de Londres para outras capitais europeias apenas à medida que tal se revelar estritamente necessário.

O BCE, no entanto, já deixou avisos. “Qualquer banco que se movimente para a zona euro vai ter de cumprir os nossos padrões”, afirmou recentemente Sabine Lautenschlaeger, que faz parte do conselho executivo do BCE. Esta responsável deixou ainda claro que passar apenas pequenas partes das operações não será suficiente para que os bancos possam ser considerados como estando sedeados na zona euro. “Não iremos aceitar empresas vazias“, disse, explicando que irão precisar de ter “uma gestão de risco local adequada, recursos humanos locais suficientes e independência operacional”.

Nas últimas semanas, foi ainda noticiado em vários jornais britânicos que o BCE estava a dar incentivos aos bancos da City para transferirem operações para a zona euro o mais cedo possível, oferecendo condições mais favoráveis para quem o fizer antes da saída do Reino Unido da UE se concretizar.

Quererá isto dizer que o fim do predomínio da City está iminente? Entre os actores do sector financeiro poucos são os que acreditam nisso. O predomínio avassalador dos mercados londrinos em diversos tipos de operações faz com que seja muito difícil que pequenos centros no resto da Europa possam tornar-se concorrentes perigosos no médio prazo.

Aliás, desde o referendo até agora, em algumas áreas, como a da transacção de swaps de taxas de juro, não há qualquer sinal de crise na City, tendo-se registado durante o ano passado um aumento de 25% das transacções.