A casinha de bonecas
A Bela e o Monstro é uma profissionalíssima versão em imagem real da conhecida animação da Disney, mas não chega para justificar a remake.
De um lado, a sensação cada vez maior de que os grandes estúdios preferem “jogar pelo seguro”, reciclando eternamente os seus greatest hits com mais dinheiro, mais espectáculo, mais efeitos visuais, mais, mais, mais.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
De um lado, a sensação cada vez maior de que os grandes estúdios preferem “jogar pelo seguro”, reciclando eternamente os seus greatest hits com mais dinheiro, mais espectáculo, mais efeitos visuais, mais, mais, mais.
Do outro, fazer um musical “sério”, à moda antiga, com canções e coreografias da escola Broadway, está longe de ser dinheiro no banco garantido (La La Land, recordemos, era um tiro no escuro, e o anterior esforço mais sério no género, Caminhos da Floresta de Rob Marshall a partir de Sondheim, passou sem deixar rasto nas bilheteiras).
Isso deixa A Bela e o Monstro num limbo algo curioso: ao passar para imagem real a animação de 1991 que foi um dos motores da renascença da produtora sob Jeffrey Katzenberg, o império Disney está a inscrever-se na reciclagem em imagem real dos clássicos animados do estúdio que até agora só acertou criativamente no Livro da Selva de Jon Favreau, ao mesmo tempo que corre um risco com um género que está longe de garantir o êxito de bilheteira.
Entregue nas mãos de Bill Condon, cineasta em tempos interessante que se deixou cooptar pelo sistema, o que daqui sai é um objecto tecnicamente irrepreensível, profissional até à medula, mas dramaticamente espartilhado pelo caderno de encargos a que tem de responder. Emma Watson é uma Bela perfeita (apesar de haver um desperdício claríssimo de talento nos papéis secundários, com Ian McKellen, Stanley Tucci ou Audra McDonald perfeitamente desbaratados), e o filme consegue, graças à magia dos efeitos especiais e a um trabalho de cenografia detalhadíssimo, criar o ambiente visual de fantasia que a história implica.
Nem assim, contudo, Condon consegue justificar o porquê de refazer a animação original em imagem real (sobretudo quando tanto do filme, por inerência da história, é criado em animação foto-realista), para lá da necessidade de manter uma linha de montagem em funcionamento.
A sensação é a de uma fantasia que não sobrevive para lá das duas horas de projecção, uma casinha de bonecas maravilhosamente detalhada mas com a qual não se pode brincar para não estragar. Ora, quando não se brinca, não se estraga mas também não se desfruta – e A Bela e o Monstro não quer que desfrutemos, quer apenas que fiquemos ali a olhar embasbacados. Enche o olho, sim, mas isso não chega.