Levante-se o véu, diz a Europa
O que falta a seguir é o fecho das mesquitas, a proibição do credo e a expulsão dos muçulmanos, algo que a extrema-direita europeia já disse ou pensou.
A decisão de ontem do Tribunal de Justiça Europeu arrisca-se a abrir uma enorme caixa de Pandora. Na sequência de dois casos de alegado despedimento por uso de hijabs, o tribunal reconheceu às empresas europeias o direito de criarem regras que proíbam o “uso visível de um símbolo político, filosófico ou religioso”, desde que todos os funcionários se vistam de “uma forma neutra”. O que o tribunal reconheceu foi a liberdade empresarial de “conduzir um negócio” e o que recusou foi a liberdade de opção de quem quer vestir seja o que for. Conciliar políticas de utilização de vestuário, ou de conduta das empresas, com a liberdade religiosa tornar-se-á mais problemático. Um tribunal europeu abriu o precedente de se pronunciar sobre questões que até aqui eram uma questão de liberdade de opção ou de bom senso. E um dia destes os sikhs ou andarão de cabelo solto ou perderão o emprego.
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A decisão de ontem do Tribunal de Justiça Europeu arrisca-se a abrir uma enorme caixa de Pandora. Na sequência de dois casos de alegado despedimento por uso de hijabs, o tribunal reconheceu às empresas europeias o direito de criarem regras que proíbam o “uso visível de um símbolo político, filosófico ou religioso”, desde que todos os funcionários se vistam de “uma forma neutra”. O que o tribunal reconheceu foi a liberdade empresarial de “conduzir um negócio” e o que recusou foi a liberdade de opção de quem quer vestir seja o que for. Conciliar políticas de utilização de vestuário, ou de conduta das empresas, com a liberdade religiosa tornar-se-á mais problemático. Um tribunal europeu abriu o precedente de se pronunciar sobre questões que até aqui eram uma questão de liberdade de opção ou de bom senso. E um dia destes os sikhs ou andarão de cabelo solto ou perderão o emprego.
A conjugação de dois factores ameaça qualquer equilíbrio: o aumento da população muçulmana no espaço europeu e a ascensão da extrema-direita. Esta alimenta-se de um crescente medo e ódio contra os imigrantes e refugiados, através de um discurso político hostil dirigido aos muçulmanos em geral, cujas consequências estão bem à vista. A Holanda proibiu o véu islâmico em Novembro. Angela Merkel confessou que pretendia fazer o mesmo na Alemanha no mês seguinte. A Áustria anunciou a proibição do uso do véu integral, a sinistra burqa, em Janeiro deste ano. E há alguns anos que o mesmo acontece na Bélgica ou em França, onde o biquíni se tornou tão obrigatório como proibido nas praias dos Emirados Árabes Unidos.
Eurocêntricos como sempre, achamos que a primeira das duas proibições é um gesto de civilidade e que a segunda é um acto de incivilidade. Tudo depende de onde olhamos. O que falta a seguir é o fecho das mesquitas, a proibição do credo e a expulsão dos muçulmanos, algo que a extrema-direita europeia já disse ou pensou. As premissas são antigas: os imigrantes têm de aceitar as nossas regras; o uso do véu integral é também uma questão de segurança, e as mulheres que usam adereços religiosos são oprimidas. Podemos discordar do véu e aceitar que quem concorde com ele o use – caso o faça livremente. Todavia, nestes casos, subsiste uma dúvida: estamos a falar de direitos humanos ou de islamofobia?