O comunicado da PGR explicado aos pró-socráticos
Sócrates e os seus defensores adorariam que o procurador-geral ainda se chamasse Pinto Monteiro. Felizmente chama-se Joana Marques Vidal.
O comunicado da Procuradoria-Geral da República acerca dos prazos para a conclusão da Operação Marquês tem o mérito de esclarecer uma série de questões que têm sido desvalorizadas por todos aqueles que só descobriram em 2017 que a corrupção demora muito a investigar em Portugal. Vale a pena olhar com atenção para o que lá está escrito – citações de Joana Marques Vidal em itálico, comentários meus a redondo.
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O comunicado da Procuradoria-Geral da República acerca dos prazos para a conclusão da Operação Marquês tem o mérito de esclarecer uma série de questões que têm sido desvalorizadas por todos aqueles que só descobriram em 2017 que a corrupção demora muito a investigar em Portugal. Vale a pena olhar com atenção para o que lá está escrito – citações de Joana Marques Vidal em itálico, comentários meus a redondo.
O Ministério Público já analisou suficientemente muita da prova recolhida, podendo efetuar um juízo sobre a mesma, uma vez que se encontra solidificada.
Tradução para os pró-socráticos: vai mesmo haver acusação. Porque é que não se fechou de vez o inquérito? Porque falta analisar prova. Porque é que falta analisar prova? Porque os dez magistrados do Ministério Público e os 22 inspectores tributários que estão dedicados à Operação Marquês já têm no conta-quilómetros 2600 escutas aprovadas, 13.500 milhões de ficheiros informáticos analisados, 260 buscas efectuadas, 170 testemunhas escutadas e nove cartas rogatórias enviadas para diversos países. Há ainda a razão que se segue.
A investigação criminal é dinâmica e, à medida que o inquérito evoluía, os magistrados depararam-se com relações e factos com contornos de natureza criminal que, no início, não eram expectáveis. Não foram abandonadas as imputações iniciais mas o inquérito foi progredindo.
Esta é uma resposta directa à defesa de José Sócrates, que diz que o Ministério Público andou primeiro à procura de crimes no grupo Lena, como não encontrou passou para Vale do Lobo, e de seguida para a PT. A PGR nega essa tese. Os crimes referidos no início do processo mantêm-se. Simplesmente juntaram-se outros no decorrer da investigação.
Até finais do ano passado, já tinham sido apreciados cerca de 350 requerimentos apresentados por arguidos e, no Tribunal da Relação de Lisboa, tinham dado entrada mais de 50 peças processuais relativas a recursos e outros incidentes suscitados pelas defesas.
A defesa de José Sócrates queixa-se muito da demora do processo ao mesmo tempo que contribui diariamente para ela, com um nível de litigância absurdo. Cada recurso apresentado por Sócrates exige uma resposta demorada do Ministério Público – e, tirando o famoso caso do recurso relatado pelo juiz Rui Rangel, todos os outros foram indeferidos. O PÚBLICO de ontem fazia as contas: a Relação já recebeu 33 recursos, a defesa vai em 13 multas por atrasos, e só em custas judiciais (sem contar com os honorários dos seus advogados) José Sócrates foi obrigado a desembolsar 17 mil euros. Tendo em conta que o seu único rendimento conhecido é uma subvenção vitalícia de 3800 euros mensais (2250 líquidos), ele já investiu sete meses e meio de salário em recursos fracassados. Ninguém sabe qual será o Carlos Santos Silva de José Sócrates neste momento, mas o ponto principal é este: se o atraso na acusação é uma vergonha, Sócrates não se tem cansado de contribuir para a vergonha desse atraso.
O pedido de prorrogação do prazo concedido para a conclusão da investigação e da redação do despacho final mostra-se justificado e deverá ser atendido.
A PGR fez o que tinha a fazer. José Sócrates e os seus defensores adorariam que o procurador-geral da República ainda se chamasse Fernando Pinto Monteiro. Felizmente chama-se Joana Marques Vidal.