Quase metade dos imigrantes vive em casas sobrelotadas
Percentagem é cinco vezes maior do que a dos portugueses, mostra Relatório sobre a Exclusão Habitacional na Europa. Sobrelotação também é problema para jovens com entre 20 e 24 anos.
Em Portugal, cerca de 42,3% dos imigrantes de países de fora da União Europeia vive em casas com excesso de habitantes. Esta percentagem é cinco vezes superior à do que os portugueses que vivem nas mesmas condições (8,5%).
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Em Portugal, cerca de 42,3% dos imigrantes de países de fora da União Europeia vive em casas com excesso de habitantes. Esta percentagem é cinco vezes superior à do que os portugueses que vivem nas mesmas condições (8,5%).
Esses mesmos imigrantes têm o quádruplo das probabilidades dos portugueses de estarem sobrecarregados com os custos da habitação: 34,5% vive em casas onde a renda ou o empréstimo ao banco representam quase metade do seu ordenado, em comparação com 8,2% dos portugueses.
A sobrelotação é também um problema para os jovens, independentemente da nacionalidade, que têm entre 20 e 24 anos: afecta 19% desta faixa etária, quando a média geral é de 10,3%. Mais: 58% dos jovens entre 18 e 34 anos ainda vive com os pais.
Os dados relativos a 2014 são do relatório que acaba de sair sobre a Exclusão Habitacional na Europa da Federação Europeia de Organizações Nacionais que Trabalham com População Sem-abrigo, FEANTSA (na sigla francesa) apoiada pela Comissão Europeia.
A sobrelotação mede-se quando uma casa não tem uma sala e um quarto por casal ou um quarto por pessoa com mais de 18 anos, ou um quarto por par de pessoas do mesmo género entre 12 e 17 anos, ou um quarto por par de crianças com menos de 12 anos.
Federação preocupada aumento dos sem-abrigo
A FEANTSA está preocupada com o crescimento dos sem-abrigo e com a fotografia de “privação severa de habitação” em toda a União Europeia. Portugal está dentro dessas preocupações: apesar da abertura, são precisos mais programas que tirem as pessoas da rua e as coloquem em casas e não em abrigos, a solução mais eficaz e menos dispendiosa, diz ao PÚBLICO o director do FEANTSA, Freek Spinnewijn.
No documento, feito em colaboração com a organização francesa Fondation Abbé Pierre, mostra-se ainda preocupação com o facto de a sobrecarga dos custos da habitação em Portugal se agravarem quando se fala de casas pobres, e de se terem agravado relativamente a 2009, numa percentagem que chega aos 33,7% e representa um aumento de 12,3%.
As privações graves das condições de habitabilidade cobrem sobrelotação, dignidade, infiltrações, falta de saneamento, ou falta de luz, e neste campo o relatório diz que as casas com filhos dependentes (8,5%) têm 3,5 vezes mais probabilidades de serem afectadas dos que as que não têm (2,4%). Em Portugal isso acontece em mais de 32% dos lares e em 40% dos lares pobres.
A falta de capacidade para manter uma casa quente tem piorado desde 2009 nas casas pobres (47,5%) e é alta para a população em geral (28,3%). O número de pessoas a viver em casas com humidade, tendo fendas, infiltrações, vidros rachados, por exemplo, também subiu expressivamente desde 2009: em 13,1% na população como um todo e em 11,6% nos lares pobres, ou seja, afecta 32,8% da população em geral e 40,2% das casas pobres.
Habitação social é baixa
É numa parte do mesmo relatório, já divulgado em Setembro, que Portugal ocupa o 22.º lugar em 28 países no Índice Europeu de Exclusão da Habitação, um dos piores já que o número um corresponde ao melhor classificado. Este lugar é calculado a partir do cruzamento de indicadores como o peso da habitação no orçamento pessoal, as dívidas por causa de pagamento de renda ou de empréstimo ao banco, a incapacidade de manter a casa quente, problemas sérios nas condições de habitalidade (como buracos nas paredes ou humidade) e sobrelotação.
“Se se juntarem todos os factores, issto mostra que o mercado português não está a dar boas respostas às pessoas pobres”, diz Freek Spinnewijn. “E significa que as políticas públicas não compensam as oscilações do mercado”, acrescenta. “Havendo pouca habitação social, o Estado tem pouca margem para influenciar o mercado”, conclui. Dá o exemplo de países como a Holanda em que uma em três casas são de habitação social, quando em Portugal isso representa apenas 2% do mercado.
A exclusão habitacional é um problema em toda a União Europeia, sublinha-se no documento, e não apenas nos países que estão a atravessar uma crise: o Reino Unido, com Portugal, a Eslováquia e a Holanda são os que mais caíram neste ranking.
Um dos aspectos positivos sublinhados no relatório é que em Portugal os preços das casas não subiram mais do que o dos salários nos últimos 15 anos, sendo que é uma das excepções de uma tendência que afecta toda a União Europeia, menos a Finlândia e Portugal – estes dados são de 2014 e entretanto, com a subida dos preços do imobiliário, a realidade já se pode ter alterado.
Com uma taxa de risco de pobreza de 19,5%, em Portugal foram registados mais de 1,8 milhões de casas vazias em 2011, pelo Eurostat, relata este documento.
Despejos, uma "marca de infâmia"
Um dos grandes factores de preocupação do relatório são os despejos, “uma das piores formas de violência”, “traumatizante e humilhante”, afirmam: “Trata-se de uma marca de infâmia infligida pela sociedade através das instituições do Estado como a polícia ou o sistema judicial”. E continuam: “O despejo não é apenas uma punição mas um abandono colectivo das pessoas, é sobrepor o direito individual da propriedade à necessidade básica de outro individuo”.
Em relação a este matéria, o relatório diz que Portugal é um dos que têm dados vagos ou extrapolações de amostras de fonte duvidosa. Esses dados mostram que 1% da população residente, cerca de 10.554, foi despejada. Sem dados suficientes sobre os factores de risco em relação aos despejos, sobre Portugal existem entrevistas conduzidas num estudo, elaborado pela FEANTSA e outras entidades. Nele, demonstra-se a correlação entre desemprego e despejo.
“A ausência de interesse em perceber quem pode ser afectado com os despejos mostra que estes continuam a ser vistos como uma responsabilidade pessoal: a dimensão colectiva não é suficientemente estudada, representando uma negação das causas sistemáticas dos despejos e da questão da habitação em geral”, concluem.