Tomás Correia recusa demitir-se da dona do Montepio Geral
Tomás Correia pediu “serenidade” e “calma”, e garantiu concordar que o regulador dos seguros passe a fazer a supervisão da instituição, desde que não se esqueça do seu carácter social.
Tomás Correia recusou ontem demitir-se da presidência da Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG) e garante que aceita ser supervisionado pela Autoridade dos Seguros e Fundos de Pensões. Declarações que surgem em resposta à notícia do PÚBLICO desta terça-feira, sobre um alerta da KPMG às contas consolidadas de 2015 do grupo Montepio que revelam um “buraco” de 107 milhões de euros.
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Tomás Correia recusou ontem demitir-se da presidência da Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG) e garante que aceita ser supervisionado pela Autoridade dos Seguros e Fundos de Pensões. Declarações que surgem em resposta à notícia do PÚBLICO desta terça-feira, sobre um alerta da KPMG às contas consolidadas de 2015 do grupo Montepio que revelam um “buraco” de 107 milhões de euros.
A reunião do conselho geral da AMMG que decorreu na terça-feira, para debater em especial as contas consolidadas de 2015, começou a meio da tarde e acabou por volta das 20h30. Estiveram presentes os 23 conselheiros e Tomás Correia fez-se acompanhar de um representante da KPMG que procurou justificar os alertas realizados na certificação dos números.
O encontro arrancou em clima de tensão, a reflectir as várias sensibilidades que existem dentro do conselho geral, com os representantes das listas de Eugénio Rosa e de António Godinho, que se opõem à actual gestão, a colocarem objecções. O que terá levado a reacções crispadas por parte de Tomás Correia, como contou ao PÚBLICO um alto dirigente da instituição, que registou ainda o desconforto do ex-administrador Almeida Serra, eleito pela facção do presidente.
Para além da deterioração do balanço consolidado do grupo, os últimos meses têm sido marcados por um distanciamento crescente entre os dirigentes da AMMG e a gestão da Caixa Económica chefiada por José Félix Morgado – este sábado o Expresso revelou um relatório do Banco de Portugal “arrasador” para iniciativas de Morgado à frente do banco.
As contas consolidadas terão de ser aprovadas em assembleia geral da AMMG, a dona da Caixa Económica, e que, segundo os estatutos, terá de se realizar até 31 de Março.
Esta terça-feira o PÚBLICO noticiou que as contas consolidadas da AMMG (incluem as das participadas, banco e seguradora Lusitânia) de 2015 apresentam um “buraco” de 107.529 milhares de euros, o que levou ao alerta (ênfase) da KPMG: “Chamamos a atenção para o facto de, à data de 31 de Dezembro de 2015, o Montepio Geral – Associação Mutualista apresentar capital próprio negativo atribuível aos associados no montante de 107.529 milhares de euros.”
Este aviso do auditor foi reproduzido na nota enviada esta terça-feira à comunicação social pela AMMG como esclarecimento à informação do PÚBLICO, o que não impediu que no mesmo comunicado se refira que a notícia “não corresponde à verdade”.
Falência técnica
Já durante a conferência de imprensa que se realizou antes do conselho geral, de reacção aos acontecimentos de terça-feira, e onde se fez acompanhar pelo padre Vítor Melícias, o líder da AMMG confessou que o que mais o “chocou [na notícia do PÚBLICO] foi a utilização da palavra 'falência'”. No entanto, a expressão usada pelo PÚBLICO para ilustrar o desequilíbrio financeiro da AMMG, e reflectido nos capitais próprios negativos, foi a de “falência técnica”. Um termo enquadrado pelo Código das Sociedades Comerciais e que não remete para uma falência pura.
“Não podemos ceder ao facilitismo de quem utiliza determinados expedientes para atingir determinados fins”, observou Tomás Correia, que recusou abandonar as suas actuais funções, apesar de ser arguido em investigações judiciais por decisões tomadas enquanto presidente da Caixa Económica, cargo de que se afastou por pressão do Banco de Portugal (BdP) no Verão de 2015.
Declarações que surgem num momento em que se avolumam as críticas à acção do BdP, no caso do banco Montepio, e à falta de supervisão sobre a Associação Mutualista, a cabeça do grupo, cujo controlo cabe ao Ministério da Segurança Social.
É neste quadro de dúvidas sobre a supervisão efectivamente exercida que existe um elevado grau de dependência das duas entidades: a exposição da AMMG à Caixa Económica e às empresas do grupo ronda os 87%.
Ao longo do dia de ontem, Tomás Correia pediu “serenidade” e “calma”, e garantiu concordar que o regulador dos seguros passe a fazer a supervisão da instituição, desde que não se esqueça do seu carácter social: “Não estivemos nunca em desacordo e continuamos a dar a nossa total concordância para que a ASF [Autoridade dos Seguros e Fundos de Pensões] possa fazer a supervisão do Montepio e das associações mutualistas.”
De acordo com o jornal digital Eco, em Fevereiro de 2016, “um grupo de associados do Montepio requereu uma audiência ao Ministério do Trabalho para alertar para a difícil situação financeira da AMMG com risco de os capitais próprios entrarem no vermelho e de os prejuízos continuarem”. O Eco adianta que a reunião só aconteceu em Janeiro de 2017. Na terça-feira, Tomás Correia assegurou estar em contacto permanente com a tutela, ou seja, com o ministro Vieira da Silva.
Este, por sua vez, citado pela Lusa, apenas disse que os produtos da AMMG avaliados pelo Governo estão com “rácios confortáveis” e lembrou que a Caixa Económica integra o sector financeiro.
Ainda na terça-feira, a AMMG apresentou as suas contas individuais de 2016, portanto sem contar com o impacto da Caixa Económica e da Lusitânia. Segundo os dados divulgados, a AMMG teve lucros de 7,4 milhões, contra o prejuízo de 393,1 milhões de euros registados em 2015.