Cinco ex-administradores da CGD não apresentaram declarações de rendimentos
Ao desrespeitar a obrigação determinada pelo Tribunal Constitucional, os antigos responsáveis arriscam não poder voltar a assumir funções públicas durante cinco anos.
Cinco dos seis ex-administradores da Caixa Geral de Depósitos que se demitiram em Novembro juntamente com António Domingues não apresentaram a obrigatória declaração inicial de património e rendimentos ao Tribunal Constitucional. Se não fizerem agora a declaração de cessação de funções até ao fim do mês, ficarão inibidos de assumir funções públicas durante cinco anos.
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Cinco dos seis ex-administradores da Caixa Geral de Depósitos que se demitiram em Novembro juntamente com António Domingues não apresentaram a obrigatória declaração inicial de património e rendimentos ao Tribunal Constitucional. Se não fizerem agora a declaração de cessação de funções até ao fim do mês, ficarão inibidos de assumir funções públicas durante cinco anos.
António Domingues apresentou a sua declaração de rendimentos logo no dia em que foi formalizada a sua renúncia ao cargo de presidente do Conselho de Administração da CGD, a 28 de Novembro, após cinco semanas de polémica precisamente por não estar disposto a cumprir aquela obrigação. E mesmo assim fê-lo acompanhado de um requerimento para manter aquelas informações em sigilo, pretensão que o TC rejeitou em Fevereiro.
Nesta quarta-feira, no primeiro dia em que as declarações estiveram acessíveis para consulta, o PÚBLICO acedeu a todas as declarações entregues pelos administradores da equipa de Domingues – seis, incluindo a do ex-presidente – e verificou estarem cinco em falta.
Emídio Pinheiro, Henrique Noronha e Menezes e Paulo Rodrigues da Silva foram os três ex-administradores executivos que não cumpriram até agora nenhuma das obrigações de transparência, nem a entrega inicial de declaração de rendimentos nem a que estão obrigados após a cessação de funções. Em comum têm também o facto de se terem demitido juntamente com Domingues.
Na mesma situação estão também dois administradores não executivos - Angel Corcóstegui Guraya e Herbert Walter -, que também renunciaram ao cargo naquela altura. Todos deverão agora ser notificados para, num prazo de 30 dias, cumprirem as respectivas obrigações.
Dos seis administradores que se demitiram em solidariedade com António Domingues, só um apresentou as suas declarações. Todas, já que Pedro Norton também já entregou a de cessação de funções e de início das novas, uma vez que foi reconduzido no cargo de administrador não executivo da nova administração da Caixa. A restante equipa do Conselho de Administração entregou as suas declarações iniciais no mesmo dia que António Domingues.
Aqui há milhões
E afinal, o que havia a esconder? Bem, se havia alguma coisa, a mera consulta das declarações também não o revela. Ainda que haja surpresas.
Comecemos com António Domingues. Em 2015, o ano a que se refere a declaração que entregou em Novembro, recebeu 539.516 euros de trabalho dependente como administrador do BPI, BPA, Allianz Portugal e Nos. O que não seria muito diferente do que receberia num ano na CGD, onde tinha um salário base equivalente – 423 mil euros/ano – e possibilidade de receber prémios de gestão.
O património do gestor inclui um prédio em Lisboa no valor de 1,2 milhões de euros que lhe proporcionaram rendas de 48 mil euros em 2015, uma propriedade rústica em Arcos de Valdevez, um veleiro adquirido em leasing, uma viatura de gama média e dois Porsches 911, um de 1972 e outro de 1995. Possuia também 56 mil acções do BPI e quatro contas bancárias, a maior das quais também no banco que administrava, no valor de 3,7 milhões de euros.
Na sua declaração, Domingues acrescentou uma frase por sua iniciativa, logo abaixo da indicação daqueles valores: “Entre 1990 e 2015, o signatário pagou 6.362.303 euros de IRS ao Estado português”. Quis assim assinalar que tem ganho muito, mas também tem contribuído para o erário público. Em média 254.500 mil euros de impostos por ano.
A grande surpresa das declarações consultadas vem de Pedro Durão Leitão. Em 2015, este então administrador de várias empresas do grupo PT (incluindo a MEO), da TMN e vice-presidente da Associação Portuguesa para o Desenvolvimento das Comunicações auferiu mais de quatro milhões de euros em trabalho dependente. Sim, é o que está declarado: 4.056.913 euros, mais de três vezes mais do que a soma dos restantes parceiros da administração da Caixa que apresentaram declarações.
Não se sabe quanto Pedro Durão Leitão foi ganhar para a CGD, mas seguramente não teria um salário superior ao do presidente, que só por si era quase 10 vezes inferior ao declarado pelo ex-administrador da PT. Na Caixa, Pedro Leitão tinha a seu cargo as direcções de acompanhamento de particulares, acompanhamento de empresas, banca institucional, empresas Norte e Sul, grandes empresas e negócio imobiliário. Tinha ainda a tutela sobre a Caixa Imobiliário, a Caixa Leasing e Factoring, a Imocaixa, a Locarent e a Wolfpart, pelo que cada uma destas poderia proporcionar-lhe rendimentos acrescidos.
Quando se pronunciou sobre os nomes dos administradores nomeados, o Banco Central Europeu (BCE) alertou para a necessidade de a CGD "acompanhar de perto as próximas fases do processo civil pendente relativo a Pedro Leitão”, segundo foi então noticiado pelo Jornal de Negócios. O BCE não especificava qual a situação em causa, mas o Negócios afirmava que seria “uma acção judicial relacionada com o facto de o futuro gestor ter sido administrador não executivo da Portugal Telecom na altura em que o grupo investiu em dívida do Grupo Espírito Santo, aplicação que resultou numa perda de 900 milhões de euros”.
Na sua declaração ao TC, Pedro Leitão refere contas bancárias superiores a sete milhões de euros, um Porsche e um Mercedes CLZ, um apartamento em Lisboa e ainda uma herança indivisa de montantes que não indicou.
Nem Emílio Rui Vilar, o conhecido administrador, ex-ministro, antigo presidente da CGD declara um património tão elevado. Rendimentos por trabalho dependente em 2015, ano em que esteve até Abril como presidente da REN, foram 202 mil euros. Mas Vilar já soma pensões na ordem dos 273 mil euros, conta com uma carteira de títulos de 193 mil euros em acções e de 283 mil em obrigações e poupanças superiores a um milhão.
Pedro Norton declarou 426 mil euros em rendimentos de trabalho dependente quando era administrador de várias empresas do grupo Impresa, gerente da Global Media Solutions e Mediapress, presidente da administração da InfoPortugal e vice-presidente da Balseger SGPS. Na carteira de títulos destacam-se contas no banco Edmond de Rotschild Europe na ordem de 2,4 milhões e uma conta conjunta de quase um milhão no Santanter Totta.
Mais modestos eram os patrimónios de João Paulo Tudela Martins e Tiago Ravara Marques. O primeiro declarou quase 153 mil euros de trabalho dependente do BPI, quatro carros de gama média e quatro contas à ordem cujo valor não especificou. Tinha também sete créditos à habitação praticamente do valor da moradia em Sintra, na ordem dos 286 mil euros.
Por seu lado, Tiago Marques declarou rendimentos de cerca de 208 mil euros – a mesma ordem de grandeza dos empréstimos bancários que possuía -, dois apartamentos na zona de Lisboa e duas propriedades na zona de Albarraque.