Contactos com Interpol passam para "superpolícia" que depende do primeiro-ministro
Funcionários da Polícia Judiciária estão contra "interferência do poder político" na investigação criminal.
O Conselho de Ministros aprovou nesta quinta-feira o diploma que cria o Ponto Único de Contacto para a Cooperação Policial Internacional, que, entre outras funções, assegura a recepção e difusão nacional de informação proveniente das autoridades policiais estrangeiras.
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O Conselho de Ministros aprovou nesta quinta-feira o diploma que cria o Ponto Único de Contacto para a Cooperação Policial Internacional, que, entre outras funções, assegura a recepção e difusão nacional de informação proveniente das autoridades policiais estrangeiras.
Funcionando na dependência e sob a coordenação da secretária-geral do Sistema de Segurança Interna, o Ponto Único de Contacto para a Cooperação Policial Internacional (PUC-CPI) é "o centro operacional responsável pela coordenação da cooperação policial internacional, que assegura o encaminhamento dos pedidos de informação nacionais, a recepção, o encaminhamento e a difusão nacional de informação proveniente das autoridades policiais estrangeiras, a transmissão de informação e a satisfação dos pedidos por esta formulados".
Nas funções de secretária-geral do Sistema de Segurança Interna - cargo que passou a ser conhecido por "superpolícia", numa alusão ao poder de coordenação que tem, em alguns cenários, relativamente a todas as polícias - está actualmente a procuradora Helena Fazenda. Institucionalmente, este cargo equivale à figura de secretário de Estado e depende directamente do primeiro-ministro.
“É um erro grave do Governo"
O ponto de contacto é fundamental no âmbito da colaboração entre polícias para a averiguação de vários crimes transacionais, nomeadamente os de terrorismo, cuja investigação é da competência exclusiva da Polícia Judiciária.
Porém, uma primeira tentativa para criar esta estrutura por parte de António Costa esbarrou com a legislação em vigor, já que a lei orgânica da Polícia Judiciária e a Lei da Segurança Interna estabelece que compete a esta polícia, através da sua Unidade de Cooperação Internacional, assegurar o “funcionamento dos gabinetes da Interpol e da Europol para os efeitos da sua própria missão e para partilha da informação”.
“Estas leis foram criadas precisamente para impedir a interferência do poder político na investigação de crimes”, comentou ao PÚBLICO o presidente da Associação Sindical dos Funcionários da Investigação Criminal (ASFIC), Ricardo Valadas, adiantando que esperam que estas não venham a ser alteradas por iniciativa do Governo. O PÚBLICO tentou, no final da tarde desta quinta-feira, obter, sem sucesso, esclarecimentos do Ministério da Justiça, que tutela a PJ.
Ricardo Valadas indicou que a ASFIC mantém a sua oposição a esta alteração. “É um erro grave do Governo. Esperamos que as competências da PJ se mantenham e que este gabinete não venha fragilizar a principal agência de investigação do país”, disse.
"Fugas de informação"
Esta quinta-feira, no final da reunião de Conselho de Ministros, coube à ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, apresentar as linhas gerais do PUC-CPI, que tem um Gabinete de Gestão constituído por elementos da Guarda Nacional Republicana, da Polícia de Segurança Pública, da Polícia Judiciária e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). “Não entendemos que outras polícias, para além da Judiciária, possam ter acesso à informação que vem da Europol e da Interpol. Só vai criar mais ruído e aumentar a possibilidade de fugas de informação de crimes que estão sob segredo de justiça”, afirmou Ricardo Valadas.
O PUC-CPI reúne, sob a mesma gestão, o Gabinete nacional Sirene, o Gabinete Nacional da Interpol, a Unidade Nacional da Europol, a coordenação dos oficiais de ligação nacionais e estrangeiros, a coordenação dos Centros de Cooperação Policial e Aduaneira e os pontos de contacto decorrentes das decisões "Prum".
O acordo de Prum (cidade alemã) visa "aprofundar a cooperação policial transfronteiriças, nomeadamente nos domínios da luta contra o terrorismo, a criminalidade organizada e a imigração ilegal e lança as bases para uma cooperação avançada entre Estados membros da União Europeia".