Homem de Neandertal já usava “aspirina” e antibióticos

Analisado o ADN presente na placa dentária de fósseis de Espanha e Bélgica.

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Réplica do crânio de um Neandertal Nikola Solic/Reuters

O homem de Neandertal, o parente mais próximo dos humanos actuais e extinto há cerca de 29 mil anos, tinha hábitos alimentares variados e conhecimentos sobre plantas medicinais, incluindo o uso do que seria hoje a “aspirina”.

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O homem de Neandertal, o parente mais próximo dos humanos actuais e extinto há cerca de 29 mil anos, tinha hábitos alimentares variados e conhecimentos sobre plantas medicinais, incluindo o uso do que seria hoje a “aspirina”.

De acordo com um estudo, publicado esta quinta-feira na revista Nature, liderado pelo Centro Australiano de ADN Antigo, em colaboração com a Faculdade de Odontologia da Universidade de Adelaide e a Universidade de Liverpool (no Reino Unido), a análise do material genético encontrado na placa dentária de fósseis do homem de Neandertal deu informações surpreendentes sobre o seu comportamento, evolução histórica e dieta.

Os investigadores concluíram, por exemplo, que os Neandertais terão usado medicamentos à base de plantas para tratar a dor de cabeça, e que havia diferenças dietéticas entre grupos distintos.

“A placa dentária, que prende microrganismos que vivem na boca, agentes patogénicos encontrados nos aparelhos respiratório e gastrointestinal, bem como pedaços de comida que ficaram presos nos dentes, preservou o ADN por milhares de anos”, explicou a principal responsável pelo estudo, Laura Weyrich, do Centro Australiano de ADN Antigo.

Assim, referiu a investigadora, a análise genética desse ADN que ficou preso na placa dentária representa uma “janela privilegiada” sobre o estilo de vida do homem de Neandertal, o que comia, as doenças de que sofria ou o ambiente como factor que afectava o comportamento.

A equipa internacional analisou e comparou amostras da placa dentária de quatro esqueletos de homens de Neandertal encontrados em grutas em Spy, na Bélgica, e em El Sidrón, Espanha. A idade dos quatro varia entre os 42.000 e 50.000 anos.

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Mandíbula de um Neandertal da gruta de El Sidrón, Espanha Grupo MNCN-CSIC

“Descobrimos que os Neandertais de Spy consumiam rinocerontes e ovelhas selvagens, acompanhadas por cogumelos”, disse Alan Cooper, director do Centro Australiano de ADN Antigo, acrescentando que os Neandertais de El Sidrón não mostraram indícios de consumo de carne mas parecem antes ter sido consumidores de uma dieta à base de vegetais e sementes.

“Uma das descobertas mais surpreendentes foi feita num Neandertal de El Sidrón, que tinha um abcesso dentário. A placa mostrou que também tinha um parasita intestinal que lhe causava diarreia aguda, pelo que claramente estava muito doente. Ele estava a comer choupo, que contém ácido salicílico, o ingrediente activo da aspirina, para tirar a dor, e também detectámos um antibiótico natural (penicilina) que não encontrámos noutros espécimes”, referiu Alan Cooper.

O homem de Neandertal tinha um bom conhecimento das plantas medicinais e das suas propriedades anti-inflamatórias e analgésicas e automedicava-se, segundo o investigador. Mas o mais surpreendente, adiantou, foi o uso de antibióticos 40.000 anos antes de ser descoberta a penicilina.

A análise científica permitiu ainda descobrir que vários micróbios causadores de doenças já eram “compartilhados” pelos antigos humanos e que a comunidade microbiana oral não se alterou na história recente.