Qual é o mamífero terrestre que dorme menos durante todo o dia?
Tem tromba, muitos quilos de massa corporal e dorme só duas horas por dia. Quem é? É o elefante. Um novo estudo veio agora confirmar que este animal ainda dorme menos tempo na natureza do que em cativeiro.
Parece que o grande porte dos elefantes assusta o João Pestana. Pelo menos é o que nos sugere um estudo sobre a quantidade de horas que o maior mamífero terrestre dorme na natureza. Em média, dorme duas horas por dia. Mas estas horas nem são seguidas; os elefantes fazem pequenas sestas durante o dia ou podem mesmo até ficar dias consecutivos sem dormir.
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Parece que o grande porte dos elefantes assusta o João Pestana. Pelo menos é o que nos sugere um estudo sobre a quantidade de horas que o maior mamífero terrestre dorme na natureza. Em média, dorme duas horas por dia. Mas estas horas nem são seguidas; os elefantes fazem pequenas sestas durante o dia ou podem mesmo até ficar dias consecutivos sem dormir.
É uma surpresa que os elefantes durmam tão poucas horas? “Não, este pequeno período de tempo não foi surpreendente”, responde-nos Paul Manger, neurocientista da Universidade de Witwatersrand, na África do Sul, e coordenador do estudo publicado na revista Plos One esta quarta-feira. Afinal, já se sabia que eles dormiam pouco desde as primeiras observações de elefantes de um circo em Nova Iorque e Boston, em 1938. Neste estudo, dos norte-americanos Francis Benedict e Robert Lee, percebeu-se que os elefantes dormiam entre três a sete horas por dia.
Mais estudos têm sido realizados e os resultados indicam que os elefantes em cativeiro, em média, dormem cerca de quatro horas por dia. Desta vez, a equipa de Paul Manger decidiu fazer o teste em elefantes na natureza. Para tal, os cientistas escolheram duas fêmeas matriarcas do Parque Nacional do Chobe, no Botswana. O parque tem cerca de 11.700 quilómetros quadrados e é a casa de cerca de 17.000 elefantes. É, por isso, considerado um dos locais onde se concentram mais elefantes em África.
As duas matriarcas observadas pertenciam à espécie Loxondonta africana e eram elas que conduziam a manada de elefantes. A primeira matriarca tinha 30 anos e cerca de 3400 quilos, enquanto a segunda tinha 37 anos e 3000 quilos. Em ambas foi colocada uma coleira que fornecia dados da sua localização em GPS e da rapidez do seu andamento. Assim, foi possível perceber se estavam paradas ou em movimento. Também se teve em conta a actividade da tromba: se estivesse parada cinco minutos ou mais, era sinal de que a matriarca estava a dormir.
Na observação, que durou 35 dias, o tempo total que a primeira matriarca dormiu foi de duas horas e 18 minutos, enquanto a segunda foi de uma hora e 48 minutos. Concluiu-se assim que os elefantes na natureza dormem em média duas horas e que são os mamíferos que dormem menos. Paul Manger conta que há animais como a girafa ou a palanca-vermelha que podem dormir pouco, mas não tão pouco como os elefantes e, além disso, ainda não foram feitos estudos na natureza com estes animais.
Mas não ficamos por aqui. Os elefantes dormem de forma polifásica, o que quer dizer que dormem mais de duas vezes ao longo do dia (nós somos monofásicos). A primeira matriarca registou, em média, quatro episódios de sesta durante o dia, sendo o maior período de 78 minutos (uma hora e 18 minutos). Já a segunda matriarca dormiu cinco vezes num dia e o sono mais prolongado foi de 48 minutos. O tempo em que as fêmeas de elefante dormiram mais foi de noite, entre o pôr do Sol e o nascer do Sol, mais exactamente entre a 01h e as 06h. Enquanto as sestas durante o dia se fizeram entre as 10h30 e as 15h30.
Além disso, também se observou que os elefantes podem passar dois dias seguidos sem dormir. Quais os motivos? No Parque Nacional do Chobe há leões que caçam elefantes e há também caça furtiva devido ao marfim. Os cientistas ainda consideraram que “insónias” de dois dias podiam dever-se ao facto de as fêmeas serem matriarcas e estarem preocupadas em dirigir a manada.
A equipa pôde assim perceber que tudo isto pode afectar uma fase importante do sono, a do “movimento rápido dos olhos” (REM, na sigla em inglês), durante a qual ocorrem os sonhos vívidos e os olhos se movem rapidamente. Outros estudos já tinham constatado que esta fase é rara nos elefantes.
Apetite que provoca insónias
Mas afinal por que é que os elefantes dormem tão pouco? “Parece que há um equilíbrio entre a necessidade de ingerir uma certa quantidade de calorias para uma determinada massa corporal, o tempo que se leva a fazer isso e o tempo que resta para dormir”, explica ao PÚBLICO Paul Manger. Este equilíbrio acontece porque um grupo de neurónios produz uma substância química – orexina –, que funciona como mensageiro químico entre os neurónios e regula a satisfação (o apetite), a vigília e a excitação. Quando um elefante ainda não comeu o suficiente, a orexina mantém-no acordado.
“Uma vez que um elefante precisa de muitas centenas de quilos de comida de baixa qualidade por dia, o tempo que lhe resta para dormir é pouco”, conta o neurocientista sul-africano. “Contudo, no jardim zoológico – onde há comida em quantidade e a qualidade é melhor e é mais acessível do que na natureza –, o tempo que passa a dormir é maior do que na natureza.”
Mas este estudo sobre o sono ainda não terminou, aponta Paul Manger. Vão observar-se elefantes macho e fêmeas que não são matriarcas. Por fim, terá de se perceber como é que a fase REM do sono funciona realmente nos elefantes. “A dificuldade é obter financiamento para este trabalho”, salienta.
E ainda há outro problema que não deixa os elefantes africanos descansados: a intensa procura de marfim. Num estudo recente sobre a população de elefantes no Parque Nacional de Minkébé, no Gabão, entre 2004 e 2014, uma equipa verificou que morreram 25.000 elefantes, o que equivale a 80% da sua população no parque. No artigo na revista Current Biology, cujo principal autor é John Poulsen, da Universidade de Duke (EUA), a equipa apelou à cooperação entre os governos para a criação de medidas internacionais que ponham fim à caça furtiva de elefantes.