O livro negro dos mineiros do Pejão
Adriano Miranda recupera trabalho realizado há mais de duas décadas para a edição de um álbum sobre os trabalhadores das minas que foram fechadas em 1994.
Mais do que um álbum de fotografia, Carvão de Aço será um objecto integralmente negro, quase como uma peça de carvão. Mas não se trata de fazer nenhum luto relativamente a uma comunidade que perdeu o seu trabalho, e o objecto da sua subsistência, há já mais de duas décadas. “É acima de tudo uma homenagem, um gesto de gratidão” perante essa comunidade de mineiros “que têm corpo e espírito de aço, sempre muito orgulhosos do seu trabalho e da sua história”.
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Mais do que um álbum de fotografia, Carvão de Aço será um objecto integralmente negro, quase como uma peça de carvão. Mas não se trata de fazer nenhum luto relativamente a uma comunidade que perdeu o seu trabalho, e o objecto da sua subsistência, há já mais de duas décadas. “É acima de tudo uma homenagem, um gesto de gratidão” perante essa comunidade de mineiros “que têm corpo e espírito de aço, sempre muito orgulhosos do seu trabalho e da sua história”.
É assim que Adriano Miranda (n. Aveiro, 1966), fotojornalista do PÚBLICO, apresenta o seu novo álbum, que terá como título Carvão de Aço, e lançamento anunciado para o próximo 1.º de Maio, nas Minas do Pejão, em Castelo de Paiva.
Respondendo a um desafio da autarquia local – que para o efeito reuniu apoio comunitário no âmbito da Adrimag –, Adriano Miranda foi ao seu arquivo desencantar uma nova selecção de fotografias a preto-e-branco – que outra cor poderia ser?... – do trabalho que realizou naquele complexo mineiro em 1992, quando era ainda estudante de fotografia na Ar.Co – Centro de Arte e Comunicação Visual, em Lisboa.
Na altura, ainda jovem mas já animado pelas preocupações sociais que sempre o acompanham, o fotógrafo contactou várias empresas do distrito de Aveiro pedindo autorização para fotografar e documentar a exploração do trabalho infantil!... “Por aqui se vê como eu era naïf”, recorda Adriano Miranda ao Ípsilon. Naturalmente, não obteve nenhuma resposta. Mas recebeu, da empresa Carbonífera do Douro, autorização e mesmo o desafio para fotografar as Minas do Pejão. “Cheguei lá sem saber muito bem o que iria fazer, muito menos que iria descer a uma profundidade superior a 400 metros”, recorda. Desse trabalho realizado ao longo de quase três anos, saiu uma primeira exposição, que Rui Prata expôs nos Encontros da Imagem em Braga, em 1984, e depois foi também mostrada em Paris.
Passado quase um quarto de século, Adriano Miranda regressou a esse acervo, mas agora com um olhar manifestamente diferente. “Foi uma descoberta fantástica. Na altura, eu tinha um olhar limpo, sem vícios, e ainda não contaminado pelas rotinas do trabalho profissional”, diz o repórter, que viveu esse regresso ao seu baú de memórias como se “estivesse a fotografar de novo esse mundo submerso na escuridão”. “O meu olhar mudou; e tecnicamente descobri alguns erros de enquadramento, mas foi desafiante fazer uma nova edição desse trabalho, assumindo no essencial esse olhar mais jovem”, diz Adriano Miranda.
Carvão de Aço tem grafismo do atelier portuense Gráficos Associados, o mesmo que trabalhou no Projecto Troika, edição anterior do repórter. O “objecto” em que a nova edição está a ser transformado é visto como “um memorial” ao trabalho e à resistência desses mineiros que perderam esse seu ganha-pão em 1994, com o fecho definitivo das minas. “O livro é preto, mas não é a cor do luto, é a cor da mina – é a cor de uma homenagem”, diz a autor.