Em Monte Carlo, Jardim valorizou uma equipa e valorizou-se a si próprio
A cumprir a terceira época ao serviço dos monegascos, o treinador português já não desperta dúvidas a ninguém.
Na primeira época no Mónaco, Leonardo Jardim levou a equipa ao terceiro lugar da Liga francesa e aos quartos-de-final da Liga dos Campeões, mas não estava entre os quatro nomeados para melhor treinador de França. “Não sou dos melhores treinadores, mas posso ganhar o troféu de melhor pedreiro português em França”, foi como reagiu o técnico. Ele que, antes, tinha sido alvo de um programa humorístico francês que o referia como trabalhador da construção civil, como muitos imigrantes portugueses no território. Em Março de 2017, o Mónaco já não é a equipa do pedreiro, mas é aquilo que o jornal L’Équipe chamou na primeira página da edição de ontem uma equipa em “estado de graça”.
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Na primeira época no Mónaco, Leonardo Jardim levou a equipa ao terceiro lugar da Liga francesa e aos quartos-de-final da Liga dos Campeões, mas não estava entre os quatro nomeados para melhor treinador de França. “Não sou dos melhores treinadores, mas posso ganhar o troféu de melhor pedreiro português em França”, foi como reagiu o técnico. Ele que, antes, tinha sido alvo de um programa humorístico francês que o referia como trabalhador da construção civil, como muitos imigrantes portugueses no território. Em Março de 2017, o Mónaco já não é a equipa do pedreiro, mas é aquilo que o jornal L’Équipe chamou na primeira página da edição de ontem uma equipa em “estado de graça”.
Mas, até chegar aqui, como treinador de uma das mais espectaculares equipas da Europa, o treinador nascido na Venezuela enfrentou muita coisa: uma herança pesada do seu antecessor, uma redução drástica do dinheiro disponível, total desconhecimento e um início a roçar o desastre. Jardim chegou ao Mónaco quando se falava de Jorge Jesus para o cargo e quando os adeptos pediam a continuidade de Claudio Ranieri, que tinha arrancado o clube da II divisão numa época e, na seguinte, o tinha levado ao segundo lugar. Não foi o então treinador do Benfica, nem continuou o futuro campeão de Inglaterra, mas o madeirense que tinha sido campeão na Grécia e vice-campeão em Portugal com o Sporting.
O Mónaco que Leonardo Jardim iria ter nas mãos seria um Mónaco diferente do das duas épocas anteriores, em que o oligarca russo Dmitri Rybolovlev (dono do clube desde Dezembro de 2011) tinha investido muitos milhões no reforço da equipa. Só na época 2013-14, o Mónaco gastou 160 milhões em jogadores com Radamel Falcao, João Moutinho, James Rodríguez ou Geoffrey Kondogbia, mas Jardim chegou ao Principado e foi confrontado com a necessidade de reduzir custos e equilibrar contas. Usando uma expressão celebrizada por Toni, Jardim teve de ir ao mercado com um “saco de caramelos”, gastando um quarto (40 milhões) do que na época anterior, ao mesmo tempo que perdia alguns dos craques.
Um clube vendedor
O objectivo prioritário já não era desafiar no imediato a supremacia do PSG, mas liderar um projecto sustentado de construir uma equipa de futuro. E os primeiros resultados não foram animadores — três derrotas, um empate e uma vitória nos primeiros cinco jogos na Ligue 1. Foi uma época de trás para a frente, em que o Mónaco andou a navegar pela segunda metade da tabela, mas foi subindo e teve carreira longa na Liga dos Campeões — chegou aos quartos-de-final, eliminado pela Juventus —, ganhando crédito para a época seguinte, em que seria terceiro.
Desde que Jardim chegou, o Mónaco tornou-se, sobretudo, num clube vendedor. Nas três últimas épocas, o técnico ficou sem James (Real Madrid, 75 milhões), Anthony Martial (Manchester United, 50 milhões), Kondogbia (Inter, 36 milhões), Kurzawa (PSG, 25 milhões), Abdennour (Valência, 22 milhões), Ferreira-Carrasco (Atlético Madrid, 17 milhões) e muitos outros por valores abaixo dos dez milhões de euros, para além de veteranos de ordenados altos como Berbatov, Ricardo Carvalho ou Jerémy Toulalan.
As duas primeiras épocas foram de consolidação de um modelo, a terceira está a ser de explosão total. Na Ligue 1, os monegascos lideram com uma vantagem não muito tranquila (três pontos para o PSG, cinco para o Nice), mas com uma produção ofensiva de causar inveja. São 84 golos marcados em 29 jornadas, mais 25 que o Lyon, que tem o segundo melhor ataque de França. Na Liga dos Campeões, ganharam um grupo que incluía Bayer Leverkusen, Tottenham e CSKA Moscovo e já despacharam o Manchester City de Guardiola, apresentando um futebol de encantar.
Com que equipa é que Jardim fez isto? Com alguns veteranos, como o guarda-redes Subasic, o defesa italiano Raggi, o português João Moutinho ou Falcao, o goleador colombiano renascido. Mas quem está a fazer crescer água na boca aos “tubarões” da Europa não é nenhum deles. É, por exemplo, Kylian Mbappé, um jovem avançado de 18 anos, que já leva 18 golos na presente temporada e que os monegascos recrutaram em 2013 (foi ontem chamado à selecção francesa pela primeira vez). Ou o português Bernardo Silva e o seu fantástico pé esquerdo, contratado por 15 milhões ao Benfica e que já valerá três vezes mais.
Mendy, o defesa supersónico, Fabinho, o lateral convertido em médio, Bakayoko, o “trinco” que marcou o golo do apuramento, Lemar, o médio canhoto que fez a assistência, são outros potenciais grandes negócios para o Mónaco, que pode bem ser vítima do seu próprio sucesso quando a época acabar. E o próprio Leonardo Jardim já deve estar na lista de muitas equipas da elite europeia, mas não para fazer obras de melhoramento dos estádios. O que ele construiu no Mónaco foi outra coisa.