Sem diabo nem crise política, Passos enfrenta as autárquicas
“Se isto estivesse a correr mal ao Governo, Passos Coelho tinha encontrado um bom candidato para Lisboa”, diz o sociólogo Pedro Adão e Silva.
Nem o diabo chegou, nem qualquer crise política estalou em Portugal. Se estes cenários de instabilidade passaram pela cabeça do presidente do PSD, eles não se concretizaram. O que aconteceu foi a escolha de um nome para liderar a candidatura à autarquia de Lisboa que levantou polémica no próprio partido. Mas as consequências do resultado das eleições autárquicas, sobretudo na capital, na liderança de Passos Coelho são imprevisíveis.
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Nem o diabo chegou, nem qualquer crise política estalou em Portugal. Se estes cenários de instabilidade passaram pela cabeça do presidente do PSD, eles não se concretizaram. O que aconteceu foi a escolha de um nome para liderar a candidatura à autarquia de Lisboa que levantou polémica no próprio partido. Mas as consequências do resultado das eleições autárquicas, sobretudo na capital, na liderança de Passos Coelho são imprevisíveis.
“Se isto estivesse a correr mal ao Governo, Passos Coelho tinha encontrado um bom candidato para Lisboa.” A tese é do sociólogo Pedro Adão e Silva que considera que houve um “desinvestimento” nas escolhas dos candidatos do PSD às autarquias de Lisboa e do Porto. Pedro Adão e Silva escreveu no Twitter: “As escolhas do PSD para Lisboa e Porto revelam que Passos Coelho estava mesmo convencido que teria legislativas antes das autárquicas". Ao PÚBLICO, o sociólogo reafirmou: “Estas escolhas não se fazem à última hora. Para ter nomes fortes e competitivos era preciso ter trabalhado com tempo, o que não aconteceu no caso do PSD.”
A ideia de que Passos poderá não ter valorizado o suficiente estas autárquicas tem eco na entrevista que a própria líder centrista, e candidata a Lisboa, Assunção Cristas, deu ao PÚBLICO. Nela afirmou que, “em final de Agosto”, o presidente do PSD “entendia que podia haver um risco de eleições legislativas antes das eleições autárquicas”.
Só que não houve crise nenhuma. E isto poderá ter afastado peças do xadrez político: Pedro Adão e Silva entende que, se a vida até corre bem ao executivo socialista, que sociais-democratas avançariam para este combate político? “As circunstâncias são muito adversas”, diz o sociólogo, insistindo que isso afasta os “protagonistas” da corrida que se avizinha. Sem arriscar grandes previsões, Pedro Adão e Silva admite que é possível, claro, que a liderança de Passos fique “mais fragilizada” se houver uma derrota do PSD em Lisboa.
Se dúvidas houvesse sobre as consequências que o resultado eleitoral de umas autárquicas pode ter no governo e nas lideranças dos próprios partidos, bastaria recuar, por exemplo, até 2001 para desfazê-las. Foi o ano em que o então primeiro-ministro António Guterres entendeu ser seu “dever” apresentar a demissão, o que levou a eleições antecipadas. Fê-lo para evitar que o país caísse num “pântano político” e porque estava em causa a “relação de confiança entre governantes e governados”. As duas expressões foram repetidas três vezes na comunicação feita ao país. A razão do socialista era esta: a derrota que o PS, ultrapassado pelo PSD, sofreu nas eleições autárquicas em 2001.
Para Pedro Adão e Silva, o teste é feito sobretudo nas autarquias de Lisboa e do Porto, mas para José Santana-Pereira não. Este politólogo entende que, para haver aquele tipo de implicações nacionais, é necessário que a derrota ultrapasse a autarquia de Lisboa e se estenda ao resto do país.
Uma derrota do principal partido da oposição nas autárquicas em Lisboa não é uma novidade, ou “uma estreia” para o PSD: aconteceu, por exemplo, em 1997, 2007, em 2009, recorda Santana-Pereira. Apesar de isto poder dar ao partido “alguma margem de manobra” para “lidar com um mau resultado em Lisboa”, não é de todo “descabido”, diz o investigador, “imaginar que uma derrota em Lisboa, acompanhada por uma considerável derrota ao nível nacional, desestabilize as actuais estruturas de liderança do PSD”.
Mas em política tudo, e o seu contrário, é possível: Santana-Pereira pegou nos resultados das autárquicas nos últimos 30 anos e verificou que não é muito comum um partido na oposição perder essas eleições. Por outro lado, “se a eleição autárquica é muito colada à legislativa, é natural que o partido na oposição perca, visto que o vencedor das legislativas está ainda em período de ‘lua-de-mel’”, ressalva. De qualquer maneira, insiste, “a ser esse o caso em 2017, não seria a primeira vez que um PSD na oposição teria um resultado pouco brilhante nas autárquicas”.
O investigador sublinha, no entanto, “que a competição eleitoral em Portugal não é um combate dual, entre PS e PSD, e que ao nível autárquico a CDU e alguns independentes têm uma capacidade de atracção de votos e conquista de câmaras que não é despicienda nem deve ser ignorada”.